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Acolhimento de refugiados em igrejas é alvo de críticas na Alemanha

24/08/2018 11h27

O governo alemão decide quem tem direito a refúgio, mas em alguns casos paróquias podem abrigar os migrantes temporariamente. No entanto, algumas paróquias enfrentam críticas por quebrarem regras, impedindo deportações.Para migrantes que tiveram seu pedido de refúgio negado pelo governo alemão, muitas vezes a Igreja é a última esperança. Muitas paróquias do país abrem suas portas para atrasar ou impedir uma deportação iminente. Os refugiados vivem, então, por várias semanas e meses nas dependências da paróquia e ficam temporariamente protegidos da polícia.

O refúgio da Igreja torna possível "submeter às autoridades casos individuais para uma reavaliação e, assim, evitar casos de injustiças humanitárias", disse recentemente Karl Jüsten, o encarregado para questões políticas da Conferência dos Bispos da Alemanha (DBK).

Embora exista uma tradição centenária para o refúgio eclesiástico, não há base legal para ele. Não existe lei ou obrigação formal impedindo o Estado e as autoridades de agirem dentro das paróquias.

No entanto, esta prática é tolerada até agora, tacitamente, mas vem sendo duramente criticada por políticos à medida que o número de casos aumentam. No fundo está a questão sobre o quanto o Estado alemão tem que ser consequente na deportação dos requerentes de refúgio que não tiveram seu pedido aceito através do procedimento oficial.

A questão requer tato, porque está na fronteira entre a lei, princípios humanitários e a credibilidade da política do Estado. É por isso que números divulgados recentemente provocaram um debate controverso na Alemanha.

De acordo com estatísticas do Departamento Federal para Migração e Refugiados (Bamf), paróquias descumpriram regras processuais essenciais em cerca de metade de um total de mais de 2,5 mil casos de refúgio eclesiástico entre o início de 2017 e meados de 2018 – deixando de encaminhar às autoridades documentos justificando detalhadamente por que motivo um pedido de refúgio que já foi rejeitado deve ser reconsiderado. Sob essas condições, o Bamf se dispõe a reexaminar o caso.

Esse processo foi acordado em fevereiro de 2015 entre autoridades eclesiásticas e estatais para aumentar a transparência de refúgios eclesiásticos. Agora surgem acusações de que essa prática voluntária tem sido subvertida por paróquias demais.

Jüsten afirma que a Igreja Católica tem interesse de que haja um "bom entendimento" com as autoridades, e que, por isso, a Conferência dos Bispos da Alemanha está empenhada em fazer com que a documentação dos casos seja encaminhada corretamente às autoridades de migração.

"Respeitamos as regras"

Thomas Jeutner, pastor luterano em Berlim, tem dificuldades em acreditar nos números divulgados pelo Bamf. Sua paróquia já concedeu refúgio em 14 casos. Atualmente, três pessoas estão sob seus cuidados. Ele diz que sempre encaminha os documentos necessários ao processo, mas também admite saber de outras paróquias nas quais, por razões pragmáticas, as regras foram deliberadamente ignoradas ou contornadas.

Entretanto, o religioso ressalta que não conhece tais casos em sua diocese. "Nós nos atemos às regras para a segunda chance", ressalta Jeutner, acrescentando que possíveis abusos em paróquias individuais são um lado da moeda que não deve ser ignorado.

O Ministério alemão do Interior voltou a alterar recentemente as regras para o refúgio eclesiástico. Desde 1° de agosto, os refugiados podem ser deportados para o Estado-membro da União Europeia (UE) por onde entraram pela primeira vez no território do bloco, mesmo após 18 meses. Anteriormente, havia um prazo de apenas seis meses. Depois que o prazo expirasse, quem deveria se responsabilizar pelo refugiado era o Estado em que ele estivesse.

Para Christian Weisner, porta-voz do movimento de reforma na Igreja católica Wir sind Kirche (Somos a Igreja), o novo regulamento é um acirramento injustificado, que só mostra quão pouco racional e pouco realista são as regras atuais da UE.

"Dados os níveis muito baixos de refúgio eclesiástico, seria muito lamentável se o Estado restringisse ainda mais esse importante sinal cristão de garantia de refúgio", disse à agência de notícias DPA.

Caso as autoridades de migração voltem a recusar o refúgio após um reexame do caso, os refugiados são obrigados a deixar as paróquias. Estima-se, no entanto, que o refúgio eclesiástico evite que os migrantes sejam enviados de volta a outros países da UE em mais de 90% dos casos.

Um acirramento por parte do Ministério do Interior contra o refúgio eclesiástico neste momento poderia, portanto, ser parte da estratégia para aumentar o número de deportações.

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