SP: Prefeitura gasta R$ 2,4 milhões em placas para Autódromo de Interlagos

Quem anda pela cidade de São Paulo já deve ter se deparado, em algum lugar, com uma placa indicando a direção para o Autódromo de Interlagos, localizado na zona sul. Ao todo, foram 403 sinalizações a um custo para os cofres municipais de quase R$ 2,4 milhões, segundo dados obtidos pelo UOL via LAI (Lei de Acesso à Informação).

O que aconteceu

O valor das placas inclui os materiais para produção e instalação, além da mão de obra pelo serviço, segundo a Prefeitura de São Paulo. Quatro empresas foram responsáveis pelo trabalho, conforme resposta enviada pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego).

Cada uma das sinalizações saiu por cerca de R$ 5,9 mil (dividindo o valor total gasto pelo número de placas). A implantação começou a ser feita no primeiro semestre deste ano.

As placas foram instaladas em 30 ruas pela cidade, segundo a CET, que não diz quais foram as vias.

A gestão de Ricardo Nunes (MDB) afirma que essas sinalizações fazem parte do programa de orientação de tráfego ligado ao turismo, para identificar os principais pontos da capital paulista. "O alvo da sinalização são os usuários do viário municipal provenientes das rodovias, aeroportos e centros hoteleiros", informa a prefeitura.

Perguntas sem respostas: o UOL questionou se novas placas de outros pontos turísticos seriam instaladas, em que momento e qual a quantidade, mas não houve resposta.

Interlagos não está entre principais pontos turísticos

O POT - Turismo veio da necessidade identificar os principais equipamentos turísticos paulistanos e foi desenvolvido em parceria com a SPTuris.
Prefeitura de São Paulo, em nota enviada ao UOL

A justificativa da gestão municipal, entretanto, não dialoga com os principais pontos turísticos da cidade. Uma pesquisa da empresa 99 apontou que entre os lugares mais visitados em São Paulo, excluindo shoppings e terminais de transporte, estão pontos turísticos como o Parque Ibirapuera, Mercado Municipal e Largo da Concórdia.

O Autódromo não aparece no top 10 da pesquisa. O levantamento foi feito com base nas corridas registradas no aplicativo.

Um programa lançado pela prefeitura sobre roteiros na cidade também não mostra o Autódromo como uma das possibilidades de turismo. O "Vai de Roteiro" inclui lugares como a avenida Paulista, bairros como Liberdade e Vila Madalena, além de museus. "O objetivo do programa é dar visibilidade aos locais mais importantes da cidade de São Paulo", diz texto da prefeitura.

Além disso, moradores reclamam que as placas do Autódromo foram instaladas em áreas distantes e onde não há circulação de turistas. "Tem placa que foi colocada atrás de onde já tinha outra. Não tem uma certa lógica nessas instalações", declara o designer Manoel Araújo, morador da zona norte. A placa citada foi instalada perto do metrô Tucuruvi e na frente de uma sinalização antiga que indica a direção para Santana, região central e Marginal Tietê.

O UOL já havia mostrado que há placas para Interlagos no Itaim Paulista e em Itaquera, na zona leste — são bairros que ficam a 40km ou mais do autódromo. Na última semana, a reportagem também verificou a sinalização em pontos como na Marginal Tietê, Radial Leste, entre outros.

Essa medida mostra muito da política viária na cidade de São Paulo, que é pouco valorizada. É uma coisa feita por uma demanda pontual, que não cabe em uma cidade de 12 milhões de habitantes. Precisamos de uma política de mobilidade e de um planejamento viário moderno, mais criativo.
Igor Pantoja, coordenador de relações institucionais da Rede Nossa São Paulo

Moradores criticam gasto e citam The Town

Para moradores, a prefeitura não precisava ter implantado tantas placas pela cidade. Nas redes sociais, há comentários criticando a medida e questionando quanto a gestão municipal gastou.

Na Avenida Marechal Tito, que liga os bairros de São Miguel, Vila Curuçá e Itaim Paulista, há três placas do Autódromo. "Isso é por causa do The Town, um marketing com péssimo gosto. Com estes inúteis gastos, poderiam investir em obras sociais e de educação", escreveu um moradores nas redes sociais.

Não faz sentido no Itaim Paulista ter uma placa do Autódromo. Se a prefeitura quer valorizar o turismo, indicar pontos turísticos para quem vem de fora, poderia ter uma placa do Parque do Carmo, do Parque Ecológico [ambos na zona leste] para valorizar o que temos na região.
Everton Barros, influenciador do Itaim Paulista e dono da página Itaim Acontece

No termo de parceria com o The Town, a prefeitura se compromete a realizar "adequações e obras estruturais necessárias à realização do evento", além de prestar serviços de "apoio de trânsito" e "engenharia de tráfego". Questionada sobre esse termo, a gestão municipal não respondeu.

Em Itaquera, na avenida Jacu-Pêssego sentido Mauá, há placas para o Autódromo, que fica a 58 quilômetros dali. Não há, entretanto, nenhuma sinalização para o Parque Raul Seixas, localizado em uma avenida paralela, nem para o Parque do Carmo, a cerca de 6 quilômetros.

Manoel Araújo comenta que a prefeitura deveria destinar o dinheiro para ações mais efetivas. "A gente acompanha que tem dinheiro na conta e o prefeito está segurando para gastar na eleição, mesmo depois da cidade passar por problemas de zeladoria, moradia e segurança nos últimos anos", opina o designer.

É um investimento que poderia ser usado para ações como urbanismo tático. Trabalhar para aumentar, por exemplo, o espaço para pedestres, aproximar cruzamentos, fazer faixas como aquela do Theatro Municipal que os pedestres conseguem atravessar na diagonal. São ações simples, com custo baixo e com melhor impacto.
Igor Pantoja, da Rede Nossa São Paulo

O que diz a Prefeitura de São Paulo

Instalação leva em conta o número de pessoas de fora da cidade com destino ao Autódromo, afirma a gestão Nunes. Na resposta, cita ainda os eventos de automobilismo, como a Fórmula 1, e os festivais de música, como o The Town.

O programa de orientação, segundo a prefeitura, também contempla placas relacionadas aos equipamentos de saúde (hospitais públicos e privados), segurança (como delegacias) e também funerários.