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Serviços secretos da Venezuela cometem crimes contra a humanidade contra a oposição, afirma ONU

20/09/2022 09h49

Os serviços de inteligência da Venezuela cometem crimes contra a humanidade sob ordens dos mais elevados escalões do governo para reprimir a oposição, disse a ONU em um relatório nesta terça-feira (20). 

"Nossas investigações e análises mostram que o Estado venezuelano usa os serviços de inteligência e seus agentes para reprimir a dissidência no país. Isso leva à prática de crimes graves e violações de direitos humanos, incluindo atos de tortura e violência sexual", denuncia Marta Valiñas, presidente da Missão Internacional Independente da ONU na Venezuela.

As conclusões apresentadas nesta terça-feira mostram o papel do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (SEBIN) e da Direção de Contra-Inteligência Militar (DGCIM) na realização dos atos, "na execução de um plano orquestrado pelo presidente Nicolás Maduro e outras autoridades de alto nível para reprimir a oposição ao governo, inclusive cometendo torturas extremamente graves, o que constitui crimes contra a humanidade", disse a missão em um comunicado à imprensa. 

A missão documentou 122 casos de vítimas que foram "submetidas à tortura, violência sexual e/ou outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes" perpetrados por agentes da DGCIM de 2014 até hoje.

Entre os métodos de tortura usados estão "espancamentos com objetos, choques elétricos, asfixia com sacos plásticos e posições de estresse, além de formas de tortura psicológica, como a 'tortura branca'", detalha o texto. 

Esses eventos ocorreram em sua sede em Boleíta, Caracas, e em uma rede de centros de detenção clandestinos em todo o país.

- Ordens de Maduro -

De acordo com a análise da missão e as informações recebidas, as autoridades detiveram pessoas que eram supostamente dissidentes e opositores do governo. Em alguns casos, Maduro e outros de seu círculo próximo, bem como outras autoridades de alto nível, "participaram da seleção dos alvos'. 

O relatório também cita Maduro e Diosdado Cabello, número dois do chavismo, como origem das ordens para identificar alguns dos detidos pelo SEBIN. 

Os serviços de inteligência "torturaram e maltrataram detidos - incluindo políticos da oposição, jornalistas, manifestantes e defensores dos direitos humanos - principalmente no centro de detenção 'El Helicoide'", na capital venezuelana.

Ex-detentos deste centro relataram à missão da ONU as péssimas condições em que foram encontrados e que muitos presos "tinham que urinar em garrafas plásticas", porque só lhes era permitida uma ida diária ao banheiro. Havia celas "privilegiadas" com melhores condições pelas quais os detentos tinham que pagar. 

A missão investigou 51 casos ocorridos desde 2014. 

"Tanto a SEBIN quanto a DGCIM usaram violência sexual e de gênero para torturar e humilhar seus detidos", acrescenta.

A missão, que já apresentou dois relatórios anteriores - em 2020 e 2021 - enfatizando as violações dos direitos humanos no país latino-americano, insiste que esses atos, especialmente os cometidos pela SEBIN e pela DGCIM, "continuam até hoje". 

E adverte que "têm ocorrido num clima de impunidade quase total", segundo Francisco Cox, membro da missão da ONU.

- Área de mineração - 

Além das conclusões sobre o papel dos serviços de inteligência, o painel da ONU também publica um relatório sobre as violações de direitos humanos cometidas por "atores estatais e não estatais" contra a população local no chamado Arco Minero del Orinoco, um extensa região no sul da Venezuela rica em ouro e outros minerais como ferro ou coltan. 

O grupo detalha "privação arbitrária da vida, desaparecimentos, extorsão, punição corporal e violência sexual e de gênero". 

No estado de Bolívar e em outras áreas de mineração, "populações locais, incluindo povos indígenas, estão imersas em uma violenta batalha entre atores estatais e grupos armados criminosos pelo controle do ouro", acrescenta. 

A missão insiste na necessidade de uma investigação mais profunda nesta região. 

Desde sua criação em 2019, o grupo da ONU não está autorizado a entrar na Venezuela e tem realizado suas investigações nas regiões fronteiriças e a partir de entrevistas à distância. 

Suas conclusões são baseadas em 246 entrevistas confidenciais com vítimas, seus familiares e ex-funcionários dos serviços de segurança e inteligência.

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© Agence France-Presse