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Indiciamento de menino de 8 anos por homicídio de bebê abre discussão nos EUA

Katerra Lewis, 26, mãe da bebê Kelci - Birmingham police department/Reprodução
Katerra Lewis, 26, mãe da bebê Kelci Imagem: Birmingham police department/Reprodução

Alan Blinder

Em Atlanta (EUA)

13/11/2015 06h00

Com sua linguagem sem floreios e tom ordinário, o anúncio na terça-feira (10) pelas autoridades em Birmingham, Alabama, parecia inicialmente como qualquer outra declaração por agentes da lei sobre uma investigação de homicídio. 

Mas o quarto parágrafo do Comunicado de Imprensa Nº 102 contava com uma revelação espantosa: o suspeito acusado pelo assassinato de uma menina de 1 ano era um menino de 8 anos. O menino, disse a polícia, "atacou brutalmente" a criança menor porque ela não parava de chorar enquanto a mãe dela estava em uma boate. 

A acusação contra o menino não identificado, uma das crianças mais jovens acusadas de homicídio nos Estados Unidos, levantou imediatamente questões sobre a Justiça da Infância e Juventude e como as autoridades deveriam abordar esses casos raros, nos quais crianças são acusadas de matar crianças ainda mais novas. 

"Sempre que algo acontece envolvendo um assassinato cometido por criança, particularmente desta idade, será uma surpresa", disse John C. Neiman Jr., um ex-procurador-geral do Alabama. "Nessa área da lei, simplesmente não existem respostas fáceis." 

Grande parte da investigação da morte em 11 de outubro da menina, Kelci Lewis, permanece sob sigilo, mas a polícia acusou o menino de um ataque que disseram ter deixado a menina com "trauma severo na cabeça, assim como extensos danos nos órgãos internos". As crianças não tinham parentesco e as autoridades disseram que o ataque ocorreu depois que seis crianças, nenhuma delas com mais de 8 anos, foram deixadas sem supervisão em um lar no nordeste de Birmingham. 

A mãe da menina, Katerra M. Lewis, foi indiciada por homicídio. O advogado de Lewis, Emory Anthony Jr., disse na quarta-feira que ela estava "triste por ter perdido uma filha e por a terem indiciado pela morte de sua filha". Ele disse que Lewis se defenderá da acusação de homicídio. 

"Ela diz que não deixou sua filha aos cuidados de um menino de 8 anos", disse Anthony. "Certamente estamos negando isso." Mas enquanto ele inicia a defesa pública, foi o indiciamento do menino que chamou mais atenção e, em alguns setores, ceticismo. 

"Quando você indicia um menino de 8 anos, cuja cabeça está basicamente voltada a massinha de modelar, pelo crime mais sério, isso me parece um excesso", disse Gary L. Blume, um advogado do Alabama e membro do conselho consultivo do Centro de Proteção ao Menor do Sul. "A Suprema Corte dos Estados Unidos reconhece que as crianças são diferentes, mas é difícil para os agentes da lei entenderem que as crianças são diferentes, e os promotores fazem parte da máquina da lei que temos neste Estado." 

O caso não será levado a júri. Em vez disso, ele será ouvido de modo confidencial na Vara da Família do Condado de Jefferson. Advogados que não estão envolvidos disseram que o processo pode levar ao menino ficar sob supervisão e, potencialmente, sob detenção até completar 21 anos. (No Alabama, um caso não pode ser transferido à Justiça Criminal adulta a menos que o réu tenha pelo menos 14 anos quando ocorreu o crime.) 

O gabinete da promotoria se recusou a comentar o caso contra o menino, que está sob custódia do Departamento de Recursos Humanos do Alabama. Mas em meio às crescentes críticas às táticas do governo, uma ex-promotora da Vara da Infância e da Juventude do condado vizinho de Shelby disse que também indiciaria o menino. 

"Ou eles dizem 'não vamos indiciar' ou 'vamos indiciar', e assim que dissessem que não vão, haveria um sério problema, porque então a criança não receberia qualquer serviço pelo Estado", disse a ex-promotora, Lara M. Alvis, que agora é uma advogada de defesa e uma candidata a juíza. 

"No caso de uma criança como essa, se você não levar a criança ao tribunal ou de alguma forma ao sistema, você a deixará solta por aí. É semelhante a um policial deixar que um motorista bêbado continue dirigindo, em vez de levado à cadeia." 

Questionamentos à Justiça da Infância e Juventude são terreno familiar no Alabama. Em um caso de 2012 no qual o Estado era uma das partes, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu que menores condenados por homicídio não podiam receber penas de prisão perpétua sem a possibilidade de liberdade condicional. 

Mas Neiman, que argumentou no caso, Miller contra Alabama, na condição de procurador-geral do Estado, disse que a abordagem linha-dura do condado de Jefferson não necessariamente reflete a postura do Estado. 

"Essa é uma decisão tomada por uma autoridade local, não pelo secretário de Justiça do Alabama ou pelo governador do Alabama", ele disse. "É difícil dizer que isso torna o Estado do Alabama diferente." 

Promotores de outros Estados já indiciaram menores ainda não adolescentes por homicídio. No mês passado no Tennessee, por exemplo, as autoridades indiciaram por homicídio em primeiro grau um menino de 11 anos, que foi acusado de matar um vizinho de 8 anos. 

No Alabama na quarta-feira, alguns sugeriram que nuances no caso do menino e seu status no sistema legal, além das exigências de confidencialidade, dificultam o debate público. Mas também disseram que a questão é um teste significativo para o Alabama, mesmo que seu resultado seja decidido em segredo. 

"Ainda não está claro se é um desastre substantivo em termos de maus-tratos a essa criança ou se é um desastre de relações públicas", disse David M. Smolin, diretor do Centro para a Infância, Lei e Ética da Universidade Samford, em Birmingham. "Isso realmente depende dos detalhes da situação da criança."