Conteúdo publicado há 5 meses

Justiça de SP autoriza aborto parcial de grávida de quíntuplos

A Justiça de São Paulo concedeu, na terça-feira (28), ordem para que uma mulher gestante fizesse um aborto parcial após realizar um procedimento de fertilização in vitro, no qual dois embriões deram origem a cinco fetos.

O que aconteceu

O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu ordem para que uma mulher fizesse uma redução embrionária. A mulher foi submetida a um processo de fertilização in vitro e teve dois embriões implantados no útero que se dividiram e resultaram em cinco fetos.

A situação foi considerada "absolutamente excepcional". Além disso, os magistrados consideraram o "risco de vida à gestante e a inviabilidade de vida extrauteriana de todos os embriões."

Decisão dos magistrados foi unânime. A decisão é assinada pelo juiz relator Luís Geraldo Lanfredi. Também participaram do julgamento os desembargadores Moreira da Silva, Marcelo Semer e Xisto Albarelli Rangel Neto.

"Concedo a ordem a fim de autorizar a redução gestacional da paciente", escreveu Lanfredi. "Em respeito aos paradigmas da dignidade da pessoas humana, da autodeterminação pessoal, da liberdade, da intimidade e dos direitos reprodutivos (...) concedo a ordem a fim de autorizar a redução gestacional da paciente."

Técnica deve observar bem estar da gestante, diz decisão. No voto, o relator escreve que deve "ser observada a melhor técnica que assegure a garantia da vida e bem estar da gestante e melhor expectativa de vida fora do útero os fetos em gestação."

Decisão analisou o habeas corpus impetrado pelo advogado do caso. Stefano Concenza Sternieri impetrou o recurso contra o Juízo de Direito da Vara Criminal de Olímpia, em São Paulo. Isso porque a instância julgou duas vezes improcedente o pedido de interrupção parcial da gravidez dos gêmeos quíntuplos.

O que diz a decisão judicial

Condição de saúde considerada inédita. "A fertilização de dois embriões mediante dois sacos gestacionais independentes que contêm, no entanto, gêmeos e trigêmeos, ambos univitelinos". O documento diz ainda que há necessidade de se ponderar "complicações inerentes à gravidez múltipla".

Continua após a publicidade

Redução da gestação se apresenta "como solução mais adequada." Desembargadores consideraram a resposta "mais viável para se evitar resultados catastróficos e outros desdobramentos inimaginados, em detrimento da saúde da gestante e dos próprios fetos."

Documento cita o panorama constitucional. Segundo a decisão judicial, há precedentes do STF (Supremo Tribunal de Justiça) sobre casos nos quais o aborto é possível para além dos casos previstos em lei. Há também discussão sobre a proteção do direito à vida do feto, "que diminui diante da necessidade de defesa e tutela dos direitos das mulheres".

Há menção sobre o panorama internacional das discussões sobre aborto. No âmbito internacional, documento cita a ressignificação da autonomia da mulher e todos os direitos inerentes a situação. A decisão cita decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos e da Corte Europeia de Direitos Humanos.

Ordem concedida para "prestigiar igualdade de gênero". O documento afirma que a decisão sobrevaloriza os direitos de "todas as mulheres e meninas acerca da decisão com respeito a uma gravidez saudável e viável".

Brasil libera aborto em determinadas condições. O aborto é tipificado no Código Penal Brasileiro, de 1940. De acordo com a lei, o procedimento é permitido em apenas três casos: anencefalia fetal (má formação do cérebro), em gestações que colocam a vida da mãe em risco e em casos de estupro.

Procedimento deu origem a cinco fetos

Início do processo de fertilização. Casados desde junho de 2019, um homem e uma mulher decidiram realizar tratamento para infertilidade em dezembro daquele ano e conseguiram congelar 9 embriões.

Continua após a publicidade

Transferência de novos embriões em março deste ano. Em fevereiro de 2020, a mulher realizou a transferência de dois embriões para o útero, o que resultou em uma gestação única. Segundo a decisão judicial, em 2024, eles decidiram aumentar a família. Como ainda tinham embriões congelados, optaram pela transferência de dois novos embriões. O procedimento ocorreu em 13 de março deste ano.

Exame mostrou gravidez de gêmeos quíntuplos. Em abril, um exame de ultrassom mostrou dois embriões em sacos gestacionais distintos, que deram origem a uma gravidez de quíntuplos.

Assustada, a mulher teria procurado profissionais de saúde para pedir orientação médica. Diante de quadro considerado excepcional da mulher, informaram em laudo que a gravidez acarretaria perigo e resultaria em prejuízo à vida dela e dos fetos.

Riscos da gestação apontados por médicos que acompanham paciente. Médicos apontaram que uma gestação de quíntuplos acarretava alto risco de mortalidade para os bebês e para a gestante. A partir dessa análise médica, o casal manifestou interesse pela redução embrionária, segundo a decisão da justiça.

Procedimento, porém, não é autorizado pelo Conselho Federal de Medicina. Com isso, o casal passou a procurar autorização judicial.

Outro médico reiterou o mesmo laudo no dia 2 de maio. Ele acrescentou informações de estudos científicos que demonstrariam o risco de morte para a gestante e os embriões. A orientação era de que o procedimento cirúrgico fosse ser realizado antes de serem concluídas as 12 semanas de gestação.

Continua após a publicidade

O casal pretende manter gestação dos gêmeos em um dos sacos gestacionais — que está separado e independente do outro. A mulher tem 37 anos e 1,55 metro de atura.

"Gravidez múltipla é sabidamente mais complicada, sobretudo quando os gêmeos são univitelinos", escreveu o relator. Isso porque se tratam de fetos que vão partilhar do mesmo saco gestacional, da mesma placenta e vão se desenvolver em um espaço pequeno.

Não faz o menor sentido, diante dos avanços da tecnologia e do conhecimento científico que experimentamos na realidade, permitir-se tolerar um quadro de indefinições ou de imprecisões, quando se sabe que a chance de vingar um desejo comum é de todo inviável e está absolutamente prejudicada.
Luís Geraldo Lanfredi, juiz relator do Tribunal de Justiça de São Paulo

Indeferir o pedido de interrupção da gravidez seria impor aos pacientes o constrangimento e a dor de vivenciarem a morte dos futuros filhos e, até mesmo, da própria paciente.

O que dizem as partes

Ministério Público manifestou-se contrário ao pedido. Segundo o parecer, a alegação foi de que "não ficou comprovada a existência de risco para os fetos." Mas assinalou que o aborto poderá ser levado a efeito pelo médico caso "se entenda acerca do risco de vida para a gestante".

Continua após a publicidade

Médica ginecologista e obstetra Helena Borges Martins da Silva Paro foi nomeada como perita para análise clínica do caso. Perícia ocorreu na modalidade telepresencial. Mais uma vez, pedido foi considerado improcedente.

Deixe seu comentário

Só para assinantes