Sobrevivente do Holocausto alerta contra nacionalismo crescente
Em discurso no Bundestag, historiador Saul Friedländer afirma que xenofobia e antissemitismo preocupam mundo afora. Ele pede que Alemanha continue lutando por tolerância, inclusão e pela "verdadeira democracia".O historiador e sobrevivente do Holocausto Saul Friedländer alertou contra uma crescente tendência nacionalista mundo afora e uma ressurgência do antissemitismo ao discursar no Bundestag (Parlamento alemão) nesta quinta-feira (31/01), durante cerimônia em memória das vítimas do nazismo.
O Bundestag costuma marcar com uma sessão especial o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto, celebrado em 27 de janeiro, data em que o campo de concentração nazista de Auschwitz foi libertado por tropas soviéticas em 1945.
Diante de um plenário lotado – com a presença da chanceler federal alemã, Angela Merkel, e do presidente do país, Frank-Walter Steinmeier –, Friedländer classificou o atual ódio contra judeus de "irracional como sempre foi".
Ele disse haver antigas e novas teorias da conspiração circulando, sobretudo entre extremistas de direita, enquanto "a esquerda antissemita" ataca a política de Israel "obsessivamente", colocando a existência do Estado em questão.
"É claro que é legítimo criticar o governo israelense, mas a ferocidade e a dimensão das críticas são absurdas e contêm um traço de antissemitismo velado", afirmou.
"O antissemitismo é apenas um dos flagelos que agora se infiltram numa nação após a outra. A xenofobia, a tentação de práticas autoritárias de governo e especialmente um nacionalismo cada vez maior estão em alta em todo mundo de maneira preocupante", disse.
O historiador afirmou esperar que a Alemanha tenha a "firmeza moral necessária para continuar lutando por tolerância e inclusão, humanidade e liberdade, em suma, por uma verdadeira democracia".
O historiador de 86 anos, que cresceu em Praga na década de 1930, relembrou a fuga da sua família para a França e como ele foi escondido em um colégio interno católico. Friedländer fugiu da escola e foi de encontro a seus pais, que tentavam se esconder em um hospital.
"Eles tiveram que me enviar de volta [ao internato]", disse. "O que eles devem ter sentido ao ver como seu pequeno garoto, que se defendia com unhas e dentes porque queria ficar com eles, era retirado do quarto deles? Foi nosso último encontro."
Os pais de Friedländer, que na época tinha nove anos, cruzaram a fronteira com a Suíça em setembro de 1942 com grupo de 15 judeus, mas foram descobertos pela polícia e presos. Em novembro daquele ano, foram deportados para Auschwitz.
"Pergunto-me se os meus pais estavam juntos durante os três dias dessa viagem infernal. Caso sim, o que terão dito um ao outro? E o que devem ter pensado? Saberiam o que os aguardava?", questionou.
Logo na chegada, 639 deportados foram levados para a câmara de gás. Friedländer acredita que seu pai tenha estado entre eles, já que andava fraco e doente. Sua mãe provavelmente ficou viva por volta de três meses trabalhando como escrava. Apenas quatro dos cerca de mil judeus transportados com os pais de Friedländer sobreviveram ao Holocausto.
Aos dez anos, Friedländer foi convertido ao catolicismo e recebeu o nome de Paul-Henri-Marie Ferland. Ele afirmou que, depois da resistência inicial e de um longo período doente, acabou se adaptando e se tornou uma criança piedosa e obediente.
O historiador se mudou para Israel cinco semanas após a fundação do país, em junho de 1948. "Para judeus como eu – e para judeus em toda parte, que precisavam e ansiavam por seu próprio país, a criação [de Israel] era uma necessidade vital", disse.
O historiador foi aplaudido de pé ao final de seu discurso. Autor do livro de dois volumes A Alemanha Nazista e os Judeus, Friedländer acabou se tornando um dos historiadores especializados no Holocausto mais famosos do mundo. O escritor recebeu o Prêmio Pulitzer, o Prêmio Israel e o Prêmio da Feira Literária de Leipzig, entre outros.
A sessão especial do Parlamento alemão desta quinta-feira também incluiu um pronunciamento de abertura do presidente do Bundestag, Wolfgang Schäuble. Ele afirmou que o respeito pela dignidade de cada pessoa foi uma das principais lições aprendidas depois das perseguições realizadas pelo regime nazista.
