Loucas atrás de homem: desembargador pede licença remunerada após polêmica
Do UOL e colaboração para o UOL, em São Paulo
10/07/2024 16h58Atualizada em 10/07/2024 19h00
O desembargador Luis César de Paula Espíndola solicitou licença remunerada até o fim de julho. O magistrado se envolveu em uma polêmica após afirmar que as mulheres estão "loucas atrás de homem" durante um julgamento na última quarta-feira (3) no Paraná.
O que aconteceu
Magistrado pediu licença no período de 10 a 31 de julho. A solicitação de licença está prevista no Estatuto dos Funcionários do Poder Judiciário. O TJ-PR (Tribunal de Justiça do Paraná) informou que não irá se manifestar sobre o assunto.
O desembargador continuará recebendo salário. O Portal da Transparência do TJ-PR aponta que, em maio deste ano, o total de rendimentos do magistrado foi cerca de R$ 133.600,00. Após os descontos, o rendimento líquido foi de R$ 92.673,88.
Luis Cesar de Paula Espíndola é presidente da 12º Câmara Cível do TJ-PR. que já foi condenado por violência contra a mulher, afirmou que as mulheres estão "loucas atrás de homem" durante julgamento do caso de uma menina de 12 anos assediada por um professor.
Gabinete informou que o juiz se afastou para cuidar da mãe. "O motivo do afastamento foi para cuidar da saúde da mãe do Desembargador Espindola, que, por conta da repercussão da mídia, teve seu quadro de saúde prejudicado", informou em nota.
O TJ-PR informou que uma investigação preliminar foi aberta na Corte. O Tribunal acrescentou que "não compartilha de qualquer opinião que possa ser discriminatória ou depreciativa, como, aliás, é próprio de sua tradição e história de mais de 132 anos."
OAB pediu afastamento imediato do desembargador. A seccional do Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil apresentou uma reclamação disciplinar ao corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) alegando que as manifestações de Espíndola são graves e reforçam pré-julgamentos e estereótipos de gênero. O texto também aponta que o juiz desrespeitou a advocacia e apresentou conduta incompatível com o exercício do cargo, uma vez que o desembargador atua em uma turma que trata cotidianamente de violência intrafamiliar.
Relembre o caso
Desembargador se manifestou de forma crítica ao feminismo durante sessão realizada na última quarta-feira (3). Na ocasião, a Corte analisava o pedido de medida protetiva a uma menina de 12 anos que denunciou ter sido assediada pelo professor. O relator do caso e a maioria dos magistrados votou para manter as medidas protetivas, mas Espíndola divergiu e teceu críticas ao comportamento feminino.
Espíndola afirmou que o caso iria "estragar a vida do professor". Para o desembargador, a ação julgada se tratava de "ego de adolescente" em busca de "atenção", e que o professor apenas foi "infeliz", mas que "aprendeu a lição".
Após as falas do desembargador, uma colega reagiu e disse ser importante considerar a palavra da vítima. O presidente do colegiado rebateu a colega ao afirmar se tratar de um "discurso feminista desatualizado" e disse que, na verdade, são "as mulheres que estão assediando" os homens.
Espíndola afirmou que as mulheres "correm atrás dos homens" porque "não tem mercado" para elas. "A mulherada está louca para levar um elogio, uma piscada, uma cantada respeitosa. Vai no parque. Só tem mulher com cachorrinho, louca para encontrar um companheiro. A paquera é uma conduta que sempre existiu, sadia", declarou.
Desembargador já foi condenado por violência doméstica. Em março de 2023, o Superior Tribunal de Justiça condenou Espíndola à pena de quatro meses e 20 dias, em regime aberto, por agressão contra a própria irmã durante uma discussão. A pena foi suspensa com a condição de que ele prestasse serviços comunitários, além de ter permitido que o magistrado continuasse com suas funções na Justiça do Paraná.
O vídeo com as declarações de Espíndola foi retirado do ar pelo TJPR. Em nota, o Tribunal alegou que a exclusão se deu para "preservar" as partes envolvidas na ação, que corre em segredo de Justiça. O órgão ressaltou "não endossar os comentários" do desembargador e informou que foi aberta investigação para apurar as falas do magistrado. Ele tem até cinco dias para se manifestar formalmente.
Entidades reagem
Comissão de Igualdade de Gênero do TJPR classificou as falas do desembargador como "lamentáveis", que constrangeram "toda a magistratura paranaense". "O episódio revela o quão ainda estão internalizados neste segmento específico da sociedade brasileira, opiniões preconceituosas, conceitos misóginos, hábitos discriminatórios, desrespeitosos e até predatórios contra pessoas do gênero feminino, crianças, adolescentes e adultas, reduzidas a condição de seres de segunda classe e, neste caso, de ameaças o livre exercício da masculinidade dos 'cidadãos de bem'", diz a nota.
Entidade destacou se tratar de uma forma de pensar "altamente discriminatória e desrespeitosa com as mulheres, totalmente incompatível com a dignidade e solenidade de uma Sessão de Julgamento". Sobretudo, continuou a Comissão, "por expressar a injustificada ignorância sobre o protocolo para julgamento com perspectiva de gênero, de cumprimento obrigatório pelos Magistrados e Tribunais, além do desprezo e desrespeito pelas colegas desembargadoras, servidoras e demais mulheres presentes naquele ambiente físico e virtual".
Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil do Paraná disse que a fala do desembargador é "odiosa e estarrecedora". "A posição assumida pelo julgador merece repúdio, uma vez que atua na contramão de um esforço coletivo no enfrentamento das barreiras impostas às mulheres e, em especial, por partir de um servidor público com quem a sociedade deveria contar para acolher as vítimas e promover a justiça. Nunca o contrário".
Outro lado
Em nota, Luís Cesar de Paula Espíndola afirmou não ter tido a "intenção de menosprezar o comportamento feminino" em suas falas. O desembargador disse "sempre" ter defendido direitos igualitários entre ambos os gêneros e se solidarizar com "todas que se sentiram ofendidas" por suas declarações. Veja a nota na íntegra:
Esclareço que nunca houve a intenção de menosprezar o comportamento feminino nas declarações proferidas por mim durante a sessão da 12ª Câmara Cível do Tribunal, afinal, sempre defendi a igualdade entre homens e mulheres, tanto em minha vida pessoal quanto em minhas decisões. Lamento profundamente o ocorrido e me solidarizo com todas e todos que se sentiram ofendidos com a divulgação parcial do vídeo da sessão.
Desembargador Luis Cesar de Paula Espíndola