Centrão chega ao Senado e faz articulação pró-governo
Daniel Weterman
Brasília
24/10/2020 12h00
A expansão dos domínios do Centrão para o Senado ganha relevância em um momento no qual o presidente também precisa de apoio na Casa que abriga seu filho Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), alvo de investigações. Conhecido pelo pragmatismo do "é dando que se recebe", o grupo de partidos de centro e de direita só atuava até agora na Câmara. Foi criado ali durante a Assembleia Constituinte, em 1988, dissolveu-se em seguida, mas ressurgiu nos últimos anos, com nova configuração.
Na Câmara, o Centrão tem aproximadamente 180 integrantes e age como uma espécie de fiel da balança para que propostas importantes, como a que modificou regras da Previdência, sejam aprovadas. No Senado, o sinal verde para projetos de interesse do governo também depende agora desse grupo.
Embora tenha passado por partidos que integravam o Centrão quando era deputado, Bolsonaro foi eleito rejeitando o bloco, carimbado por ele como "velha política". No início deste ano, porém, após sucessivas derrotas no Congresso, o presidente construiu uma base de apoio parlamentar com o Centrão, em um movimento para reduzir a influência do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Faltava, no entanto, montar uma tropa mais alinhada ao Planalto no Senado.
Alcolumbre assumiu o papel de organizar esse grupo, mesmo porque precisa de aliados para tentar se reeleger ao comando da Casa. Atualmente, a Constituição proíbe a recondução dos presidentes da Câmara e do Senado na mesma legislatura, mas Alcolumbre tenta aval do Supremo Tribunal Federal (STF) para uma manobra que permita sua candidatura.
Historicamente, o Senado sempre foi comandado pelo PMDB, hoje MDB. Desde 1985, o partido só não ficou com a presidência da Casa nesta legislatura e de 1997 a 2001, quando Antonio Carlos Magalhães (do PFL, hoje DEM) reinou absoluto.
Caciques
Nesse novo Centrão do Senado estão nomes que orbitam em torno de Alcolumbre e têm formado uma base mínima de apoio a Bolsonaro, na esteira das negociações para cargos e verbas públicas com o Planalto. Entre os expoentes figuram velhos caciques do Congresso, como Renan Calheiros (MDB-AL), que já presidiu o Senado, Ciro Nogueira (Progressistas-PI), Eduardo Braga (MDB-AM), Kátia Abreu (Progressistas-TO) e Marcio Bittar (MDB-AC), além de Flávio Bolsonaro. Mesmo dentro do grupo, no entanto, há divisões sobre a eleição da cúpula do Congresso, em fevereiro. Enquanto Alcolumbre tenta novo mandato à frente da Casa, com apoio até do PT, Braga é apontado como possível candidato.
A articulação mais recente do Centrão envolveu a indicação do desembargador Kassio Marques para o Supremo. Na quarta-feira, o Senado aprovou a escolha de Marques por 57 votos a 10. Os senadores do grupo comandaram as negociações, desde a indicação do nome do desembargador - com aval de Flávio e de Ciro Nogueira - até a aprovação, inclusive com jantares e encontros informais, antes da sabatina.
O Centrão do Senado agiu, ainda, para garantir controle sobre o Orçamento. Marcio Bittar e Irajá (PSD-TO) foram escalados para relatar a Lei Orçamentária Anual (LOA) e a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), respectivamente. Esses dois projetos são os mais cobiçados no Congresso por definir o destino das emendas parlamentares e escolher onde o governo vai gastar. Além disso, Alcolumbre emplacou nove aliados entre as dez vagas destinadas a senadores titulares na Comissão Mista de Orçamento.
Feirão
A distribuição de dinheiro público também faz parte da articulação. Como o Estadão revelou, Bolsonaro promoveu um "feirão" de emendas em almoço com senadores, no último dia 7, no Planalto. Ali estavam presentes líderes do Centrão no Senado: MDB, DEM, Progressistas e PSDB.
Na ocasião, o governo não apenas selou a liberação de emendas como a indicação de recursos para 2021, em troca de apoio para projetos, a exemplo do Renda Cidadã, que ainda não saiu do papel. Bolsonaro aproveitou para gravar vídeos ao lado dos senadores. O governo já pagou R$ 12,8 bilhões em emendas.
A divisão de "patotas" no Senado, porém, é diferente da observada na Câmara. Neste ano, por exemplo, DEM e MDB desembarcaram do bloco na Câmara. O racha está ligado à sucessão de Maia e a alianças para a disputa de 2022 ao Planalto.
"Se fosse um jogo de basquete, na Câmara a marcação é por zona e no Senado a marcação é individual. Existe mais diálogo no Senado, inclusive com a oposição", afirmou o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO).
Eleito com o discurso de renovação e apoiado pela ala independente do Senado, favorável à Lava Jato, Alcolumbre jogou os antigos aliados para escanteio e, alinhado ao Planalto, se juntou a velhos caciques da política. Com isso, o núcleo "Muda, Senado", que apoiou Alcolumbre e hoje faz oposição a ele, implodiu nos últimos meses.
"Normalmente, dizem que o Senado é o céu sem precisar morrer", afirmou o senador Major Olímpio (PSL-SP), que se lançou como candidato à presidência da Casa em oposição a Alcolumbre. "É tudo com oferecimento de benesses do governo. Há um jogo do Planalto para atender às pessoas que o Davi quiser. Isso provoca esse deslocamento de senadores para outros partidos." O presidente do Senado não tem se manifestado sobre as críticas e tenta o respaldo de no mínimo 50 dos 81 senadores para seu projeto de poder. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.