Dino volta à cadeira de juiz no STF e herda caso contra ministro de Lula
Quase 18 anos depois de trocar a toga pela política, o senador Flávio Dino, 55, retorna hoje à magistratura ao assumir a cadeira de ministro do Supremo Tribunal Federal. No cargo, deverá participar dos julgamentos que podem levar à prisão autoridades envolvidas no 8 de janeiro e cuidar da investigação que mira um ex-colega de Esplanada.
O que aconteceu
Flávio Dino assume a cadeira deixada pela ministra Rosa Weber, que se aposentou em setembro do ano passado, e se tornará o "novato" do tribunal. Ele herda um acervo de 340 processos, sendo o principal a investigação contra o ministro das Comunicações, Juscelino Filho.
Relacionadas
A investigação mira supostos desvios de emendas parlamentares à Prefeitura de Vitorino Freire, no Maranhão, comandada pela irmã de Juscelino, Luanna Rezende.
A apuração estava sob comando de Roberto Barroso, que no ano passado decretou o bloqueio de R$ 835 mil em bens de Juscelino. Ao assumir a presidência, Barroso repassou o caso para o acervo de sua antecessora, Rosa Weber, que deixou a investigação para Dino ao se aposentar.
A interlocutores, Dino desconversa sobre a possibilidade de se declarar suspeito para cuidar do processo. Se isso ocorrer, a investigação deverá ser redistribuída entre os nove ministros restantes, excluindo Dino e Barroso, que ocupa a presidência da Corte.
Aborto e CPI da Covid nas mãos de Dino
Outros processos que passarão para a relatoria do novo ministro é uma apuração aberta a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro por incitar o descumprimento de medidas sanitárias durante a pandemia de covid-19.
A PGR, sob gestão de Aras, pediu para arquivar o caso, mas Barroso, antigo relator, decidiu postergar a análise do arquivamento até a PF concluir o relatório da apuração.
Ainda sobre o ex-presidente, caberá a Dino decidir sobre o indulto natalino editado por Bolsonaro em 2022. O texto concede o benefício a pessoas com pena de prisão que não ultrapasse cinco anos de prisão.
Na área de costumes, o processo mais espinhoso que Dino herda é o que discute a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. Rosa Weber, a antiga relatora, já votou - isso impede Dino de discutir o mérito do caso, mas como novo relator, ele poderá analisar eventuais recursos contra a decisão do STF.
Dino ainda recebe outra ação sobre aborto, mas que vai na direção oposta. O processo movido pelo PL pede que o aborto provocado por terceiros seja equiparado ao crime de homicídio qualificado.
Os julgamentos que aguardam Dino
Além dos casos sob sua relatoria, Dino deverá votar em casos de impacto tanto nos cofres públicos do governo quanto na relação entre os Poderes neste ano.
Só na próxima semana, o STF deverá retomar o julgamento das sobras eleitorais - discussão que pode levar à anulação do mandato de ao menos sete deputados, a maioria da oposição.
Há pressão interna entre os ministros para que a discussão seja concluída ainda neste mês, o que pode servir de empecilho para Dino pedir vista e suspender o debate.
Dino deverá ainda analisar as próximas ações penais dos envolvidos na destruição dos prédios públicos durante o 8 de Janeiro. Já nesta sexta-feira (23), o STF abre o julgamento de mais 15 réus no plenário virtual e o novo ministro poderá dar o seu voto.
No futuro, também é esperado que Dino vote em discussões envolvendo a participação de autoridades, como o ex-presidente Jair Bolsonaro, uma vez que os inquéritos que miram a trama golpista tramitam no Supremo. A oposição já alega que o novo ministro deverá se declarar impedido, em razão de declarações feitas contra o ex-presidente quando estava no governo Lula.
Na área econômica, o principal caso acompanhado com lupa pelo Planalto é a revisão do FGTS. O governo Lula tem buscado adiar o julgamento para ganhar tempo para chegar a um acordo com centrais sindicais sobre mudanças na correção monetária do fundo.
Barroso tem tido desde o início do ano que o tema não pode ficar "pendurado" no Supremo. O ministro deu um prazo de um mês para o Planalto apresentar um plano, que não veio, e então pautou o caso para julgamento. Cristiano Zanin, indicado pelo petista, pediu vista e conseguiu ganhar tempo para o governo.
Pela ordem de votação, Flávio Dino deverá votar logo após Zanin e, se quiser, poderá interromper o julgamento mais uma vez e dar mais prazo ao Planalto para chegar a um acordo.
Sem festa, com missa: posse reúne 800 convidados
Ao contrário do estilo midiático adotado durante sua passagem no Ministério da Justiça, Flávio Dino optou por uma cerimônia de posse mais sóbria no Supremo.
Dino rejeitou convites de associações de magistrados para tradicionais coquetéis em homenagem aos novos integrantes da Corte. As festas costumam ser regadas com fartos banquetes e atrações musicais. A última, feita em homenagem à presidência de Barroso, custou R$ 500 o convite, por exemplo.
Católico, Dino decidiu substituir a festa por uma missa na Catedral Metropolitana de Brasília. Em 2021, algo semelhante ocorreu na posse de André Mendonça. O ministro celebrou a ida ao Supremo em um culto evangélico com a presença do então presidente Jair Bolsonaro.
No Supremo, a posse deverá reunir cerca de 800 autoridades, incluindo o presidente Lula (PT), o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e ministros do governo petista, além de políticos que acompanharam a trajetória do novo ministro da Corte.
Durante a posse, Dino será conduzido por Gilmar Mendes, decano do tribunal, e Cristiano Zanin, o ministro mais novo na Corte, para assinar o termo de posse e fazer o juramento à Constituição. Uma vez empossado, ele poderá ficar no STF até 2043.