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Saída para reduzir gasto público com campanha é doação de filiado a partidos, diz especialista

22/07/2021 12h59

Cientista político Geraldo Tadeu Monteiro critica fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões aprovado pelo Congresso brasileiro, mas acha que seria retrocesso permitir novamente contribuição de empresas.

Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

Em meio à maior crise sanitária enfrentada pelo país e a um desafio gigante na área econômica e social, com o crescimento da pobreza, o Congresso brasileiro triplicou o gasto público para financiar as próximas eleições, gerando um grande debate sobre o modelo que o país adotou desde 2016, a partir de decisão do Supremo Tribunal Federal.

O professor e coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) disse que o caminho é equacionar uma regra que incentive a participação dos filiados às legendas no custeio das atividades partidárias. "A ideia original era de que os partidos se auto financiassem pela contribuição de seus membros. Pouca gente sabe, mas no Brasil nós temos 17 milhões de pessoas filiadas a uma sigla. Se cada uma doasse R$10,00 por mês para manutenção dos partidos, teríamos R$ 170 milhões por mês, quase R$ 2 bilhões por ano. Dinheiro que não sairia da saúde, da educação, dos programas sociais. O problema é o nosso modelo e a nossa tendência de colocar tudo na conta do erário".

Para o analista político, o ideal seria criar um limite ao gasto público. "Eu acho que como em todo mundo nós poderíamos mesclar, termos um sistema misto. Um limite com dinheiro público para as campanhas, que garanta, por exemplo, um mínimo de igualdade de competição aos partidos menores, e o restante viria dos filiados. Também considero que a implantação do voto distrital misto ajudaria a reduzir muito o custo de uma campanha. Hoje um deputado se elege com voto de todo o estado. Imagine São Paulo, Minas, que têm muitas cidades, como sai caro o deslocamento desse político na campanha. Com a mudança, você teria um candidato focado mais na sua região e também aquele candidato de opinião, que disputaria o voto no estado todo."

Geraldo Tadeu Monteiro reconhece, no entanto, que os líderes partidários não parecem dispostos a abrir as siglas a uma maior participação da sociedade e que o caminho mais fácil para eles é colocar em lei um valor para financiar as campanhas com dinheiro de todo contribuinte. "Digo que temos hoje uma inanidade dos partidos, que são estruturas vazias e fechadas. Muitas vezes dominadas por uma família. Eles têm tempo de TV, acesso ao fundo partidário, ao fundo eleitoral e não é interessante aos líderes dessas siglas que o filiado contribua. Porque se fizer a doação, o filiado vai querer ter voz, ter espaço nas discussões internas".

O pesquisador da Uerj não teme que a discussão envolvendo o fundo eleitoral dê forças ao coro dos que pedem a volta das doações de empresas. "A população lembra o que veio à tona com o mensalão, com a Lava Jato, com aquela enxurrada de dinheiro de empresas. E pesquisas mostram que quanto mais dinheiro, mais chance de vencer", diz o especialista. "Então é o poder do dinheiro definindo as eleições. E várias outras consequências negativas, como o mandato parlamentar atrelado aos doadores. Então acho que se fizerem um levantamento vão ver que a população não quer o retorno desse modelo."

O presidente Jair Bolsonaro tem até o início do próximo mês para sancionar ou vetar a proposta de quase R$ 6 bilhões para o fundo eleitoral, numa encruzilhada entre seus apoiadores nas redes sociais e sua base política no legislativo. "Os políticos bolsonaristas dizem que são contra um fundo eleitoral tão caro assim, que são contra a velha política, que ninguém entendeu ao certo o que quer dizer isso. Mas na vida real, na prática, o que se vê é um pragmatismo. Todos os senadores e deputados, inclusive os que apoiam o governo, são a favor de um montante maior para as campanhas porque eles serão candidatos. Acho que Bolsonaro deve vetar alguns trechos e no fim prevalecer um valor mais palatável aos olhos da sociedade, talvez quatro bilhões. Aumentou-se muito para se chegar num valor mais aceitável", conclui.