OPINIÃO
Coincidência nas eleições: duro golpe no federalismo brasileiro
Especial para o UOL
11/03/2024 04h00
A coincidência das eleições nacionais, estaduais e municipais voltou ao debate, depois que o senador Marcelo Castro, relator do projeto de lei do Novo Código Eleitoral no Senado, afirmou que vai protocolar uma PEC neste sentido.
Essa proposta de coincidência das eleições, caso aprovada, representará mais um duro golpe em nosso federalismo, dificultando ainda mais a vida dos já fragilizados municípios brasileiros.
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O Brasil, como se sabe, está organizado, política e administrativamente, como uma República Federativa. A Federação brasileira contempla, ao lado dos governos da União e dos estados-membros, os municípios como um terceiro nível político-administrativo.
A Constituição Federal de 1988 atribuiu aos municípios grande relevância na organização do Estado brasileiro, conferindo-lhes responsabilidades e prerrogativas nunca antes vistas ao longo da história constitucional brasileira. O seu artigo 18 garantiu aos municípios competências próprias e autonomia, assumindo a governança de sua administração e protagonismo na implementação de políticas públicas.
Contudo, na prática, o que se vê é uma autonomia municipal muito limitada, em razão da precariedade das finanças públicas da maioria dos entes municipais, fazendo com que exista pouco espaço decisório nos poderes locais.
Dentro desse cenário, unificar as eleições nacionais, estaduais e municipais deverá trazer ainda mais prejuízos aos municípios.
O sistema atual de eleições permite que se tenha a oportunidade de discutir com mais profundidade as pautas e os interesses locais. Garante, de dois em dois anos, o protagonismo das pautas municipais na agenda nacional.
Os municípios são, na maioria das situações do cotidiano, os primeiros entes procurados pelos cidadãos para satisfação de suas necessidades. A existência das eleições municipais coloca foco na vida dessas pessoas, nos problemas da cidade.
Além disso, as eleições municipais têm importante papel de servir como limitador aos governantes nacionais e estaduais, demonstrando, em algumas situações, a insatisfação do eleitor com o rumo das pautas nacionais e regionais.
Nossa democracia ainda é jovem, a cultura de participação política ainda é pequena. As eleições são um ciclo vital da nossa democracia. Restringi-las não é bom para ninguém, sobretudo aos municípios, já tão apequenados em nosso federalismo.
José Paes Neto, doutorando e mestre em direito pela Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), é advogado, procurador legislativo, professor de direito e membro da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político) e da Comissão de Direito Constitucional da OAB-RJ.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL