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Por que monges na Tailândia praticam a meditação com cadáveres?

Pornchai Kittiwongsakul/ AFP
Imagem: Pornchai Kittiwongsakul/ AFP

Bryant Rousseau

05/09/2016 06h00

Um corpo em decomposição talvez não pareça um acessório ideal para meditação, mas em alguns das dezenas de milhares de templos budistas da Tailândia é comum encontrar monges em reflexão, sentados diante de um cadáver em decomposição.

A prática da meditação do cadáver, que hoje quase se limita à Tailândia, é um antigo conceito no budismo, aprovado pelo próprio Buda. Há murais e manuscritos de séculos atrás que mostram cenas de meditação junto a diferentes tipos de cadáveres, alguns infestados de vermes, outros cortados em dois ou sendo bicados por corvos.

A visão desagradável e o forte cheiro da carne em decomposição no calor tropical podem dar aulas sobre importantes preceitos budistas, como não dar muita importância ao próprio corpo e a impermanência de tudo Justin McDaniel, professor de estudos religiosos na Universidade da Pensilvânia

O ritual é considerado uma maneira poderosa de aprender o altruísmo, disse McDaniel, "e quanto mais altruísta você for mais próximo estará do nirvana".

O cadáver é muitas vezes de uma criança ou jovem adulto que morreu de forma inesperada. As famílias doam o corpo ao templo, esperando que algo bom possa vir da tragédia.

Os monges veem os jovens mortos como "representantes do melhor da humanidade", disse McDaniel. "Eles são inocentes --não tão egoístas, avarentos e ambiciosos. Se algo tão belo pode se decompor, por que você é tão orgulhoso e vaidoso? Você é até mais feio."

Os abades que dirigem os templos da Tailândia, os "wats", têm grande liberdade para adotar práticas de meditação inovadoras, e algumas delas podem se limitar a um único santuário.

Em um templo na província de Nong Bua Lamphu, um monge medita dentro do que parece ser óleo quente. Em outro, Wat Tham Mangkon Thong, monjas meditam flutuando em um lago. Em Wat Pai Civilsai, a meditação é praticada dentro de um caixote com cobras. Os monges também meditam em cavernas e caixões, onde a escuridão absoluta intensifica a concentração.

Os chamados monges da floresta, que observam rígidas práticas ascéticas conhecidas como "dhutanga", meditariam enquanto caminham durante semanas sem se deitar, nem para dormir.

Não são só os monges que meditam de maneiras que parecem exageradas.

Julia Cassaniti, uma professora de antropologia na Universidade Estadual de Washington, estava andando pela floresta em um mosteiro tailandês quando ouviu gritos vindos de uma cabana. Os leigos lá dentro usavam a meditação para interagir com suas vidas passadas, uma luta que os adeptos descrevem como dolorosa.

Uma técnica de meditação que é praticada por monges e leigos é um período de dez dias de silêncio absoluto. Alguns templos oferecem retiros de meditação para turistas e encorajam os visitantes a ficar acordados nos últimos três dias.

"A privação do sono é considerada válida para alcançar as primeiras etapas da iluminação", disse Brooke Schedneck, uma palestrante sobre estudos budistas no Instituto de Assuntos do Sudeste Asiáticoem Chiang Mai, na Tailândia.

O objetivo da meditação para todos os budistas é ter percepções de verdades espirituais. Essas práticas mais radicais, disse Cassaniti, podem "reforçar o acesso, para que você chegue lá mais depressa ou com mais intensidade".

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Efe