Biden enfrenta desafio para manter eleitorado negro, decisivo em 2020
A preferência do eleitorado negro por Joe Biden diminuiu desde a última eleição, segundo pesquisa do Pew Research Center. Com falta de outras opções e sinalização de apoio de personalidades, Trump está ganhando espaço, mesmo que mínimo, dentro da comunidade.
O que aconteceu
Margem de negros que votam em Joe Biden diminuiu, de acordo com pesquisa. Entre os eleitores negros, em 2020, Biden conquistou 92% dos votos — conseguindo vencer a disputa pela presidência. Contudo, segundo projeções para 2024, esse apoio se dissipou, e agora a margem de negros que apoiam Biden caiu para 77%.
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Mesmo assim, a maioria absoluta ainda prefere o democrata. Em 2020, 8% do eleitorado negro escolheu Trump. Para 2024, a projeção aumentou para 18% do recorte dizendo votar no republicano.
Negros representam 14% da população dos EUA. Segundo Pew Research, eles devem representar, também, 14% dos eleitores em novembro. A projeção, publicada em maio, é a mais completa na análise de recorte étnico/racial para as eleições americanas de 2024 até então.
Além do desafio da margem de votos, muitas pessoas da comunidade, historicamente, sequer vão votar. Quem diz isso é Sean Purdy, doutor em História da América com ênfase nos Estados Unidos e docente na USP (Universidade de São Paulo). Ele explica que grande parte do eleitorado mais vulnerável do país não vota porque não vê diferença entre os candidatos.
Apesar de apoio a Biden e críticas a Trump, quase metade dos eleitores negros diz que votaria em uma opção melhor que os dois. Para 49% dos eleitores negros, uma terceira via ao pleito atual seria a melhor solução. "Talvez se a Kamala estivesse, algumas pessoas iriam votar pelo fato de ser ela. Mas não dá para ter certeza. E ela também é a ala à direita do partido democrata", explica o professor sobre uma possível candidatura da atual vice-presidente.
Tem muito a ver com o fato de muitos eleitores, não só negros, não enxergarem muita diferença nos dois partidos e nos dois candidatos. Não veem diferença entre políticas sociais e econômicas dos dois partidos. É uma tendência nos últimos 30 anos. O Partido Democrata tem mudado mais para a centro-direita que antigamente. Tem outra questão: só dois terços da população costumam votar nos EUA. A proporção dos mais pobres às vezes nem vota.
Sean Purdy, doutor em História da América e professor da USP
Negros jovens são mais Trumpistas?
Negros jovens aptos a votar são mais propensos a dizer que votariam em Trump do que os negros mais velhos, diz Pew Research Center. Enquanto 68% do eleitorado negro com menos de 50 anos é a favor de Biden, 29% apoia Trump.
Eleitores negros com 50 anos ou mais são a favor de Biden por uma margem significativamente maior: 84% para o democrata contra 9% que dizem votar no republicano.
Eleitorado negro jovem pode ter sido influenciado por posicionamentos de personalidades do "hype" nos EUA. Historicamente, rappers como Kanye West, Fifth Cent, Lil Wayne e Kodak Black, além da cantora Amber Rose e da apresentadora de talk shows Candace Owens, já declararam apoio ao republicano.
Todas essas personalidades contam com bases de influência fortes, principalmente nas redes sociais - com milhões de seguidores.
Campanhas para captar votos dos negros
Trump tenta arrebanhar votos indo a eventos da comunidade negra. Recentemente, ele esteve no Black Conservative Federation Gala, na Carolina do Sul, na 180 Church, em Michigan, e no South Bronx, em Nova York, para discursar para os eleitores do grupo e anunciar o projeto "Black Americans for Trump" — negros americanos para Trump, na tradução literal.
O empresário usou seus processos judiciais e o que ele chama de "perseguição" para atrair votos negros. De acordo com ele, seus processos criminais se parecem à discriminação histórica que os negros enfrentam nos EUA.
Em comício, Trump afirmou que os negros começaram a votar nele porque "o que está acontecendo comigo, acontece com eles". A fala carrega o contexto do embate do republicano na Justiça norte-americana - ele foi condenado por 34 crimes.
Biden, por sua vez, na convenção nacional democrata, no dia 16 de julho, se concentrou em apontar falas problemáticas de Trump. "Os eleitores negros não se esqueceram de que ele espalhou teorias de conspiração racista contra Barack Obama (...) o desemprego entre negros e as taxas de pessoas sem seguro dispararam quando Trump estava na Casa Branca", finalizou.
Falta de opções e abstenção
O pleito pode ser decidido pelos que preferem a abstenção. Sem a obrigação de votar, em 2020, apenas 66,7% dos norte-americanos aptos compareceram às urnas. Purdy pontua a complexidade do sistema eleitoral dos Estados Unidos sempre pesa no resultado. Questionado sobre outros fatores que podem interferir na corrida eleitoral do país, o professor da USP apontou para a escolha do vice de Trump e os grupos sociais dos EUA.
Esse terço da população que não vota acha que votar não faz diferença. Eles veem que não há projetos políticos diferentes. Ainda tem o fator de que muitos não têm direito a voto, como os presos, por exemplo. Quando você olha a votação de 2016, que Trump ganhou, nem metade da população votou nele. Muita gente nem votou.
Sean Purdy, doutor em História da América e professor da USP
O vice de Trump é muito diferente dele. Se olharmos a trajetória dele, ele vem de origens humildes, ele está casado com uma mulher filha de indianos. Ele recentemente se converteu ao catolicismo. Quase nenhum presidente é católico, todos eram protestantes.
Sean Purdy, doutor em História da América e professor da USP
Os grupos sociais podem interferir e fazer diferença na corrida. Principalmente pela conexão com os palestinos. A comunidade negra se dá muito solidária ao grupo. Ele não vai votar no Biden, pelo seu apoio massivo a Israel. Eles não vão votar no Trump também, ele tem a mesma visão, ou até mais intensificada. Eles não vão votar em ninguém.
Sean Purdy, doutor em História da América e professor da USP