Conteúdo publicado há 21 dias

Justiça de SP autoriza aborto parcial de grávida de quíntuplos

A Justiça de São Paulo concedeu, na terça-feira (28), ordem para que uma mulher gestante fizesse um aborto parcial após realizar um procedimento de fertilização in vitro, no qual dois embriões deram origem a cinco fetos.

O que aconteceu

O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu ordem para que uma mulher fizesse uma redução embrionária. A mulher foi submetida a um processo de fertilização in vitro e teve dois embriões implantados no útero que se dividiram e resultaram em cinco fetos.

A situação foi considerada "absolutamente excepcional". Além disso, os magistrados consideraram o "risco de vida à gestante e a inviabilidade de vida extrauteriana de todos os embriões."

Decisão dos magistrados foi unânime. A decisão é assinada pelo juiz relator Luís Geraldo Lanfredi. Também participaram do julgamento os desembargadores Moreira da Silva, Marcelo Semer e Xisto Albarelli Rangel Neto.

"Concedo a ordem a fim de autorizar a redução gestacional da paciente", escreveu Lanfredi. "Em respeito aos paradigmas da dignidade da pessoas humana, da autodeterminação pessoal, da liberdade, da intimidade e dos direitos reprodutivos (...) concedo a ordem a fim de autorizar a redução gestacional da paciente."

Técnica deve observar bem estar da gestante, diz decisão. No voto, o relator escreve que deve "ser observada a melhor técnica que assegure a garantia da vida e bem estar da gestante e melhor expectativa de vida fora do útero os fetos em gestação."

Decisão analisou o habeas corpus impetrado pelo advogado do caso. Stefano Concenza Sternieri impetrou o recurso contra o Juízo de Direito da Vara Criminal de Olímpia, em São Paulo. Isso porque a instância julgou duas vezes improcedente o pedido de interrupção parcial da gravidez dos gêmeos quíntuplos.

O que diz a decisão judicial

Condição de saúde considerada inédita. "A fertilização de dois embriões mediante dois sacos gestacionais independentes que contêm, no entanto, gêmeos e trigêmeos, ambos univitelinos". O documento diz ainda que há necessidade de se ponderar "complicações inerentes à gravidez múltipla".

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Redução da gestação se apresenta "como solução mais adequada." Desembargadores consideraram a resposta "mais viável para se evitar resultados catastróficos e outros desdobramentos inimaginados, em detrimento da saúde da gestante e dos próprios fetos."

Documento cita o panorama constitucional. Segundo a decisão judicial, há precedentes do STF (Supremo Tribunal de Justiça) sobre casos nos quais o aborto é possível para além dos casos previstos em lei. Há também discussão sobre a proteção do direito à vida do feto, "que diminui diante da necessidade de defesa e tutela dos direitos das mulheres".

Há menção sobre o panorama internacional das discussões sobre aborto. No âmbito internacional, documento cita a ressignificação da autonomia da mulher e todos os direitos inerentes a situação. A decisão cita decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos e da Corte Europeia de Direitos Humanos.

Ordem concedida para "prestigiar igualdade de gênero". O documento afirma que a decisão sobrevaloriza os direitos de "todas as mulheres e meninas acerca da decisão com respeito a uma gravidez saudável e viável".

Brasil libera aborto em determinadas condições. O aborto é tipificado no Código Penal Brasileiro, de 1940. De acordo com a lei, o procedimento é permitido em apenas três casos: anencefalia fetal (má formação do cérebro), em gestações que colocam a vida da mãe em risco e em casos de estupro.

Procedimento deu origem a cinco fetos

Início do processo de fertilização. Casados desde junho de 2019, um homem e uma mulher decidiram realizar tratamento para infertilidade em dezembro daquele ano e conseguiram congelar 9 embriões.

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Transferência de novos embriões em março deste ano. Em fevereiro de 2020, a mulher realizou a transferência de dois embriões para o útero, o que resultou em uma gestação única. Segundo a decisão judicial, em 2024, eles decidiram aumentar a família. Como ainda tinham embriões congelados, optaram pela transferência de dois novos embriões. O procedimento ocorreu em 13 de março deste ano.

Exame mostrou gravidez de gêmeos quíntuplos. Em abril, um exame de ultrassom mostrou dois embriões em sacos gestacionais distintos, que deram origem a uma gravidez de quíntuplos.

Assustada, a mulher teria procurado profissionais de saúde para pedir orientação médica. Diante de quadro considerado excepcional da mulher, informaram em laudo que a gravidez acarretaria perigo e resultaria em prejuízo à vida dela e dos fetos.

Riscos da gestação apontados por médicos que acompanham paciente. Médicos apontaram que uma gestação de quíntuplos acarretava alto risco de mortalidade para os bebês e para a gestante. A partir dessa análise médica, o casal manifestou interesse pela redução embrionária, segundo a decisão da justiça.

Procedimento, porém, não é autorizado pelo Conselho Federal de Medicina. Com isso, o casal passou a procurar autorização judicial.

Outro médico reiterou o mesmo laudo no dia 2 de maio. Ele acrescentou informações de estudos científicos que demonstrariam o risco de morte para a gestante e os embriões. A orientação era de que o procedimento cirúrgico fosse ser realizado antes de serem concluídas as 12 semanas de gestação.

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O casal pretende manter gestação dos gêmeos em um dos sacos gestacionais — que está separado e independente do outro. A mulher tem 37 anos e 1,55 metro de atura.

"Gravidez múltipla é sabidamente mais complicada, sobretudo quando os gêmeos são univitelinos", escreveu o relator. Isso porque se tratam de fetos que vão partilhar do mesmo saco gestacional, da mesma placenta e vão se desenvolver em um espaço pequeno.

Não faz o menor sentido, diante dos avanços da tecnologia e do conhecimento científico que experimentamos na realidade, permitir-se tolerar um quadro de indefinições ou de imprecisões, quando se sabe que a chance de vingar um desejo comum é de todo inviável e está absolutamente prejudicada.
Luís Geraldo Lanfredi, juiz relator do Tribunal de Justiça de São Paulo

Indeferir o pedido de interrupção da gravidez seria impor aos pacientes o constrangimento e a dor de vivenciarem a morte dos futuros filhos e, até mesmo, da própria paciente.

O que dizem as partes

Ministério Público manifestou-se contrário ao pedido. Segundo o parecer, a alegação foi de que "não ficou comprovada a existência de risco para os fetos." Mas assinalou que o aborto poderá ser levado a efeito pelo médico caso "se entenda acerca do risco de vida para a gestante".

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Médica ginecologista e obstetra Helena Borges Martins da Silva Paro foi nomeada como perita para análise clínica do caso. Perícia ocorreu na modalidade telepresencial. Mais uma vez, pedido foi considerado improcedente.

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