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Por que a acne severa não é só um problema de pele

Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

18/09/2015 06h00

As primeiras espinhas apareceram no rosto do estudante de Educação Física Luis Cláudio Motta quando ele tinha 15 anos e logo se "proliferaram", tomando conta da sua face, dos ombros, do peitoral, em um período em que a aparência parece ser uma das coisas mais importantes da vida. "Meus amigos me 'zoavam' e foi bem naquela fase em que a gente quer arrumar uma namorada. Eu ficava inseguro, me achava feio. Aquela vermelhidão, o pus, tudo me deixava constrangido", lembra.

Essa angústia que marcou a adolescência de Luis Cláudio é a mesma enfrentada por cerca de 24 milhões de adolescentes brasileiros, ou seja, 80% dessa parcela da população, segundo dados da Sociedade Brasileira de Dermatologia. A acne é o problema dermatológico mais comum no país, afeta 56,4% dos brasileiros e é o motivo que mais leva pacientes aos consultórios de dermatologistas.

Muitos desses adolescentes criam aversão à própria imagem, tendem a se isolar e, em casos extremos, desenvolvem depressão. "A acne afeta a autoestima em uma fase em que tudo já está muito difícil, em que o adolescente já tem uma grande dificuldade em conviver com os demais, em se aceitar", explica o dermatologista Otávio Macedo, autor do "O Livro dos Dias que Eu Desisti de Apagar da Minha Vida", que aborda a questão da autoestima em pacientes que sofrem com acne.

A analista de controladoria de projetos Danielle de Campos, 36, começou a ter acne na adolescência, por volta dos 13 anos. Ela conta que seu problema além de genético tinha a ver com alterações hormonais que iam além das que acontecem durante essa fase da vida, e por isso a doença perdurou por anos. "Eu me sentia muito incomodada, usava muita base para tentar esconder, me sentia insegura, feia, mas isso nunca me impediu de sair, de me relacionar com as pessoas", conta.

Efeitos permanentes na autoestima

Muitas vezes, a acne mal tratada pode levar a efeitos negativos na autoestima que podem trazer consequências para a vida adulta. "Quando essa autoestima se quebra é muito difícil reparar. Pacientes com esse problema que se tratam na vida adulta conseguem muitas melhoras, mas vão sempre apresentar traços de insegurança. É como um cristal que foi rachado", explica a psicóloga Susi Andrade.

No entanto, se esse período for encarado da maneira correta, pode ser inclusive uma lição de vida para o adolescente. "Enquanto trata a doença ele pode aprender que a beleza vai além da aparência, que há outras qualidades que devem ser exploradas, evidenciadas", disse.

Por que a acne existe?

Na adolescência, o desenvolvimento dos hormônios sexuais causa um crescimento nas glândulas sebáceas, que passam a produzir uma quantidade maior de secreção gordurosa. Essa secreção não consegue passar pelo poro da pele e se acumula, tornando o ambiente propício para a proliferação de bactérias, especialmente a Propionibacterium acnes. É ela a responsável pelo tormento dos adolescentes.

Nesse período de mudanças no corpo e no comportamento, quando é imprescindível a identificação com um grupo, se perceber com um 'defeito' pode ser danoso para o psicológico do adolescente, segundo especialistas. "Isso pode afetar o desenvolvimento da autoestima, resultar no isolamento social, depois agressividade e, por último, depressão", explica a psicóloga do Hospital e Maternidade São Cristóvão, Susi Andrade.

Luis Cláudio Motta, hoje com 19 anos, diz que sua vida mudou depois do tratamento feito com isotretinoína, um remédio usado para tratar acne severa. "Foi como se tomasse posse da minha vida de novo. Perdi o constrangimento. Quando a gente tem uma pele bonita, fica mais encorajado, se acha mais capaz", disse.

Ele começou a se tratar com um dermatologista quando tinha 17 anos e só depois de seis meses começou a ver os resultados. "O remédio tem efeitos colaterais, a pele fica seca, meu nariz sangrava muito, mas é algo suportável e o remédio não dura para sempre. Os efeitos colaterais passam e os benefícios ficam", conta. Ele tomou o medicamento durante oito meses e até hoje mantém o tratamento com loções e sabonetes receitados pelo médico. Mas o que serviu para Luis Cláudio, pode não servir para outros, e o uso do medicamento precisa ser feito com acompanhamento médico.

Quanto mais cedo tratar, melhor

O estudante levou dois anos para buscar ajuda. Quem o levou ao médico foi o pai, ciente da tendência da família de desenvolver acne. "Existe um pensamento equivocado sobre o problema. No geral, as pessoas pensam que a acne vai passar com a idade, que aquele remédio caseiro vai resolver, mas não vai. É preciso procurar o dermatologista logo que o problema aparece, pois se um cravo não é tratado, ele vira uma espinha, que vira uma pústula, depois um cisto. É preciso tratar para que lesões maiores não se desenvolvam", afirma Macedo.

Além disso, seguir à risca o que o dermatologista prescreve é a chave do sucesso do tratamento. "Dependendo do grau da acne, o tratamento é de pelo menos um ano. Uma vez atingido o resultado, precisa de manutenção, ou seja, lavar o rosto com produto certo, secativo. É como ir ao dentista, tem que fazer visita a cada seis meses", afirma o médico. Macedo é enfático ao afirmar que "a acne tem cura, mas ela é alcançada com perseverança".

Novas técnicas para tratar cicatrizes

A isotretinoína é usada há mais de três décadas para tratar a acne severa e continua sendo a principal aliada na luta contra a acne. "O tratamento é o mesmo e tem sido bastante eficaz. O problema está nas cicatrizes que ficam no rosto depois que o tratamento é concluído", conta Macedo.

Novas técnicas têm sido desenvolvidas para amenizar os "buracos" no rosto. Macedo enumera algumas, como o laser fracionado, que difere de tratamentos tradicionais, não queima a pele, e por isso não afeta a vida social do paciente. Essa técnica estimula a produção de colágeno, proteína responsável por deixa a pele com aspecto firme e liso. "Por último, o paciente pode ser submetido ao microagulhamento com radiofrequência, que estimula a produção de ácido hialurônico e colágeno", conta.