Culpar motoristas por mortes no trânsito é cômodo e cruel
Entrou em vigor a lei 12.971/2014, na qual o Congresso Nacional e o governo federal tornaram mais draconianas as penalidades aplicadas para infrações de ultrapassagem, trânsito pelo acostamento, participação em rachas, e dirigir sob efeito de álcool ou drogas.
Assim, por conta de mais uma mudança no Código de Transito Brasileiro, a sociedade é induzida a pensar que os motoristas são os monstros responsáveis pelo morticínio nas cidades e rodovias do país, e a nova lei vem para saciar a sede de vingança.
Enquanto isso os verdadeiros culpados – as entidades responsáveis por garantir a segurança do transito, dormem impunes.
Promulgado em 2007, o código permitiu o avanço da segurança do transito nas cidades, pois municipalizou o trânsito. Nas rodovias, as mudanças maiores foram decorrentes da privatizações e concessões, que melhoraram significativamente a segurança. As rodovias e as cidades, bem administradas, onde se enfrentou com determinação e competência o problema da segurança do transito a coisa melhorou, sem necessidade das oportunistas e midiáticas alterações da legislação.
Para uma mesma legislação de trânsito, cambiante ou não, uma coisa nunca muda: existem estradas e cidades mortais, onde, por omissão das autoridades, a impunidade e a morte campeiam. Não é a lei que é fraca. Os responsáveis que são omissos.
Temos cidades seguras, com índice de mortos por 10 mil veículos por ano inferior a 2, índice que indica trânsito seguro (mas que sempre pode melhorar), lado a lado com cidades onde este índice é vinte vezes maior.
A pesquisa da Confederação Nacional do Transporte (CNT) de Rodovias 2013 apontou piora no estado das rodovias brasileiras, com 63,8% da extensão avaliada apresentando problemas fundamentais de pavimento, sinalização e geometria da via.
Quanto à segurança de trânsito nas cidades, infelizmente o site do Denatran deixou de dar publicidade ao Anuário Estatístico de Acidentes, no qual o ranking do índice de mortos por de 10 mil veículos por ano explicitava o descalabro de cidades mal cuidadas. Isso deveria ser o ponto de partida para ações dos Ministérios Públicos dos vários Estados da nação, cobrando dos responsáveis respostas e ações ante a mortandade sistêmica no trânsito.
É muito cômodo e cruel culpar sistemicamente os motoristas pelas mortes no trânsito, acobertando a retumbante falha das autoridades em garantir o trânsito seguro. É o que se está fazendo cada vez mais, criminalizando a vítima, tratando o condutor como incapaz e cruel. Essa classificação e esse tratamento devem ser dispensados às autoridades omissas.
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