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Em livro que vai virar filme, ex-executiva denuncia sexismo em Wall Street

28/02/2016 10h00

Lara Malvesí.

Nova York, 28 fev (EFE).- A ex-executiva do falido banco Bear Stearns, Maureen Sherry, denunciou no livro "Opening Belle" a misoginia em Wall Street, onde "durante décadas, centenas de mulheres saíram prejudicadas e humilhadas com um cheque em troca de seu silêncio".

Em entrevista à Agência Efe, Sherry explicou que as empresas do setor se blindam contra os processos por discriminação através da cláusula U4, que obriga os empregados a resolverem internamente qualquer queixa e que são obrigados a assinar junto com seus contratos nos principais bancos.

Sherry, que deixou os bancos de investimento em 2008, coincidindo com a aquisição dos restos do Bear Stearns pelo JP Morgan Chase, relatou em "Opening Belle" parte de suas experiências e de outras mulheres que trabalham em Wall Street.

"Não só todas as histórias são reais como muitas delas estão adocicadas", declarou a autora.

O roubo constante de suas ideias por seus companheiros homens, os pedidos de reuniões que os chefes entendiam como um convite para um encontro e a ascensão baseada no físico e não nos méritos são alguns dos casos mais comuns em Wall Street, segundo Sherry.

A escritora também lamenta que mulheres que deram tudo pela empresa e que não tiveram filhos nem relações duradouras veem com frustração como nunca conseguem subir fora de áreas como marketing e recursos humanos.

"Não houve nunca uma mulher diretora-executiva (CEO) em Wall Street. Nunca na história", ressaltou.

"As humilhações sobre a mulher continuam também quando se é mãe", contou Sherry, que, embora nunca tenha deixado de responder e-mails durante as poucas semanas que tirou após o parto, descobriu que suas contas tinham sido distribuídas entre outras pessoas à sua volta.

"Na mesma época, um companheiro teve um acidente e ninguém tocou em nada de sua pasta, nem em suas comissões, embora tenha demorado mais do que eu a voltar ao trabalho", exemplificou.

"É como se em Wall Street ninguém acreditasse que você possa continuar fazendo um bom trabalho e também ser mãe", afirmou.

"Ainda por cima, quando voltei, tive que aguentar meus companheiros mugindo quando passava cada vez que ia ao banheiro para tirar leite", disse Sherry, que descreveu o ambiente do pregão nova-iorquino e dos bancos de investimento como "um grande campus universitário condescendente com as condutas machistas".

"Nestes ambientes abertos, sem paredes, nem escritórios, as pessoas ganham muita familiaridade com as outras, e em parte é divertido, mas por outro lado esse excesso de confiança termina com gente que sai prejudicada", ponderou.

"Respira-se um coquetel de grande ambição e testosterona no ambiente, com grande excitação pelo dinheiro dos bônus", acrescentou.

A protagonista do livro, Belle McEllroy, participa da criação - como ocorreu também na vida real - do grupo "Glass Ceiling Club" (Clube do Teto de Vidro) de mulheres com vontade de mudar essas dinâmicas em Wall Street.

"Existem poucas experiências assim de solidariedade feminina", afirmou Sherry, que ao ser perguntada se acredita que uma mulher na presidência dos Estados Unidos poderia mudar as coisas, se limitou a responder que "nós, mulheres, infelizmente não nos caracterizamos por ajudar umas às outras".

Sherry, nascida e criada no bairro nova-iorquino do Bronx, é americana de primeira geração. Seu pai, irlandês, trabalhou como porteiro em Nova York de um edifício no qual viviam vários altos executivos de Wall Street.

Anos mais tarde, após se formar na Universidade de Cornwell, a autora conseguiu um contracheque de mais de US$ 1 milhão por ano no Bear Stears.

"Assim é este mundo. A desregulação total, a lei da selva, que tem coisas boas e ruins. Em Wall Street, um pode entrar e ganhar muito dinheiro em pouco tempo. O sonho americano", comentou.

"Neste mundo as empresas realizam a ambição sem limites. Meu chefe costumava dizer que contratava menos pessoas com um MBA (título de mestrado em administração de negócios) e mais com perfil PSD (sigla em inglês para pobre, pronto e determinado a ganhar dinheiro)", completou.

O livro "Opening Belle" já teve seus direitos cinematográficos vendidos, mas ainda não tem data de estreia. A atriz americana Reese Witherspoon foi a primeira a se interessar a adaptá-lo ao cinema. EFE

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