Walkie-talkies do Hezbollah explodem no Líbano e matam ao menos 20 pessoas
Um dia após uma sequência de explosões de pagers, que matou 12 pessoas e feriu quase 3.000, walkie-talkies do Hezbollah explodiram no subúrbio de Beirute e mataram ao menos 20 pessoas, segundo balanço oficial do Ministério da Saúde do Líbano.
O que aconteceu
Pelo menos uma das explosões ocorreu perto de um funeral organizado pelo Hezbollah para os mortos no dia anterior, segundo a agência estatal. A multidão ficou desesperada após os equipamentos explodirem. Em vídeos divulgados por agências locais é possível ouvir estrondos e gritos. Fotografias dos aparelhos destruídos também foram publicadas nas redes sociais.
Vítimas morreram na região libanesa de Bekaa. O Ministério da Saúde do Líbano informou que explosões deixaram cerca de 450 feridos.
Aparelhos detonaram no final da tarde de hoje (horário local, cerca de 11h30 no horário de Brasília). Os ataques aconteceram em todo o sul do país e nos subúrbios ao sul da capital Beirute. Os rádios portáteis foram adquiridos pelo Hezbollah há cinco meses, na mesma época em que os pagers foram comprados, disse uma fonte de segurança à Reuters.
A agência de notícias libanesa também declarou que sistemas de energia solar de casas e aparelhos para biometria em Beirute também explodiram. Mais de 30 ambulâncias foram enviadas para o sul e leste do Líbano, disse a Cruz Vermelha. Em uma publicação no X, o órgão informou que outras 50 ambulâncias foram colocadas em alerta para apoiar as operações de resgate e evacuação
Walkie-talkies são dispositivos de voz usados para comunicação por ondas de rádio. Os aparelhos, que ficaram obsoletos, costumavam ser adquiridos em conflitos do passado para esconder sinais dos adversários.
O secretário-geral da ONU, Antonio Gueterres, condenou o uso de "objetos civis" como arma de guerra. "É muito importante que haja um controle eficaz dos objetos civis para não transformá-los em armas. Esta deveria ser uma regra para todos no mundo, que os governos deveriam ser capazes de aplicar", disse Guterres hoje à imprensa.
O Hezbollah é aliado do grupo extremista Hamas, protagonista de uma guerra de quase um ano contra Israel na Faixa de Gaza. Embora a violência tenha recentemente aumentado, há décadas a fronteira entre Israel e o Líbano é cenário de conflitos.
Israel ainda não emitiu nenhuma confirmação oficial sobre o envolvimento do país nas explosões de hoje e ontem. Sem citar a onda de explosões, o chefe das Forças de Defesa de Israel, o general Herzi Halevi, declarou nesta quarta-feira que o país tem "muito mais capacidades" que ainda não foram usadas na luta contra o Hezbollah.
O Hezbollah, aliado do Hamas, ameaçou Israel. Em um comunicado, o grupo disse que "a resistência islâmica no Líbano continuará (...) suas operações para apoiar Gaza" e prometeu um "ajuste de contas severo" contra os israelenses.
Ferimentos graves. No hospital Hôtel-Dieu de Beirute, a paramédica Joelle Khadra relatou que a maioria dos feridos tinha lesões nos olhos e nas mãos, com amputações de dedos, e que alguns perderam a visão.
Estamos muito determinados a criar as condições de segurança que levarão os residentes [do norte] de volta às suas casas, às cidades, com um elevado nível de segurança, e estamos prontos para fazer tudo o que for necessário para permitir isso.
Herzi Halevi, comandante do Exército de Israel
Explosões de pagers no dia anterior
Subiu para 12 o número de mortos após explosões simultâneas de 'pagers' do Hezbollah, no Líbano, na terça-feira (17). Explosões aconteceram de forma simultânea, por volta das 15h45 (horário local). O anúncio foi feito pela televisão estatal iraniana.
Uma fonte próxima ao Hezbollah atribuiu as explosões a um ataque cibernético "israelense". Segundo o jornal New York Times, os explosivos foram escondidos pelas forças do estado judeu.
Israel não se pronunciou diretamente sobre as explosões. No site das IDF (Forças de Defesa de Israel), há apenas um registro feito às 13h55 (horário local) sobre a identificação "vários terroristas do Hezbollah operando na estrutura militar da organização na área de Blaida, no sul do Líbano". "Fechando o círculo do ar, caças atacaram o prédio e mataram três terroristas que operavam lá", diz o registro.
