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Dono de bordel é a sensação de condado após ser eleito para cargo público nos EUA

 Lance Gilman, 68, proprietário do Rancho Mustang, primeiro bordel a ser legalizado nos EUA,  vai ocupar uma cadeira no Conselho de Comissários do condado  de Storey - Max Whittaker/The New York Times
Lance Gilman, 68, proprietário do Rancho Mustang, primeiro bordel a ser legalizado nos EUA, vai ocupar uma cadeira no Conselho de Comissários do condado de Storey Imagem: Max Whittaker/The New York Times

Malia Wollan

Em Sparks, Nevada (EUA)

06/12/2012 06h00

Deixando de lado a comercialização do sexo, os bordéis de Sparks costumam ser empresas modestas: edifícios  mal construídos e de má qualidade, erguidos fora da linha de visão dos passantes, em áreas rurais dos arredores da cidade ou camuflados por um matagal de choupos-do-canadá, espécie de árvore local.
 
Mas a discrição tornou-se o centro das atenções no mês passado, com a eleição de Lance Gilman, proprietário do primeiro bordel legalizado dos Estados Unidos, para uma cadeira no Conselho de Comissários do condado  de Storey.
 
“Os habitantes do estado de Nevada não se incomodam com bordéis”, disse Gilman, 68, proprietário do Rancho Mustang. “O restante dos norte-americanos é que ficam bastante animados (com os bordéis)”.
 

O condado de Storey se estende por 262 milhas quadradas de deserto e arbustos de salva situadas a leste de Reno, e Gilman, incorporador industrial originário de San Diego, é dono de quase 65% do condado.
 
Nessas terras, Gilman e seu parceiro de negócios estão criando o que, segundo eles têm propagandeado, será o maior parque industrial do mundo.
 
Gilman espera que, quando o projeto estiver concluído, cerca de 150 mil pessoas trabalharão no parque industrial, o que corresponde a quase 40 vezes a população atual do município. Desde já, 1.800 caminhões chegam por dia aos centros de distribuição do Wal-Mart e do PetSmart de Sparks.
 
E, às margens de todo esse comércio prosaico, a apenas 17 km de Reno, o bordel de Gilman estimula o tráfico de prazeres noturnos.
 
Quer o produto seja sexo,  manufaturados  ou fazendas de servidores da internet, Gilman é o tipo de cara que acredita no mercado livre. “Estou focado em fazer com que esse lugar se mantenha como um local de estímulo para os negócios, e não em criar regulamentações que matariam nosso pequeno condado”, disse ele.
 
Gilman faz parte de uma nova geração de donos de bordel de Nevada: os recém-chegados que fizeram suas fortunas em outros setores da economia e que não têm medo de publicidade. Acredita-se que ele seja o primeiro dono do bordel a ser eleito para um cargo público no Estado – e sua trajetória deixou nervosas algumas das pessoas que atuam na indústria do sexo legal.
 
George Flint, lobista da Associação dos Donos de Bordéis de Nevada, disse: “Eu sou da velha guarda, eu acredito que a melhor maneira de sobreviver neste negócio é ser discreto. Esses novos caras chegam e pressupõem que a legalidade vem acompanhada da aceitação. Mas eles não compreendem a fragilidade do setor”.
 
Ainda assim, os bordéis licenciados, como o Rancho Mustang, desfrutam de amplo apoio na região rural de Nevada. Mais da metade dos entrevistados em uma pesquisa realizada em todo o estado em 2011 disseram acreditar que a prostituição deveria ser legalizada.
 

“Você não pode culpar uma pessoa porque ela exerce uma profissão que existe desde antes de Jesus ter caminhado sobre a Terra com suas sandálias”, disse Corrie Northan, 46, barmen do bar Bucket of Blood Saloon, localizado em Virginia City, sede do conselho. “Este Estado foi formado a partir dos jogos de azar, das bebidas alcóolicas e dos bordéis, e não há vergonha nenhuma nisso”.
 
Durante sua campanha, Gilman bateu na porta de aproximadamente 1.500 residentes do condado – e ele diz que só duas pessoas mencionaram o seu bordel, e apenas para elogiá-lo.
 
A prostituição tem sido um dos pilares do condado de Storey desde a descoberta do minério de prata, em 1859. À época, homens chegavam de todas as partes do país e, em 1860, as mulheres representavam apenas 5% da população da cidade.
 
“Os bordéis dessas cidades vem funcionando continuamente desde que elas foram fundadas”, disse Barbara Brents, professora de sociologia da Universidade de Nevada em Las Vegas, que estuda a indústria do sexo no estado. “Os bordéis são legais atualmente porque os condados legalizaram o que já existia aqui”.
 
De acordo com a lei estadual, os condados com menos de 400 mil habitantes podem conceder alvarás de funcionamento para bordéis, com exceção apenas do condado de Clark, ao qual pertence Las Vegas, e do condado de Washoe, que inclui Reno. Dos 17 condados do estado, mais ou menos 10 abrigam bordéis legalizados.
 
Cerca de 23 bordéis legalizados operam atualmente em Nevada, embora o número varie sazonalmente. Antes de 2008, esses bordéis recebiam cerca de 500 mil clientes por ano, que geravam um faturamento anual de US$ 250 milhões. Quando a recessão começou, essa receita caiu pela metade, de acordo com o grupo de donos de bordéis.
 
O Rancho Mustang está entre os maiores bordéis legalizados do estado. Durante os anos pré-recessão, o estabelecimento empregava aproximadamente 80 prostitutas e recebia cerca de 250 clientes por dia.
 
O local onde o bordel funciona atualmente é uma espécie de segunda chance para o Rancho Mustang. Em 1971, o rancho transformou-se no primeiro bordel legalizado dos Estados Unidos, nas mãos do então proprietário Joe Conforte, um siciliano extravagante que fugiu para o Brasil em 1990, após a Receita Federal tê-lo acusado de sonegação fiscal.
 
Por fim, o governo federal confiscou o terreno onde o bordel foi construído e, em 2003, leiloou o nome e os prédios existentes pelo site eBay, onde Gilman comprou ambos por US$ 145.100 – e, utilizando um helicóptero, transferiu tudo para um novo local.
 
As acomodações ampliadas reabriram sob a gestão de uma cafetina, Susan Austin, 62, que conheceu Gilman quando ele a escolheu em uma fila de “garotas” que trabalham em outro bordel.
 
“O condado de Storey tem sido bom para nós e nós temos sido gentis com o condado de Storey”, disse Austin. “Se você se prostituir da maneira correta, de um modo limpo, regulamentado e controlado, a atividade funciona como um benefício para a comunidade”.
 
Em uma tarde recente, 34 prostitutas se encontravam no bordel. Um grupo de mulheres seminuas recebia clientes no bar, enquanto outras vagavam em torno dos quartos dos fundos de pijama e chinelos adornados com pelúcia.
 
“Eu não tenho nenhum problema com a prostituição”, disse Marshall McBride, 55, que se juntou a Gilman como membro recém-eleito do conselho do condado, que conta com três cadeiras. “No passado, os bordéis eram um dos motores da economia deste condado e, agora, Lance Gilman é o motor da economia”.