Schäuble acrescentou ainda considerar "vergonhoso" que judeus vivendo na Alemanha na atualidade reportem ocorrências de antissemitismo e que cada vez mais deles desejem deixar o país.
A plateia no Bundestag incluiu membros do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD), assim como o embaixador dos Estados Unidos, Richard Grenell.
PJ/dpa/ots
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O Bundestag costuma marcar com uma sessão especial o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto, celebrado em 27 de janeiro, data em que o campo de concentração nazista de Auschwitz foi libertado por tropas soviéticas em 1945.
Diante de um plenário lotado – com a presença da chanceler federal alemã, Angela Merkel, e do presidente do país, Frank-Walter Steinmeier –, Friedländer classificou o atual ódio contra judeus de "irracional como sempre foi".
Ele disse haver antigas e novas teorias da conspiração circulando, sobretudo entre extremistas de direita, enquanto "a esquerda antissemita" ataca a política de Israel "obsessivamente", colocando a existência do Estado em questão.
"É claro que é legítimo criticar o governo israelense, mas a ferocidade e a dimensão das críticas são absurdas e contêm um traço de antissemitismo velado", afirmou.
"O antissemitismo é apenas um dos flagelos que agora se infiltram numa nação após a outra. A xenofobia, a tentação de práticas autoritárias de governo e especialmente um nacionalismo cada vez maior estão em alta em todo mundo de maneira preocupante", disse.
O historiador afirmou esperar que a Alemanha tenha a "firmeza moral necessária para continuar lutando por tolerância e inclusão, humanidade e liberdade, em suma, por uma verdadeira democracia".
O historiador de 86 anos, que cresceu em Praga na década de 1930, relembrou a fuga da sua família para a França e como ele foi escondido em um colégio interno católico. Friedländer fugiu da escola e foi de encontro a seus pais, que tentavam se esconder em um hospital.
"Eles tiveram que me enviar de volta [ao internato]", disse. "O que eles devem ter sentido ao ver como seu pequeno garoto, que se defendia com unhas e dentes porque queria ficar com eles, era retirado do quarto deles? Foi nosso último encontro."
Os pais de Friedländer, que na época tinha nove anos, cruzaram a fronteira com a Suíça em setembro de 1942 com grupo de 15 judeus, mas foram descobertos pela polícia e presos. Em novembro daquele ano, foram deportados para Auschwitz.
"Pergunto-me se os meus pais estavam juntos durante os três dias dessa viagem infernal. Caso sim, o que terão dito um ao outro? E o que devem ter pensado? Saberiam o que os aguardava?", questionou.
Logo na chegada, 639 deportados foram levados para a câmara de gás. Friedländer acredita que seu pai tenha estado entre eles, já que andava fraco e doente. Sua mãe provavelmente ficou viva por volta de três meses trabalhando como escrava. Apenas quatro dos cerca de mil judeus transportados com os pais de Friedländer sobreviveram ao Holocausto.
Aos dez anos, Friedländer foi convertido ao catolicismo e recebeu o nome de Paul-Henri-Marie Ferland. Ele afirmou que, depois da resistência inicial e de um longo período doente, acabou se adaptando e se tornou uma criança piedosa e obediente.
O historiador se mudou para Israel cinco semanas após a fundação do país, em junho de 1948. "Para judeus como eu – e para judeus em toda parte, que precisavam e ansiavam por seu próprio país, a criação [de Israel] era uma necessidade vital", disse.
O historiador foi aplaudido de pé ao final de seu discurso. Autor do livro de dois volumes A Alemanha Nazista e os Judeus, Friedländer acabou se tornando um dos historiadores especializados no Holocausto mais famosos do mundo. O escritor recebeu o Prêmio Pulitzer, o Prêmio Israel e o Prêmio da Feira Literária de Leipzig, entre outros.
A sessão especial do Parlamento alemão desta quinta-feira também incluiu um pronunciamento de abertura do presidente do Bundestag, Wolfgang Schäuble. Ele afirmou que o respeito pela dignidade de cada pessoa foi uma das principais lições aprendidas depois das perseguições realizadas pelo regime nazista.
Schäuble acrescentou ainda considerar "vergonhoso" que judeus vivendo na Alemanha na atualidade reportem ocorrências de antissemitismo e que cada vez mais deles desejem deixar o país.
A plateia no Bundestag incluiu membros do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD), assim como o embaixador dos Estados Unidos, Richard Grenell.
PJ/dpa/ots
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