Lula cobra avaliação de sigilos à CGU para evitar tom de rixa política
Lula buscou um caminho para evitar um tom de rixa política e garantir segurança jurídica ao Planalto para revogar os sigilos determinados por Bolsonaro:
- Assinou um decreto em que manda a CGU (Controladoria-Geral da União) reavaliar os sigilos de Bolsonaro em até 30 dias; se não forem justificados, a expectativa é que sejam derrubados.
Durante a campanha, o petista prometeu um "revogaço" de diversos sigilos impostos pelo antecessor, como os gastos do cartão corporativo e o processo disciplinar contra o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello. Os casos ganharam popularidade ao serem referidos como "sigilos de 100 anos".
O UOL apurou que há dois motivos principais para a opção pela reavaliação em vez do "sigilaço":
- Segurança e eficiência jurídica: um decreto amplo para derrubar os sigilos poderia atingir documentos efetivamente sigilosos, que comprometeriam a administração pública;
- Evitar críticas políticas: garantir um processo visto como técnico, não como revanchismo.
O presidente foi aconselhado por advogados e interlocutores do direito —incluindo o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, ex-juiz. Lula ouviu que, se os casos não fossem analisados um por um, poderia haver uma brecha para outros sigilos vigentes ou futuros serem questionados juridicamente.
A ideia de uma reavaliação era esperada e foi levada por especialistas a integrantes da transição, segundo Fernanda Campagnucci, diretora-executiva da Open Knowledge Brasil. O que chama a atenção foi o ato ter sido assinado diretamente por Lula. "O próprio controlador-geral teria autoridade para fazer essa avaliação, mas acho que vindo do presidente, é mais forte e contundente e passa uma mensagem de que é uma reorientação da prática", afirmou.
Ao incluir a CGU, a avaliação é dada por órgão independente e técnico.
Além disso, Lula quis evitar o tom de que estaria fazendo os atos por birra. Ao transformar o trabalho em um rito institucional, o petista quer evitar a visão de que estaria praticando um revanchismo político-pessoal.
A medida é um primeiro passo positivo, segundo especialistas em transparência. A avaliação do grupo consultado pelo UOL é que a reavaliação pode beneficiar na criação de precedentes, ao demonstrar de forma mais clara quais casos podem ou não serem postos sob sigilo.
Ao avaliar caso a caso nós conseguimos impedir que abusos sejam cometidos. Se for feito de maneira massiva, um decreto 'libera-tudo', a gente não tem essa possibilidade de ir criando esses precedentes"
Júlia Rocha, coordenadora do programa de Acesso à Informação e Transparência da ONG Artigo 19
No futuro, isso poderia beneficiar a consulta de informações do governo e evitar abusos da Lei de Acesso à Informação, estabelecendo limites de acesso a dados pessoais de integrantes do governo, por exemplo.
Os especialistas, porém, fazem ressalvas:
- É preciso haver um detalhamento claro de quais casos podem ou não ser mantidos em sigilo;
- Os resultados devem ser tornados públicos, ampliando a política de transparência ativa do governo, enfraquecida na gestão Bolsonaro;
- Casos em que o sigilo for mantido deverão ser explicados, deixando claras as razões legais para a recusa de acesso.
"O primeiro desafio é entender o tamanho do problema. Por isso seria bom a gente ver qual é exatamente o procedimento que a CGU vai adotar para essa reavaliação. Certamente um conjunto muito vasto de dados e documentos não vai dar para olhar um por um em 30 dias", diz Fabiano Angélico, pesquisador da Universidade de Lugano (Suiça) e doutorando da Escola de Administração Pública da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
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