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Privatização da Sabesp: promessa de Tarcísio, conta menor requer subsídio

Tarcísio de Freitas Imagem: Fernando Nascimento/Divulgação

Do UOL, em São Paulo

29/09/2023 04h00

Para cumprir sua promessa de baixar o valor da conta de água após privatizar a Sabesp, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), precisará subsidiar a tarifa usando parte do dinheiro que vai arrecadar com a venda da própria estatal. O conta de água, porém, voltará a subir com o fim do subsídio, preveem especialistas.

A sugestão de usar o dinheiro da venda para bancar a queda na tarifa foi recomendada pelo IFC (Internacional Finance Corporation), contratado pelo governo para produzir um relatório sugerindo o modelo a ser adotado na privatização da estatal.

O que diz o relatório

Governo pagou R$ 45 milhões para o IFC produzir o documento. O texto afirma que, sem ajuda estatal, a privatização não será suficiente para derrubar a conta de água e esgoto.

Por mais que a gestão privada seja eficiente com os investimentos e custos operacionais a serem realizados, isso somente não garantiria uma redução das atuais tarifas da Sabesp.
IFC, em relatório

A recomendação é que o governo use o dinheiro da privatização para baixar a conta.

A modelagem proposta para o projeto envolve a (...) redução tarifária a partir do uso de parte dos recursos gerados pela venda das ações do GESP [Governo do Estado de São Paulo], de modo que não haja impacto no valor da empresa e em seus acionistas.
IFC, em relatório

Estação de tratamento de água da Sabesp, em Santo Amaro, na zona sul de São Paulo Imagem: Gabriel Cabral/Folhapress

Governo aceitou a recomendação. "Ao vender essas ações, você pode usar esse recurso para duas coisas: mais investimentos e para redução da tarifa", disse ao UOL Natália Resende, secretária estadual de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística.

Essa estratégia rebate as críticas de que as tarifas vão aumentar com a privatização e a torna atraente ao consumidor. Mas pode-se colocar em dúvida a sustentabilidade desta redução a médio e longo prazo.
Hugo Sérgio de Oliveira, ex-presidente da Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de SP)

Esse tipo de subsídio é semelhante ao que a Prefeitura de São Paulo dá às empresas de ônibus (R$ 7,4 bilhões em 2023) para deixar a tarifa mais barata.

É uma inversão: a Sabesp transferiu ao governo R$ 450 milhões em 2022, mas agora será o governo que vai tirar dinheiro do estado para uma empresa privada baixar a conta
Amauri Pollachi, engenheiro e conselheiro do Ondas (Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento).

"Em saneamento, não conheço nenhum lugar no mundo que tenha feito isso", diz Pollachi. "Por quanto tempo vão manter a tarifa baixa? Assim que possível, a empresa vai pedir o equilíbrio econômico-financeiro e aumentar a conta, como ocorreu em outros estados."

O valor do subsídio e sua duração é um incógnita porque o governo ainda não definiu por quanto venderá suas ações. "A gente está falando em uma redução racional de tarifa", defende a secretária Natália Resende. "Estamos estudando para ter mais investimentos com redução tarifária responsável."

Tarifa em São Paulo está entre as mais baixas do Brasil. Enquanto a conta na capital é de R$ 71,70 para 10 mil litros de água e esgoto por mês, esse valor é de R$ 134 em Campo Grande (MS), R$ 104 em Curitiba, R$ 103 em Manaus e de R$ 97 a R$ 111 no Rio de Janeiro, dependendo da empresa que administra o saneamento básico na cidade após a privatização.

Trabalhadores na estação de tratamento de esgoto da Sabesp, em Barueri (SP) Imagem: Gabriela Cais Burdmann/UOL

Universalização em 6 anos

Tarcísio também vai usar o dinheiro da vendas das ações para antecipar a universalização dos serviços de água e esgoto de 2033 para 2029. A gestão espera usar R$ 10 bilhões do que receber para elevar os investimentos a R$ 66 bilhões.

Acontece que a universalização já vai acontecer até 2029 na capital paulista. O contrato do município —que responde por 47% do faturamento da Sabesp— ganhou um aditivo no final de 2016 que prevê 100% de cobertura de água e 100% de esgoto coletado e tratado até essa data.

Como a universalização "está praticamente atingida", diz Oliveira, "a antecipação se destina mais a incluir a população de baixa renda, dando a impressão de que se coloca em prática uma política de inclusão social".

"A gente está olhando a sociedade", rebate a secretária. "Estamos antecipando saúde. Vamos focar nos vulneráveis. Serão 10 milhões de pessoas beneficiadas até 2029, além da despoluição de mananciais e do rio Tietê. Desses 10 milhões, vamos antecipar a universalização para 9 milhões e incluir 1 milhão que não eram atendidos porque vivem em área rural e em comunidades tradicionais."

Sabesp lucrou R$ 3 bilhões

"Queimar parte do recurso da privatização dessa forma só faz sentido se o Estado estiver quebrado", diz o deputado Antonio Donato (PT), um dos principais opositores da privatização na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo). "Tarcísio aposta na crença de que privatizar é melhor e ponto", afirma.

A estatal, porém, é um sucesso. Segundo o próprio governo, a Sabesp é "top 5 das maiores companhias de saneamento do mundo em receita" e lucrou R$ 3,12 bilhões no ano passado, aumento de 35,4% sobre 2021.

A Sabesp tem uma política de distribuição de dividendos para acionistas que é o mínimo exigido pelas sociedades anônimas: 25% do lucro. O restante vira investimento. Mas isso não acontece em empresas privadas e deve acabar se a Sabesp for privatizada.
Amauri Pollachi, conselheiro do Onda

Na Europa, as altas tarifas vêm estimulando a reestatização dos serviços de saneamento. Entre 2000 e 2017, foram contabilizado 835 reversões, 693 a partir de 2009. Em Portugal, a reestatização no município de Setúbal, no ano passado, previa uma redução de 20% na conta de água.

A maioria das reestatizações foi na França, pioneiro nas privatizações do setor e sede das empresas Suez e Veolia, líderes globais na área.

Estação de tratamento da Sabesp Imagem: Divulgação/Sabesp

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