'Estava feliz': especialistas contestam ataque de cão antes de PM atirar
Vinícius Rangel
Colaboração para o UOL
15/09/2023 13h46
Especialistas em comportamento canino consultados pelo UOL consideram improvável que o golden retriever Churros tenha atacado o policial militar da reserva Anderson Carlos Teixeira no último sábado (9), quando saltou na perna do PM em Guarapari (ES) - em seguida, Teixeira matou o animal com um tiro.
As fontes ouvidas fazem essa afirmação com base no padrão de comportamento da raça de Churros e por meio de imagens de câmera de segurança que mostram o animal de aproximando do atirador.
Teixeira alegou, em depoimento à Polícia Civil, ter baleado Churros para se defender.
Demarcação de território
Membro da IACP (International Association of Canine Professional) e terapeuta canino, Roberto Meyer é diz que Churros não indicou comportamento agressivo ao se aproximar e saltar no atirador.
"Os cães, independentemente da raça, agem por instinto. Ao de pular na perna do policial, Churros está com o rabo levantado, uma indicação de domínio de território. Contudo, fica claro que o animal não estava agressivo e abordou o PM na tentativa de impor um limite territorial. A partir do que é possível observar, o cão tira espaço do cara, mas nesse momento ele não ataca", explica o especialista.
Segundo o vídeo e depoimento da tutora de Churros, que testemunhou o disparo, durante a ação, o animal salta no PM, que logo avança em direção a Churros. Nesse instante, segundo Mayer, o ato pode, sim, ter caracterizado uma ameaça ao cão. Vídeo ao qual o UOL teve acesso e exibiu ao especialista não mostra o momento do disparo.
"O cão faz leitura da sua energia. Se eu estiver com a intenção de bater no cão, ele saberá, pois é capaz de ler o ser humano muito facilmente Se você está chateado, estressado, o animal faz essa leitura muito bem", complementa Meyer.
Como perceber ataque iminente
Questionamos o especialista sobre qual é a linguagem corporal de um cachorro pronto para atacar.
Roberto explica que, antes de avançar, o cão mantém a cabeça mais baixa, a boca fechada, as orelhas em pé e o rabo para cima, com o objetivo de impor respeito.
"Quando o cão pula no policial, ele está com o rabo pra cima, mas em nenhum momento ele impõe risco ao policial. Quando quer apenas brincar, por outro lado. o cão apresenta sinais como boca aberta, orelhas para trás e o rabo abanando no meio do corpo", explica.
'Churros estava feliz'
A médica veterinária, criadora e especialista em golden retriever Patricia Chaerki Igreja também acredita que Churros não iria atacar o policial militar.
Segundo ela, considerando o comportamento da raça e o vídeo, a atitude de Churros demonstraria que ele só estava 'feliz'.
"No vídeo, o cão não demonstra estar em posição de ataque. Parece que ele realmente estava eufórico, feliz na rua, ia em uma pessoa e depois em outra, querendo apenas brincar", opina Chaerki.
Patricia pondera, ainda, que golden é uma raça dócil, inteligente e usada até mesmo em terapias e em hospitais, o que torna a probabilidade de um ataque muito menor.
"O fila brasileiro, por exemplo é um cachorro conhecido por não gostar de estranhos. Só que não presenciei nada do tipo envolvendo golden retrievers, já tive mais de 50 e criei mais de 200. Mas vale dizer que mesmo essa raça precisa ser socializada e educada, senão pode se tornar agressiva".