RS: Manuela D'Ávila desistiu de eleição porque não teria tempo de amamentar
Flávio Ilha
Colaboração para o UOL, em Porto Alegre
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Vinicius Reis/Divulgação
A deputada estadual gaúcha Manuela D'Ávila (PCdoB)
A deputada estadual gaúcha Manuela D'Ávila (PCdoB), 35, eleita em 2014 com a maior votação entre todos os candidatos à Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, surpreendeu e decidiu não disputar a Prefeitura de Porto Alegre (RS) neste ano. Ela fez o anúncio em fevereiro. O motivo é sua filha, Laura, 1.
Ela diz que é difícil conciliar o trabalho político e a maternidade. "Não quero virar um fato político toda vez que tiro meu peito para fora para amamentar."
Em entrevista ao UOL, ela diz que ficou fora da disputa municipal, mesmo sendo famosa nacionalmente e com bom desempenho eleitoral, porque não teria tanto tempo para amamentar e cuidar da filha.
"Sendo deputada, eu sou dona da minha agenda. Candidata, não. E, na eventualidade de ser eleita, menos ainda. Hoje, por exemplo, minha filha está febril. Vim para a Assembleia às 8h, participei de reunião, às 10h fui correndo em casa, amamentei e voltei às 11h30 para outra reunião. Saí correndo, fui em casa, almocei com a minha filha, amamentei de novo e voltei para a Assembleia às 14h. Como candidata ou como prefeita, eu não teria controle sobre essa agenda."
Na entrevista, ela fala também sobre assédio moral no Parlamento e agressões e processos que move: contra dois jornalistas, uma médica e uma medida protetiva contra um jovem de Santa Maria (RS) motivada pela Lei Maria da Penha.
Veja abaixo trechos da entrevista concedida ao UOL pela candidata:
UOL - Por que a senhora decidiu não concorrer à Prefeitura de Porto Alegre?
Manuela D'Ávila - Quando decidi voltar a viver no Rio Grande do Sul [em 2013], muitas pessoas diziam --inclusive alguns jornalistas-- que era um plano maquiavélico para me candidatar à prefeitura em 2016. Naquele ano, eu tomei a decisão [de voltar] porque senti que tinha esgotado um ciclo em Brasília [foi deputada federal por dois mandatos, entre 2007 e 2014], como se minhas vidas tivessem acabado e eu precisasse mudar de fase no jogo para buscar mais vidas. E essas vidas, para mim, estavam no movimento social.
Minha escolha política acabou se mostrando muito certa porque, entre 2013 e 2016, tivemos a ebulição de um novo movimento social que tem me ensinado muito. Mas entre esses planos também estava engravidar, porque eu nunca imaginei criar um filho na ponte aérea Porto Alegre-Brasília. Sobretudo nesses primeiros mil dias [considerando os nove meses da gestação], que é a fase mais importante da maternidade. Claro que eu não imaginava engravidar tão rápido. A decisão [de não concorrer à prefeitura] ocorreu porque eu engravidei.
Então, era uma coisa óbvia. Foi uma opção minha ser gestante. E tem uma série de implicações em relação àquilo em que eu acredito. Respeito todas as pessoas que têm visões diferentes, mas eu julgo que tenho um papel muito importante, sobretudo nesses primeiros mil dias. É o que defendo, é o que eu milito. Seria muito incoerente eu fazer o contrário. Então era óbvio que, se eu engravidasse antes, não seria candidata à prefeitura.
Maternidade e política então são incompatíveis?
Não, mas muitas pessoas disseram isso: é uma saída política. Mas não tem nada disso. É que, sendo deputada, eu sou dona da minha agenda. Candidata, não. E, na eventualidade de ser eleita, menos ainda. Hoje, por exemplo, minha filha está febril. Eu saí de casa às 7h, fiz campanha [a deputada apoia o petista Raul Pont], vim para a Assembleia às 8h, participei da reunião [de líderes], às 10h fui correndo em casa, amamentei e voltei às 11h30 para outra reunião. Saí correndo, fui em casa, almocei com a minha filha, amamentei de novo e voltei para a Assembleia às 14h.
Como candidata ou como prefeita, eu não teria controle sobre essa agenda. Se Porto Alegre estivesse embaixo d'água [estava chovendo no dia da entrevista], eu não poderia ir em casa, não teria esse direito. Direito eu até teria, é claro, mas qual seria a ordem hierárquica, nesse caso? Tirar os filhos de 500 pessoas debaixo d'água ou cuidar só da minha família? A relação é diferente, percebe? Por isso todos os dias sou feliz com a escolha que fiz.
Pode descrever alguns episódios que a afetaram em Brasília?
As pessoas só agora começam a ter ideia do que é ser mulher em Brasília [referindo-se ao processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff]. Isso se tornou muito mais nítido. O que as pessoas estão vendo agora eu vivi durante oito anos todos os dias. Aquilo que vocês viram no dia da votação do impeachment foi a minha rotina dos 25 aos 33 anos. Não é mel para se lamber, não, é uma coisa muito forte. Cheguei à Câmara aos 25 anos sem ter nenhum homem por trás de mim, no sentido de não ser casada com nenhum político, não ser filha de nenhum político, não ter nenhum sobrenome que me protegesse. Era a única parlamentar abaixo dos 30 anos que não tinha um sobrenome importante. Éramos nove deputados nessa faixa; oito tinham sobrenome.
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