É possível ser a favor do isolamento como medida essencial e necessária contra a expansão do novo coronavírus no Brasil e, ao mesmo tempo, entender que, sem aporte financeiro e social, as pessoas mais vulneráveis têm que se arriscar para obter o mínimo. Se isolar, a fome pega; se sair, a saúde fica em xeque.
Na favela do Flamengo, no Jardim Peri, zona norte de São Paulo, as vielas são estreitas e de terra. Já os barracos são divididos entre os que estão sobre o córrego, que serve como esgoto, ou ao lado da quadra poliesportiva, que beira a água suja. São raras as pessoas que usam máscara ou carregam consigo álcool em gel. Há muitas crianças brincando aglomeradas próximas ao lixo.
No ano passado, muitos dos que ali vivem dizem ter permanecido nos seus barracos com a ajuda do auxílio emergencial do governo federal, que ofereceu de R$ 600 a R$ 1.200 (para mães chefes de família) por mês. Com o novo valor que deve ser oferecido, entre R$ 150 e R$ 375 ao mês, e com a alta de produtos básicos, como botijão de gás, arroz, feijão, carne, ovo e óleo, não há outra alternativa que não seja ir para a rua à procura de trabalho.
O UOL acompanhou a rotina da comunidade durante um dia com o líder comunitário Samuel do Povo, 33. "Aqui, o pessoal não tem o básico dentro de casa. Tem muitos que não têm um sofá, uma cama. Então, necessariamente, vão para a rua. Se o auxílio emergencial ajudasse de verdade, as pessoas iam ficar um pouco mais em casa, porque teriam o que comer e como preparar o que comer", diz.
Morar na comunidade é bem difícil. São vários problemas. A covid-19 está matando muita gente, mas também tem a fome. Não acho certo ter que escolher qual problema é pior ou maior. Ambos são cruéis.