Como Israel está tentando melhorar relações com alguns países árabes
Era uma cena impensável até poucas semanas atrás: uma ministra israelense, com lágrimas de alegria nos olhos, cantando orgulhosamente o hino nacional de seu país em um evento esportivo no coração do mundo árabe.
O espetáculo de Miri Regev cantando “HaTikva”, que descreve o anseio judaico por uma terra natal em Sião, foi apenas uma de uma série de aparições públicas de autoridades israelenses em Estados árabes do Golfo Pérsico que estão acabando com tabus e que mostram os canais secretos de negociação do passado ao público.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, há anos se vangloria de aquecer os laços com importantes Estados árabes que não têm relações diplomáticas com Israel. Mas esses laços, ainda largamente impopulares entre o público árabe, raramente eram visíveis.
Isso mudou no fim de outubro, quando Netanyahu fez uma visita surpresa a Omã, onde conheceu o governante local, o sultão Qaboos bin Said. A viagem marcou a primeira visita de um líder israelense em mais de 20 anos ao minúsculo estado do Golfo Pérsico, um aliado dos EUA que no passado facilitou as negociações entre os americanos e o Irã.
"Essas foram conversas importantes, tanto para o estado de Israel quanto em relação a negociações importantes para a segurança de Israel", disse Netanyahu a seu gabinete no domingo (28). "E haverá mais."
Enquanto ele falava, Regev estava nos Emirados Árabes Unidos com uma delegação israelense em um torneio de judô --cenário de suas lágrimas de felicidade depois que o judoca israelense Sagi Muki conquistou a medalha de ouro-- e o ministro de Comunicações de Netanyahu foi para os Emirados Árabes Unidos para uma conferência de segurança.
O ministro israelense dos Transportes, Yisrael Katz, deve ir a Omã na próxima semana para uma conferência, onde deve apresentar seu plano para uma ligação ferroviária entre os países árabes do Golfo e Israel.
A força motriz dessas visitas parece ser uma preocupação compartilhada sobre o Irã. Israel e muitos dos países árabes do Golfo consideram o Irã uma força desestabilizadora, se intrometendo em conflitos e apoiando rivais em toda a região. Omã, que faz fronteira com a Arábia Saudita e fica na foz do Golfo Pérsico, muitas vezes desempenhou o papel de mediador regional.
As visitam também oferecem uma oportunidade para esses países árabes bajularem Washington. O presidente Donald Trump prometeu apresentar um plano para o "acordo do século" para a paz no Oriente Médio, e a confiabilidade da Arábia Saudita como um canal influente foi questionada em meio às consequências do assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi no consulado do reino em Istambul, na Turquia.
A aparição emocionada de Regev no domingo, na cerimônia da medalha de ouro em Abu Dhabi, foi inédita e especialmente notável, dada a sua inclinação política. Em casa, ela é uma nacionalista sincera e popular entre os linhas-dura.
Em Abu Dhabi, Regev também visitou a grande mesquita Sheikh Zayed. Vestindo um lenço na cabeça e o vestido tradicional até o chão conhecido como abaya, ela foi calorosamente recebida por autoridades locais.
Enquanto as visitas de Netanyahu e seus ministros do Partido Likud são um enorme impulso de relações públicas para ele em casa, elas não sinalizam imediatamente uma aceitação árabe de Israel.
O conflito palestino-israelense continua sendo um problema emocional com o público árabe, e as relações provavelmente permanecerão limitadas sem um acordo de paz.
Forças israelenses mataram mais de 160 palestinos durante meses de protestos liderados pelo Hamas na Faixa de Gaza contra o bloqueio israelense e a profunda crise humanitária. O processo de paz está congelado há anos e o presidente palestino, Mahmoud Abbas, cortou relações com Washington depois que a Casa Branca reconheceu Jerusalém como a capital de Israel no ano passado e transferiu sua embaixada para a cidade.
Os palestinos temem que Trump esteja tentando obter apoio da Arábia Saudita e de outros países do Golfo Pérsico para pressionar os palestinos a aceitarem um plano de paz que está muito aquém de suas exigências.
Em Mascate, a reunião de Netanyahu parecia destinada a lidar com o conflito palestino-israelense e seus laços estreitos com o governo Trump. Com a insistência de Netanyahu, os EUA abandonaram este ano o acordo nuclear com o Irã, que Omã havia apoiado.
Após a visita, o ministro das Relações Exteriores de Omã, Yousef bin Alawi, sugeriu que o encontro foi apenas uma tentativa estratégica de lidar com algumas das questões mais prementes do Oriente Médio. Em entrevista à Al-Jazeera, ele disse que Netanyahu havia iniciado a reunião para apresentar seus pontos de vista sobre questões do Oriente Médio ao sultão Qaboos.
"O que o sultão Qaboos está fazendo agora é nada menos do que uma intervenção", disse Sigurd Neubauer, um especialista em Omã. "Omã está se intrometendo no processo de paz palestino-israelense por uma razão óbvia, e isso é porque os estados árabes estão muito divididos".
Omã é também o único país árabe no Golfo que poderia ter hospedado Netanyahu sem medo de uma reação desestabilizadora, disse Neubauer.
Isso porque o sultão Qaboos, no poder desde 1970, tem linhas diretas de comunicação com diversos países da região, graças à sua longa política de não-interferência. Omã intermediou a libertação de reféns ocidentais no Iêmen e forneceu uma alternativa para as comunicações entre Washington e Teerã sob o governo Obama. É membro do Conselho de Cooperação do Golfo, liderado pela Arábia Saudita, mas não se juntou ao reino em seu boicote ao Qatar ou à guerra no Iêmen.
Mesmo as declarações do Partido Fatah, da Palestina, e do Irã não condenaram diretamente Omã após a visita de Netanyahu, criticando as tentativas de Israel de normalizar as relações com os países árabes antes que um acordo de paz seja alcançado.
Para Omã, receber Netanyahu enviou uma mensagem à administração Trump de que Mascate é um valioso player regional.
"A moeda é a moeda americana", disse Yoel Guzansky, pesquisador sênior do Instituto de Estudos de Segurança Nacional de Israel. "Omã pode mostrar que é um intermediário, um canal não apenas entre Israel e os palestinos, mas, de maneira mais ambiciosa, entre o Irã e Israel".
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