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Procura-se papa. Deve possuir encanto magnético. E espírito indomável

Laurie Goodstein e Daniel J. Wakin

De Roma

10/03/2013 06h00

Nenhum candidato a papa tem tudo. Mas os cardeais que escolherão o próximo sumo pontífice da Igreja Católica Romana parecem estar à procura de alguém que combine o carisma de João Paulo 2º com o "espírito indomável" do que um analista do Vaticano chamou, apenas ligeiramente brincando, do "papa Rambo 1º".


Apesar de ser cedo demais para se falar em favoritos, dicas das características que estão sendo buscadas para o futuro sumo pontífice podem ser encontradas nas palavras dos cardeais, que passaram a última semana em reuniões no Vaticano. Antes de quarta-feira, quando pararam de dar entrevistas, os cardeais citavam com frequência os atributos que a Igreja precisa no momento: um comunicador envolvente, que conquiste as almas tanto com suas palavras quanto com sua postura santa, e um xerife destemido que possa lidar com a desordem e escândalos no Vaticano.

O foco deles na comunicação e boa governança é, de muitas formas, um reconhecimento das deficiências do papa Bento 16, que partiu na semana passada de helicóptero para uma aposentadoria inesperada, após oito turbulentos anos de papado. Mas também é um sinal da nostalgia pelo antecessor de Bento 16, João Paulo 2º, uma presença magnética que comandava as atenções em suas viagens ao redor do mundo e mesmo durante sua morte.

No papado de Bento 16, a Igreja perdeu influência na Europa, nos Estados Unidos e mesmo na América Latina. A burocracia central em Roma, a Cúria, caiu mais profundamente em disfunção e até mesmo em corrupção. Cardeais de vários países comentaram nesta semana que estavam seriamente perturbados com os relatos na imprensa italiana, sobre um dossiê secreto que foi entregue a Bento 16 e supostamente conteria evidências explosivas de chantagem sexual e financeira. O dossiê confidencial supostamente seria mostrado ao próximo papa.

Poucos candidatos contam com o pacote inteiro de talentos, e a imprensa italiana até mesmo indicou a ideia de que os cardeais estão considerando "chapas", que casariam um papa pastoral com um secretário de Estado firme, que agiria como administrador e, se necessário, um executor.

O próximo sumo pontífice pode não precisar executar uma repressão às disputas internas e delitos no Vaticano, mas ele deve ter pelo menos a inteligência executiva para nomear um representante destemido o bastante para confrontar a burocracia entrincheirada do Vaticano.

Pela ordem

"A primeira coisa que ele terá que fazer é botar ordem na administração central da Cúria", disse o cardeal Edward Egan, o arcebispo aposentado de Nova York. "Ele precisa estar disposto a aceitar críticas."

Ao mesmo tempo, "ele tem que ser um homem que entenda a fé e possa anunciá-la de forma atraente e descomplicada", disse o cardeal Egan, que votou no conclave que elegeu Bento 16, mas que agora passou do limite de idade para votação, de 80 anos.

Na quinta-feira (7), todos os 115 cardeais com direito a voto e que eram esperados tinham chegado a Roma. Mas quando exatamente se trancariam na Capela Sistina para escolher o próximo papa permanecia incerto. Os cardeais se reuniram a portas fechadas no Salão Paulo 6º do Vaticano todos os dias desta semana, ouvindo uns aos outros falarem sobre os desafios enfrentados pela Igreja.

Para os nomes que têm circulado como "papáveis", os discursos servem como parte do teste.

A demora para marcar o conclave indica que os cardeais ainda estão avaliando as personalidades uns dos outros, históricos e ideias, disse o padre Federico Lombardi, o porta-voz do Vaticano, em uma coletiva de imprensa na quinta-feira.

Qualquer candidato sério a papa precisa ser piedoso, teologicamente sólido e fluente em italiano, a língua do Vaticano e de Roma, que é, afinal, a própria diocese do papa.

Vários candidatos também disseram que o próximo papa deve ter experiência como bispo de uma diocese. Essa descrição excluiria alguns cardeais que serviram grande parte de seu tempo na Cúria e aqueles como pouca experiência pastoral, como o cardeal Gianfranco Ravasi, o erudito italiano a quem Bento 16 deu recentemente a honra de pregar em um recente retiro quaresmal do Vaticano.

O cardeal Donald Wuerl, o arcebispo de Washington, disse em uma entrevista: "Ser o pastor de uma igreja local, eu acho, seria um fator muito importante para que uma pessoa esteja engajada na ideia de renovar a espiritualidade da Igreja".

Vários cardeais também enfatizaram que um papa também deve estender a mão para as outras religiões, melhorar as relações com os bispos ao redor do mundo e apresentar com vigor o ensinamento católico.

Pré-requisito

Muitos dos mencionados como papáveis já teriam provado seu talento como administradores, já em suas arquidioceses, na Cúria romana ou em ambas. Eles incluem os cardeais Angelo Scola, arcebispo de Milão; Odilo Pedro Scherer, arcebispo de São Paulo, Brasil; Peter Erdo, arcebispo de Esztergom-Budapeste e primaz da Hungria; Leonardo Sandri, um argentino com longa experiência na Cúria romana; e Marc Ouellet, um canadense que chefia a poderosa Congregação dos Bispos do Vaticano.

Mas vários desses prelados são conhecidos como carentes de carisma ou presença. Os cardeais Erdo e Ouellet ficam, segundo associados e ex-alunos, mais à vontade lento um texto preparado do que falando espontaneamente diante de multidões ou dando entrevistas.

Enquanto isso, outros cardeais ganharam reputação por sua capacidade comprovada de se comunicarem em massa, notadamente o cardeal Luis Antonio G. Tagle, das Filipinas. Mas sua idade, 55 anos, atua contra ele. Ele é o segundo cardeal mais jovem, atrás de Baselios Thottunkal, da Índia.

A idade é um critério importante, especialmente após a renúncia de Bento 16, que tem 85 anos. Muitos cardeais concordam que o futuro papa seria idealmente um sexagenário, e o cardeal Wilfrid F. Napier, da África do Sul, reduz essa idade para 60 e poucos anos. Ele sugeriu em uma entrevista que era hora de um papado mais longo, para promover os esforços para fortalecimento da Igreja.

"É preciso mais tempo para a construção dessas fundações", disse o cardeal Napier. "Eu acho que precisamos de um papado mais longo para gerar a energia e manter o momento." Ele acrescentou: "A partir das conversas informais, outros cardeais também estão olhando nessa direção."

No passado, seria impensável ter um sério candidato a papa proveniente dos Estados Unidos, uma superpotência política e econômica, mas observadores do Vaticano dizem que, pela primeira vez, há entusiasmo em relação a dois americanos que têm carisma e força administrativa: o cardeal de Nova York, Timothy Dolan, uma presença loquaz, e o cardeal de Boston, Sean Patrick O'Malley, um frade franciscano.

Apesar de permanecer improvável que algum deles se torne papa, em grande parte pelos Estados Unidos ainda serem vistos como uma superpotência global cujos interesses nem sempre se encaixam com os da Igreja Católica, este conclave é o primeiro a quebrar o tabu.

"Pela primeira vez americanos estão sendo considerados –isso é uma novidade", disse Marco Politi, um observador veterano do Vaticano na Itália. (Com informações de Rachel Donadio, Michael Paulson e Jim Yardley)