O banco de dados da RaiaDrogasil, usado pela startup RD Ads, permite que o anunciante faça até 20 tipos de filtros sobre o cliente: produtos comprados, idade, sexo, se é gastador ou econômico, região e dias de preferência para comprar.
É dessa forma que é possível selecionar clientes com perfil "sênior debilitado", nas palavras da própria RD Ads.
"Identificamos as cestas [de compras] daqueles clientes que possuem problemas cardiovasculares, diabetes, colesterol e outras patologias, além de itens como fraldas geriátricas e curativos para ajudá-los com o melhor tratamento".
Ou o "sênior ativo", que leva "itens como: coloração para os cabelos, suplementos nutricionais e vitaminas".
"Impactamos e mensuramos os clientes com base em dados REAIS de compra. Temos acesso a 100% da transação sempre que o CPF é fornecido", diz a RaiaDrogasil, em apresentação feita no segundo semestre de 2022.
Um dos "cases" da RD Ads é de um produto para bebês. Casais com filhos de até dois anos foram identificados no banco de dados por meio da compra de "fraldas, papinhas e produtos correlacionados". A propaganda foi direcionada para eles. Resultado: as vendas alavancaram 20%.
Os clientes podem ser encarados como audiências (...) [O varejista] pode passar a vender mídia para esse bloco de clientes, concorrendo pelo bolo de investimento publicitário com Google, Meta. Vitor Bertoncini, CEO da RD Ads
A pergunta que fica é: a farmácia pode fazer isso? A resposta não é preto no branco. Há uma zona cinzenta, pendente de regulação e fiscalização.
A LGPD diz que informações de saúde são consideradas "dados sensíveis", categoria que precisa de maior proteção. E diz que o compartilhamento para obter vantagem econômica "poderá ser objeto de vedação ou de regulamentação".
Nos EUA, em fevereiro deste ano, uma empresa de cupons de desconto em remédios recebeu uma multa milionária da Comissão Federal de Comércio por usar dados de saúde para vender anúncios.
A RaiaDrogasil diz que os clientes que dão o CPF autorizaram o uso das informações de saúde. Não sei você, mas eu só fiquei sabendo que vendem meu histórico para publicidade por esta reportagem. A política de privacidade da empresa não fala de monetizar os dados. [Leia a entrevista com Vitor Bertoncini, CEO da RD Ads, braço de anúncios da RaiaDrogasil]
A RaiaDrogasil também afirma que as informações são anonimizadas antes de serem usadas nos anúncios. Mas a Autoridade Nacional de Proteção de Dados ainda vai definir se direcionar publicidade para o indivíduo exato que fez a compra é mesmo um uso anonimizado e se não fere a lei.