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Os bastidores do aniversário de Toffoli que ajudou a frustrar golpe em 2022

Da esquerda para direita: Nelson Jobim, Dias Toffoli, Joaquim Barbosa, Kassio Nunes Marques e Alexandre de Moraes no aniversário de Toffoli no Bar dos Arcos Imagem: Reprodução

Do UOL, em São Paulo

30/11/2024 05h30Atualizada em 30/11/2024 08h57

O que havia começado como "bate-papos descontraídos", em um almoço de aniversário, terminou em diálogos confidenciais que convenceram o aniversariante daquele 20 de novembro de 2022 —o ministro do STF Dias Toffoli— a empreender um plano que pode ter atrapalhado o golpe de Estado planejado, segundo a PF, pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) no final daquele ano.

O que aconteceu

Dias depois da eleição que deu a vitória a Lula (PT), Toffoli convidou autoridades para celebrar seu aniversário de 55 anos. O local escolhido foi o Bar dos Arcos, no subsolo do Teatro Municipal de São Paulo. Estavam lá Nelson Jobim, ex-ministro da Defesa de Lula e Dilma (PT), o ministro do Supremo Kássio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro, Fábio Faria, então ministro das Comunicações, o coronel reformado da PM do Distrito Federal Jorge Oliveira, ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) indicado por Bolsonaro, e o deputado federal petista Arlindo Chinaglia.

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Informal, a festa daquele 20 de novembro foi mudando de tom por iniciativa do próprio anfitrião. "Em bate-papos descontraídos mantidos no encontro social que durou até a noite, Toffoli disse a alguns dos presentes que atuava para amenizar as tensões entre Lula e Bolsonaro", revela o livro-reportagem "O Procurador", de autoria do jornalista Luís Costa Pinto, lançado em julho deste ano.

As conversas se aprofundaram, dando ao ministro informações cruciais sobre o golpe em curso. "A amplitude das conversas estabelecidas por Toffoli deixou-o na condição de receptor privilegiado de informes e alertas extraoficiais de militares —ativos e da reserva—, que davam conta da movimentação do tal 'aparelho golpista'", diz o livro. Havia até uma menção à existência de um documento para formalizar a decretação de estado de sítio.

Toffoli teria levado a sério as informações. O ministro, diz o livro, confidenciou tudo o que ouviu a um aliado improvável: o procurador-geral da República indicado por Bolsonaro, Augusto Aras. Na conversa, Toffoli ficou sabendo que Aras também estava a par das "movimentações golpistas", segundo relatado por Costa Pinto.

Eles não sabiam se suas fontes eram as mesmas, mas "confiaram nos relatos". A investigação que revelou, em janeiro de 2023, a existência de uma minuta de decretação de estado de sítio e de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) —encontrada na casa do então secretário de segurança do DF, Anderson Torres— confirmou o que o ministro e o procurador haviam ouvido meses antes.

A estratégia contra o golpe

O golpe poderia se dar até a diplomação de Lula. "Na cabeça dos bolsonaristas", diz o livro, "a combinação de Estado de Sítio e GLO cancelaria a solenidade formal no TSE", uma vez que a diplomação de um presidente eleito —então prevista para 19 de dezembro— "decreta o fim do processo eleitoral e determina a inexorabilidade da troca de comando no país".

"A informação que chegou a ambos foi que no dia 19 ocorreria algo sério dessa 'nuvem golpista'", afirmou ao UOL Costa Pinto, autor do livro.

Print explicaria minuta golpista encontrada na sede do PL Imagem: Divulgação

Toffoli e Aras, então, procuraram seus interlocutores no PT. O procurador convidou os contatos que tinha no partido a irem até a sua residência: o então governador baiano Rui Costa e o senador da Bahia Jaques Wagner. Ele "sugeriu aos dois petistas que propusessem à equipe de transição de Lula, e ao corpo jurídico do PT, antecipar a diplomação" do petista, o que "desarticularia os preparativos para a intentona golpista".

À época desafeto do PT, Toffoli procurou o colega ministro do STF Alexandre de Moraes para repassar a mesma sugestão. Ele também fez o mesmo com o general da reserva Gonçalves Dias —que cuidou da segurança de Lula em seus mandatos anteriores. Embora Moraes, que na época presidia o TSE, negue ter sido procurado por Toffoli, no dia 28 de novembro Lula anunciou a antecipação da diplomação do dia 19 para 12 de dezembro. Na sequência, o TSE confirmou a data.

Moraes e Lula durante a cerimônia de diplomação do presidente eleito Imagem: Alejandro Zambrana/Secom/TSE

Antecipar a diplomação em uma semana "desorganizou e expôs o levante", diz o livro. Mesmo assim, a sede da Polícia Federal, no centro de Brasília, foi atacada às 19h30 daquele 12 de dezembro, quando Lula foi finalmente diplomado. Aquele foi o estopim do vandalismo de grupos bolsonaristas que naquele dia tomaram as ruas da capital, incendiando veículos e lançando botijões de gás para bloquear vias. "No dia 19 estava articulado algo bem maior do que o que aconteceu no dia 12", diz o jornalista.

A falta de providências do Ministério da Justiça e da direção-geral da PF diante da arruaça acendeu novo alerta. Toffoli e Aras se reuniram no dia seguinte à diplomação de Lula. Na ocasião, eles decidiram "manter a parceria e o compartilhamento de informações (...) até a posse do novo presidente, Lula, em 1º de janeiro de 2023", diz o livro.

"Rivotril" de Bolsonaro

Indicado por Lula para o STF, Toffoli se afastou do PT e se aproximou de Bolsonaro a partir de 2019. No Palácio do Planalto, ele era conhecido como "Rivotril" por ter o dom de acalmar o ex-presidente, revelou reportagem da colunista Vera Rosa, do Estadão.

Foi o ministro quem pediu a organização de um jantar com Bolsonaro para tentar demovê-lo do golpe. No dia 19 de dezembro, Fábio Faria ofereceu o jantar. Em dado momento, Toffoli teria chamado Bolsonaro de canto e perguntado: "O senhor acha que, se houver um ato de força, os generais quatro estrelas vão deixar um capitão [patente de Bolsonaro] assumir o poder? A história, como a de 1964, mostra que não", diz a reportagem.

Primeiro, Bolsonaro ficou em silêncio. Depois, afirmou que não planejava um golpe de Estado.

"O Procurador"

Jair Bolsonaro e Dias Toffoli (centro) na cerimônia de posse de Augusto Aras (direita) na Procuradoria-Geral da República Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

"O livro é um relato jornalístico dos momentos cruciais vividos por Aras na PGR", diz Costa Pinto. "Ele mostra qual era a relação que ele tinha com Bolsonaro, deixando claras as falhas que aconteceram naquele período, mas mostrando que, na manutenção do jogo democrático, houve sua participação silenciosa no processo."

Era sobre essa ação silenciosa que Toffoli se referiu ao dizer que, sem Aras, "não teríamos democracia". O ministro homenageou o então procurador-geral em seu último dia no comando do órgão em setembro do ano passado. Na ocasião, o ministro recebia do Conselho Nacional do Ministério Público uma comenda por serviços relevantes prestados ao MP. Ao lado de Toffoli, Aras teria atuado nos bastidores desde 2021 para evitar o golpe, segundo o autor.

Se não fosse a responsabilidade e paciência de sua excelência, Augusto Aras, talvez nós não estivéssemos aqui. Nós não teríamos democracia. Nós estivemos muito perto da ruptura. Na ruptura não tem Ministério Público, não tem direitos.
Dias Toffoli, ministro do STF, em setembro de 2023

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