Por que milhares de pessoas gritam 'Viva Putin' em meio a golpe militar no Níger
Milhares de pessoas se manifestaram no fim de semana em frente à embaixada da França em Niamey, capital do Níger, em apoio ao golpe militar que derrubou há cinco dias o presidente Mohamed Bazoum, eleito em 2021. Líderes africanos fizeram uma reunião de emergência na Nigéria para discutir sanções contra os golpistas. O presidente Emmanuel Macron declarou que irá "retaliar imediatamente", caso cidadãos e interesses franceses sejam atacados.
Enquanto alguns dos manifestantes insistiam em entrar na sede diplomática francesa, outros arrancaram a placa "Embaixada da França no Níger" e a pisotearam, antes de substituí-la por bandeiras da Rússia e do Níger.
"Viva Putin!", "Viva a Rússia!", "Abaixo a França!", gritavam os manifestantes, quatro dias depois do golpe militar perpetrado pelo general Abdourahamane Tiani, chefe da poderosa guarda presidencial, que se autoproclamou o novo líder do país. Tiani justificou o golpe pela "deterioração da situação de segurança" no país africano, assolado pela violência de grupos jihadistas.
Os manifestantes, incitados a sair às ruas pelos golpistas, criticaram instituições africanas, jogaram pedras na fachada da Embaixada da França e exigiram a saída das forças ocidentais do Níger. O protesto só terminou depois de uma intervenção da Guarda Nacional, que lançou bombas de gás lacrimogêneo para dispersar os manifestantes.
Em Paris, o presidente Emmanuel Macron declarou que "não irá tolerar qualquer ataque contra a França e seus interesses" no Níger. "Quem atacar cidadãos franceses, o Exército, diplomatas ou bases francesas verá a França retaliar imediatamente e de forma intransigente", diz uma nota publicada pelo Palácio do Eliseu.
Paris tem cerca de 1.500 soldados deslocados no Níger. Segundo o Ministério das Relações Exteriores francês, de 500 a 600 cidadãos de nacionalidade francesa se encontram atualmente no país africano.
"A França apoia igualmente todas as iniciativas regionais" que visem "o restabelecimento da ordem constitucional" e o regresso do presidente eleito Mohamed Bazoum, derrubado pelos golpistas. O Palácio do Eliseu também informou que Macron pôde conversar por telefone nas últimas horas com o presidente deposto e com seu antecessor. Ambos condenaram o golpe. Bazoum permanece sequestrado em sua residência dentro do Palácio Presidencial.
Cedeao se reúne para avaliar sanções
Quinze chefes de Estado da Comunidade Econômica da África Ocidental (Cedeao) se reúnem neste domingo em Abuja, na Nigéria, para discutir sanções contra a junta militar nigerina que mantém o presidente Bazoum detido em sua residência.
Antes do início da reunião, os golpistas, liderados por Tiani, disseram que a Cedeao estava prestes a realizar uma intervenção armada no país e advertiram contra qualquer operação desse tipo.
Os líderes presentes a esse encontro, que também envolve oito membros da União Econômica e Monetária da África Ocidental, podem suspender o Níger dessas instituições, cortar o acesso do país ao banco central regional e fechar suas fronteiras. O Chade, vizinho do Níger e não membro dessas entidades, participa como convidado.
O Níger recebe US$ 2 bilhões de ajuda pública ao desenvolvimento por ano, de acordo com o Banco Mundial. Depois do golpe, a União Europeia e a França suspenderam a cooperação financeira e de segurança com os militares no poder em Niamey.
Rússia amplia influência na região
As tensões na África estão cada vez mais no centro das disputas geopolíticas entre as grandes potências. França, Estados Unidos e União Europeia mantêm soldados em bases militares do Níger. Os contingentes ocidentais atuam em colaboração com as forças do Exército nigerino no combate aos jihadistas ligados às redes terroristas Al Qaeda e Estado Islâmico nesta instável região do Sahel.
Depois do Mali e do Burkina Fasso, o Níger, é o terceiro país da região a sofrer um golpe de Estado desde 2020.
Diante do magro balanço na luta contra os extremistas, as tropas ocidentais passaram a ser repudiadas por parte das populações locais. O aumento da criminalidade, erros militares que causaram mortes entre civis africanos, assim como abusos sexuais cometidos por alguns soldados das tropas estrangeiras, associados à grande pobreza nos países da região, nutriram um sentimento antiocidental.
Paralelamente, a Rússia foi incrementando sua influência no Sahel, assim como em outras nações do continente africano ricas em reservas minerais. Moscou ofereceu aos governos africanos que se distanciaram de europeus e americanos, vistos como colonizadores, serviços de segurança prestados pelos paramilitares do grupo Wagner.
O golpe militar no Níger é mais um episódio dessa batalha por influência na África.