Uma menina de 10 anos, filha de um membro do Hezbollah no Líbano, está entre os mortos. Ela morreu quando o pager de seu pai explodiu, segundo sua família. Entre os mortos também estão os filhos de dois deputados do Hezbollah, Ali Ammar e Hassan Fadlallah, disse à AFP uma fonte.
O embaixador do Irã no Líbano, Mojtaba Amani, ficou ferido em uma das explosões. De acordo com a televisão estatal iraniana, o diplomata "está consciente". Na Síria, 14 membros do Hezbollah também ficaram feridos, afirmou a ONG Observatório Sírio dos Direitos Humanos. Os Estados Unidos advertiram o Irã para "não aumentar as tensões" na região. O Brasil condenou o ataque.
Maioria das vítimas apresenta ferimentos "no rosto, nas mãos, no abdômen e até mesmo nos olhos". Não houve comentário imediato das Forças Armadas israelenses, que vêm trocando disparos com o Hezbollah desde outubro passado, paralelamente à guerra de Gaza.
Um vídeo que circula nas redes sociais mostra um dispositivo explodindo no bolso de um homem. Ele estava dentro de um mercado em Beirute. Fotógrafos da agência de notícias Associated Press nos hospitais da região descreveram que as urgências estavam sobrecarregadas de doentes, muitos deles com ferimentos nos olhos, na barriga e nas mãos e alguns em estado grave.
Pagers se popularizaram nos anos 1990. Os aparelhos caíram em desuso devido à evolução dos celulares, mas ainda hoje são o meio de comunicação preferido pelo Hezbollah para evitar o risco de interceptação de mensagens. No Brasil, eles ficaram conhecidos como "bipes".
A agência oficial de notícias do Líbano relatou que o sistema "foi hackeado com alta tecnologia". "Um incidente de segurança sem precedentes nos subúrbios ao sul de Beirute e em várias regiões libanesas", afirmou a agência.
O movimento Hezbollah havia pedido aos seus membros que parassem de usar celulares. O objetivo era evitar o risco de intercepção por parte de Israel. Por isso, o grupo islâmico xiita instalou um sistema de pagers, que não necessita de cartões SIM ou conexão com a internet, para se organizar e convocar seus integrantes para ingressar em suas unidades.
Após as explosões, o Hezbollah pediu que membros joguem aparelhos fora. "Cada um que receber um novo pager, jogue-o fora", diz uma mensagem de voz que circulou entre os membros do Hezbollah, segundo um dos membros, que a compartilhou com o The Washington Post.
Hezbollah promete vingança
O grupo terrorista prometeu vingança após as explosões. "Agressão criminosa que também teve como alvo civis", diz comunicado do Hezbollah. O grupo afirmou que os seus "mártires e feridos" foram sacrificados. Os representantes anunciaram que a resposta virá "de onde o inimigo a espera e de onde não a espera".
O chefe do Hezbollah, Hassan Nasrallah, não ficou ferido após as explosões. A informação foi revelada por uma fonte importante do Hezbollah à Reuters.
Líbano anunciou que está preparando uma queixa no Conselho de Segurança da ONU. O Ministério das Relações Exteriores do país afirmou que começou a preparar uma queixa para apresentar ao Conselho de Segurança das Nações Unidas depois que milhares de pessoas ficaram feridas em todo o país.
Os Estados Unidos afirmaram que não estão envolvidos nas explosões. A Casa Branca também destacou que não tinha conhecimento prévio de que o ataque, atribuído a Israel, ocorreria. "Posso dizer a vocês que os Estados Unidos não estiveram envolvidos nisso, que não tinham conhecimento prévio sobre este incidente e que, neste momento, estamos reunindo informações", declarou à imprensa o porta-voz do Departamento de Estado americano, Matthew Miller.
Por que o Hezbollah usa pagers?
Os pagers (ou bipes, como foram chamados no Brasil nos anos 1990), são aparelhos portáteis de comunicação via rádio de alerta sonoro ou de texto. Há muito considerados obsoletos, eles foram largamente substituídos pelos celulares, mas ainda são usados em alguns contextos.
Os modelos mais antigos consistem na receptação de alertas sonoros ou de vibração. Modelos posteriores também recebem curtas mensagens de textos enviadas por uma central e exibidas num pequeno display, enquanto outros também são capazes de responder as mensagens.
O temor da comunidade internacional é de que as detonações de dispositivos eletrônicos provoquem o aumento da já elevada tensão no Oriente Médio. Negociações para um cessar-fogo entre Israel e Hamas seguem travadas.
*Com AFP e Reuters