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Como alta em tarifa de metrô detonou maior onda de protestos em décadas no Chile

AFP
Imagem: AFP

20/10/2019 13h19

Resumo da notícia

  • A maior onda de protestos no Chile atingiu seu ponto mais crítico quando três pessoas pessoas morreram em um incêndio na capital Santiago
  • As manifestações começaram há uma semana, após ser decretado um aumento das tarifas de metrô da cidade
  • A alta da tarifa contribuiu para amplificar descontentamentos do povo chileno com outras políticas públicas, como o sistema de pensões
  • Os protestos se tornaram violentos a partir de sexta. Houve confrontos entre manifestantes e policiais e destruição de várias estações de metrô

O aumento intensificou insatisfações do povo chileno com políticas públicas e outras questões do país. Diante do agravamento da crise, governo de Sebastián Piñera suspendeu medida e enviou militares às ruas de Santiago pela 1ª vez desde o fim da ditadura.

* Matéria atualizada às 14h45 de 20/10/19

A maior onda de protestos em décadas no Chile atingiu seu ponto mais crítico na noite do último sábado, 19 de outubro, quando pelo menos duas pessoas morreram em um incêndio em um supermercado na capital Santiago.

Inicialmente, a intendente da região, Karla Rubilar, havia falado em três mortos, mas na manhã deste domingo, o ministro do Interior do país, Andrés Chadwick, confirmou dois óbitos. Segundo ele, há uma terceira pessoa em estado grave, com queimaduras em 75% do corpo.

As manifestações começaram há uma semana, após ser decretado um aumento das tarifas de metrô da cidade e, desde então, se espalharam para outras partes do país. Foram registrados protestos em Concepción, Rancagua, Punta Arenas, Valparaíso, Iquique, Antofagasta, Quillota e Talca, segundo o jornal El Mercurio.

A alta da tarifa contribuiu para amplificar descontentamentos do povo chileno com outras políticas públicas, como o sistema de pensões, os custos dos serviços de saúde, o preço da gasolina e as taxas de serviços públicos.

"Chega de aumentos, basta de injustiças. As pessoas não vão parar até que o governo reconheça: a luz, a água, tudo está sendo vendido neste país", disse à uma emissora de televisão um manifestante em Santiago.

Os protestos se tornaram violentos a partir de sexta-feira. Houve confrontos entre manifestantes e policiais e destruição de várias estações de metrô, deixando um saldo de mais de 300 detidos e de 11 cidadãos e 156 policiais feridos, segundo autoridades.

"O governo transformou o caos viário em caos social", afirmou Eric Campos, presidente da Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores do Metrô.

Isso fez o governo enviar tropas do Exército às ruas de partes de Santiago. Foi a primeira vez que isso ocorreu desde 1990, quando o Chile voltou à democracia após a ditadura de Augusto Pinochet.

A crise levou ainda à declaração de estado de emergência por 15 dias na capital e em duas Províncias vizinhas, além de um toque de recolher na noite de sábado para domingo em Santiago.

O agravamento da situação levou o governo de Sebastián Piñera a recuar e suspender o aumento. "Isso exigirá a aprovação urgente de uma lei", disse Piñera em comunicado. O presidente condenou os atos de violência, mas disse ter ouvido "com humildade e atenção" os pedidos dos manifestantes.

Governo diz que buscará acordo

Apenas dois dias antes dos protestos se intensificarem e levarem ao estado de emergência, Piñera disse em uma entrevista à Radio Cooperativa que o Chile era "um verdadeiro oásis no meio de uma América Latina em convulsão".

O presidente foi criticado por ter sido fotografado em uma pizzaria com sua família na tarde de sexta-feira. Ele estaria comemorando o aniversário de um neto, enquanto os protestos se intensificavam sem que as forças policiais pudessem controlá-los.

Críticos disseram que a imagem era emblemática de um líder que havia perdido o contato com o povo. "O presidente também é pai, marido e avô", disse um porta-voz do governo em defesa do presidente.

Piñera afirmou que a suspensão do aumento será aplicada até que seja fechado um acordo que "permita aos chilenos melhor proteção" contra aumentos repentinos e inesperados no preço do dólar e do petróleo que, segundo ele, são a causa da elevação das tarifas.

Ele convocou para este domingo uma reunião com diferentes poderes do Estado para ouvir propostas para superar "essa difícil situação".

A oposição acusa o governo de reduzir subsídios ao transporte público e exige maior transparência nas decisões do comitê de especialistas que analisa o aumento das tarifas do metrô.

Piñera anunciou que, na próxima semana, formará uma mesa de diálogo para ouvir diferentes setores sociais e suas demandas, entre as quais mencionou a redução do custo de vida, maior segurança e a queda no preço dos medicamentos.

Opiniões divididas quanto às manifestações

Após o anúncio, autoridades militares decretaram um toque de recolher em Santiago e em duas províncias vizinhas, das 22h de sábado até às 7h da manhã de domingo.

"A restrição de liberdades implica que as pessoas devem permanecer em suas casas, e aqueles que, por razões de saúde ou emergência, precisam se movimentar, devem solicitar um acompanhamento na delegacia mais próxima", explicou à agência EFE o general Javier Iturriaga del Campo, nomeado pelo presidente para proteger a capital durante o estado de emergência.

O toque de recolher também levou ao envio de mais unidades do Exército, que já tinha colocado 500 soldados nas ruas de Santiago desde sábado de manhã.

Isso não impediu que pelo menos cinco ônibus fossem incendiados, barricadas fosem montadas nas ruas e confrontos fossem registrados entre manifestantes e forças de segurança.

O clima era volátil em alguns pontos, especialmente nas áreas central e oeste de Santiago, onde grandes contingentes policiais vigiavam algumas das 41 estações de metrô, das 136 existentes, que foram alvo de ataques na noite de sexta-feira.

A maioria da população rejeita e lamenta a violência e a destruição do metrô, que é um orgulho da cidade. Em declarações à imprensa, as opiniões se divididem entre aqueles que acreditam que o vandalismo é cometido por grupos isolados e aqueles que enfatizam o direito e a necessidade de manifestar-se.

Ao mesmo tempo, parece haver um certo consenso de que os protestos são fruto de uma insatisfação generalizada em torno de questões que estão em intenso debate: a precariedade do sistema de pensões, o alto valor dos medicamentos, os aumentos do preço da energia, o maior números de crimes e preocupações com a seca prolongada, restrições ao consumo de água em áreas de grandes plantações agrícolas e a desigualdade persistente.

O som das panelas foi ouvido no sábado em diferentes partes da cidade, acompanhado pela buzina de carros que circulavam pela capital.

Houve um aumento do número de ônibus disponíveis para tentar atender ao quase 3 milhões de passageiros que usam diariamente o metrô de Santiago, que permanece paralisado. A destruição de semáforos e praças de pedágio em rodovias também dificultou a vida de quem precisou se locomover pela cidade.

A situação era diferente nos bairros de maior renda, como no leste de Santiago, onde havia pequenos grupos de cidadãos e policiais próximos a estações fechadas, mas, em geral, intactas. Nestas regiões, pessoas circulavam em meio a frutas e verduras nos tradicionais mercados de fim de semana e nos shoppings.


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