O Brasil é, e sempre foi, um país autoritário. Em busca das razões que expliquem a eleição do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e a sensação de crescente intolerância em relação ao outro, a historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz debruçou o olhar sobre o cotidiano político do país para escrever o recém-lançado "Sobre o Autoritarismo Brasileiro" (Companhia das Letras).
Ao falar do livro, feito em poucos meses a pedido da editora, Lilia afirma que sua geração de intelectuais e governantes falhou em não ver que havia uma parcela da população brasileira que não se sentia atendida pela utopia da Constituição de 1988.
Se a política é a arte de produzir consensos, de certa forma, o consórcio PT-PSDB falhou em não ver essa população que não estava atendida
A naturalização da desigualdade, o patriarcalismo, a corrupção, o racismo velado, entre outros elementos, são dissecados pela autora para explicar o que somos hoje. O olhar antes otimista sobre democracia --tratado em seu livro anterior, "Brasil: uma Biografia"-- assume um tom de alerta na nova obra.
Lilia diz que o governo Bolsonaro produz retóricas originais, critica o revisionismo histórico e alerta para a figura de "pai" assumida pelo presidente. "Veja que ele dá poderes aos seus três filhos homens, com poderes para os quais não foram eleitos. É uma contaminação das esferas pública e privada muito forte. Porque ela vem embrulhada nessa imagem, da qual os brasileiros não conseguem se desvencilhar, de que o presidente não é um contrato, mas ele é o grande pai."
Nas redes sociais desde o segundo turno das eleições de 2018, a historiadora diz que tem aprendido muito na missão de ampliar o debate, mas se vê presa também em uma bolha. "Pena que não tenho muita gente contra", diz ela, sobre seus atuais 50 mil seguidores.
Leia, a seguir, trechos da entrevista feita no escritório de Lilia pouco antes de ela partir para uma manifestação pela educação em São Paulo, na última quinta.