Jovem enfrenta transtorno alimentar que combina diabetes e bulimia
A primeira vez que se esqueceu de tomar sua dose de insulina, a garota de 22 anos disse que não havia sido planejado. Ela visitava os avós durante a semana de férias de verão da faculdade e se entupiu de batata frita e doces, mas se esqueceu de tomar a insulina extra de que as pessoas com diabetes tipo 1, como ela, necessitam para manter normalizados os níveis de açúcar no sangue.
Já estava abaixo do peso, após meses de uma dieta extrema, mas quando pisou na balança no dia seguinte, viu que perdera vários quilos da noite para o dia. "Logo percebi a ligação", disse a jovem que mora em Boston e preferiu permanecer anônima.
Ela então desenvolveu um hábito perigoso que costumava baixar seu peso: embarcava em uma comilança, muitas vezes devorando um pote inteiro de sorvete de amendoim, e então deliberadamente evitava os suplementos de insulina de que precisava.
As pessoas com diabetes tipo 1, que não produzem sua própria insulina, precisam de tratamento contínuo com o hormônio para que a glicose da corrente sanguínea vá para as células. Quando ignoram ou restringem a insulina -- ou por que não conseguem aplicá-la ou por que não sabem manipular uma bomba de insulina -- os açúcares e as calorias vão parar na urina, causando uma perda de peso rápida.
Mas as consequências podem ser fatais. "Eu sabia que estava brincando com fogo, mas não estava pensando em minha vida, só no meu peso. Estava acostumada com as altas taxas de açúcar no sangue o tempo todo. Ficava tão enjoada que chegava a vomitar e sabia que esse era um sinal de que eu deveria ir para o hospital. Fiquei morrendo de medo", disse a jovem, que foi tratada no Centro Renfrew de Boston, especializado no tratamento de distúrbios alimentares, e está em recuperação.
O transtorno alimentar que a jovem desenvolveu é exclusivo de pessoas com diabetes tipo 1 e tem sido chamado de diabulimia, embora não seja uma condição médica reconhecida. (Pessoas com diabetes tipo 2 que tomam insulina não têm a mesma resposta rápida à restrição). Ele ocorre quando os pacientes manipulam sua insulina a fim de eliminar calorias, assim como alguém com bulimia que induz o vômito para perder peso.
A falta de insulina pode levar à cetoacidose diabética, uma condição potencialmente fatal que se desenvolve quando o corpo fica sem insulina e começa a quebrar a gordura, produzindo cetonas que podem envenená-lo. Também aumenta o risco de graves complicações do diabetes em longo prazo, incluindo doença renal, cegueira, danos aos nervos, amputações e doenças cardíacas.
"É uma barganha como a do personagem Fausto", disse Henry Cheng, diretor médico regional do Centro Renfrew.
Jovens com diabetes tipo 1 — normalmente diagnosticado na pré-adolescência, quando as meninas têm uma maior tendência a se preocupar com peso e imagem corporal — têm um risco 2,4 vezes maior de desenvolver distúrbios alimentares quando comparadas a jovens sem diabetes, sugere uma pesquisa. A perda de peso é, quase sempre, o primeiro sintoma do diabetes tipo 1, mas, uma vez que a condição é diagnosticada, os pacientes iniciam o tratamento com insulina e tendem a recuperar peso.
"A combinação de diabetes tipo 1 e um distúrbio alimentar é muito perigosa. A anorexia é o diagnóstico psiquiátrico mais letal que existe e o risco de mortalidade é muito mais maior quando envolve o diabetes tipo 1", disse Ann Goebel-Fabbri, psicóloga de Brookline, em Massachusetts, especializada no tratamento de pessoas com diabetes e distúrbios alimentares.
A pesquisa sugere que a manipulação da insulina é comum. Um estudo recente na Alemanha descobriu que, entre os pacientes com idades variando entre 11 e 21 anos se tratando com insulina para diabetes tipo 1, uma em cada três garotas e um em cada seis meninos relataram também alguma desordem alimentar, a restrição de insulina ou ambos.
Outro estudo do Centro de Diabetes Joslin, em Boston, que seguiu 234 mulheres adultas com diabetes tipo 1 durante 11 anos, descobriu que 30 por cento delas relataram adotar comportamentos de restrição de insulina. As que restringiram morriam com uma idade média de 45 anos, em comparação com 58 para as que não o faziam.
"Tratar a diabulimia é ainda mais complicado porque o tratamento de transtornos alimentares e o do diabetes entram em choque. O segundo inclui um foco muito intenso na leitura de rótulos, na contagem de calorias e carboidratos e na limitação de sódio e gordura. Todas essas coisas que são eficazes no tratamento do diabetes, na verdade, são contraindicadas para transtornos alimentares, onde tentamos ter uma abordagem mais intuitiva, dizendo que não há alimentos bons ou ruins", disse Trish Lieberman, diretora de nutrição do Renfrew.
Segundo Ann Goebel-Fabbri, o foco meticuloso na alimentação para os diabéticos "pode imitar a mentalidade do distúrbio alimentar".
"Um perigo adicional ocorre quando os pacientes diabéticos deixam a assistência médica de lado", disse ela. Foi isso que aconteceu com a estudante de Boston, que adiava as consultas médicas por meses, esperando que isso lhe desse tempo para mudar o comportamento e melhorar os resultados dos níveis de glicose de sangue. Ela estava assustadoramente abaixo do peso, e a família e os amigos estavam preocupados.
Em abril passado, sentindo muita dor e com medo de ter danificado seus rins (o que não ocorreu), ela finalmente se inscreveu no programa de tratamento intensivo de cinco semanas no Renfrew, seguido de outro de seis semanas, um pouco menos intensivo.
"Naquele momento, não era tanto por mim. Cheguei até a pensar que se eu morresse, era merecido. Estava pensando mais da minha mãe. Não podia fazer isso com ela", disse.
Embora ainda tenha pensamentos obsessivos em relação à comida, ela acrescentou: "Estou bem melhor. Meu peso está em uma faixa saudável e me sinto mais confiante para pedir ajuda".
Especialistas dizem que médicos e membros da família devem ficar atentos aos transtornos alimentares em pacientes com diabetes tipo 1 com repetidos episódios de cetoacidose ou com um controle da glicemia consistentemente fraco. Os distúrbios alimentares geralmente se desenvolvem durante a pré-adolescência e a adolescência, mas podem surgir mais tarde, durante os anos de faculdade ou no início da idade adulta em pessoas com diabetes tipo 1, dizem os especialistas.
Quando os pacientes conseguem ajuda e começam a se recuperar, podem voltar a ser saudáveis e evitar complicações em longo prazo, disse Ann. "O lado positivo, aquele que as pessoas precisam ouvir, é que a cura é possível quando os níveis de açúcar no sangue se encontram em uma faixa mais saudável."
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