A "bolsonarização" das polícias militares —preocupação latente no meio político desde a eleição de 2018— saiu dos bastidores e passou a ser apontada por lideranças da oposição após manifestações em defesa da democracia eclodirem em mais de 20 estados nos últimos fins de semana.
Nas redes sociais, vídeos gravados nas ruas evidenciam a diferença de tratamento das polícias em relação a manifestações pró e contra Jair Bolsonaro (sem partido) —em diversos casos, as PMs reprimiram com violência manifestantes antifascistas, conhecidos como antifas.
As posturas das polícias acontecem em meio a uma crescente politização dos quartéis.
Levantamento inédito feito pelo UOL com base em dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mostra que ao menos 7.168 policiais militares disputaram eleições em todo o Brasil entre 2010 e 2018 —o número envolve as candidaturas em eleições municipais (prefeituras e câmaras) e gerais (para Presidência, Congresso, governos e assembleias legislativas).
Isso significa que um em cada 58 policiais nas ruas tem ambições políticas —levando em conta que, ao final de 2018, as PMs tinham um efetivo de 417.451 homens e mulheres na ativa.
Somente os PMs que são eleitos precisam deixar definitivamente o ambiente militar. Os que fracassam —maioria absoluta dos casos— podem seguir na polícia sem nenhum tipo de restrição.
A onda conservadora que varreu o país em 2018 também impulsionou as candidaturas de PMs —foram 603 candidatos em 2018 contra 477 em 2010, uma alta de quase 30%. O total de eleitos saltou de sete, em 2010 e 2014, para 34 na última eleição.
Essa militância nos quartéis preocupa especialistas, governadores e lideranças políticas. Especialmente em um momento em que Bolsonaro radicaliza o discurso contra as instituições.
A radicalização política nas polícias levou o governo federal a fazer dez decretos de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) para conter motins na última década. Alvo da última rebelião armada de policiais, o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), resumiu o quadro existente nas corporações em entrevista ao programa Roda Vida na última segunda-feira (8):
O que eu vejo muito na polícia e o que aconteceu aqui é um pouco da partidarização da polícia. Que não é só no Ceará, que é em todos os estados brasileiros. Acho que o equívoco do Brasil é confundir e autorizar que policiais militares façam parte da vida partidária e possam retornar às próprias polícias se perderem as eleições
Camilo Santana (PT), governador do Ceará
Como o UOL revelou em fevereiro, as principais lideranças do motim na PM cearense eram políticos oriundos das fileiras da corporação e alinhados a Jair Bolsonaro. Caso do ex-deputado federal Cabo Sabino (Avante-PE) e do vereador de Sobral (CE) Sargento Ailton (expulso do Solidariedade após a reportagem) —o último comandava a tomada do quartel onde o senador Cid Gomes (PDT-CE) foi baleado.