OPINIÃO
Ameaça? Nunes usa cadeira e 'silêncio' em direito de resposta a Marçal
Matheus Pichonelli
Colunista convidado
27/09/2024 11h58
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), ganhou na Justiça Eleitoral um direito de resposta a um dos muitos ataques promovidos por Pablo Marçal (PRTB).
A sentença previa a publicação de um vídeo do candidato à reeleição nas redes sociais do adversário.
Relacionadas
Até aí, zero novidade: o prefeito estava ofendido porque foi chamado de "canalha" e procurou reparação na Justiça.
Mas Nunes desta vez inovou e, em vez de ler a sentença ou a nota de repúdio em teleprompter, como costumam fazer os postulantes quando se sentem ofendidos, decidiu transformar o direito de resposta em performance de teatro contemporâneo — minimalista, mas cheio de elipses e significados.
Na peça, Nunes entra em cena como um torturador a mostrar algum objeto de sevícia à vítima. Em vez de cassetete, o objeto batucado com o olhar fixo na presa é uma banqueta.
Sim, um acessório similar ao usado por outro candidato, José Luiz Datena (PSDB), para alvejar o rival no debate da TV Cultura, no início do mês.
Nunes entra em cena vestindo terno chumbo, camisa azul e sem gravata. O cenário é todo cinza tal qual o figurino.
"Pablo Henrique! Mais um direito de resposta", diz o prefeito, balançando a cabeça diante do aluno mal comportado. Ele, então, deixa a banqueta no centro da cena e avisa: "Fui".
E vai.
A cadeira fica.
Para bom entendedor, meia ameaça basta.
Sobre o assento aparece, em seguida, a mensagem: "Esse banco está aqui em forma de protesto, pelo desrespeito do candidato Pablo ao povo de São Paulo e a mim. Isso já cansou. Pablo Henrique, olhe para esse banco e reflita sobre o conselho que seu pai te deu: 'Honra tua família, sai dessa!".
No futuro alguém poderá dizer que foi assim, pensando caminhar em direção à reeleição, que Nunes se descobriu ator: vestindo o figurino de gangster e tentando produzir na plateia (no caso, Marçal) a libertação de uma tensão emocional que os especialistas chamam de catarse.
Tenta fazer isso batendo onde mais dói.
O punho ferido? Não. A lembrança do diálogo do ex-coach com o pai quando ele se envolveu com uma quadrilha responsável por aplicar golpes eletrônicos em Goiânia.
"Honra tua família, sai dessa" foi exatamente a frase dita na época pelo pai do hoje candidato.
A turma que preparava elenco em "Tropa de Elite" deve ter até arrepiado.
Para quem se apoia em uma plataforma que mistura discurso motivacional e religião, e que tem na palavra "família" um ponto central, a lembrança é ou deveria ser destruidora a Pablo Marçal.
Entre xingamentos e agressões, muitas linhas foram ultrapassadas nesta eleição. Tantas que ninguém mais se lembra de qual era o ponto de origem.
E já não choca ninguém que um prefeito faça uma ameaça pública assim a um rival e traga, a tiracolo, questão familiar ao baile — no caso, contra quem mais usou a família alheia para covardemente produzir gatilhos emocionais em oponentes.
Apesar da musiquinha de sitcom usada na "peça", não tem nada de engraçado nisso.
Ou então ninguém mais vai estranhar se no dia da eleição os candidatos acordarem com uma cabeça de cavalo na cama.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL