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Em meio a evento na ONU, mulheres negras exigem de Portugal reparação por escravidão

19/04/2024 09h42

O Fórum Permanente para Pessoas Afrodescendentes - evento mais importante das Nações Unidas sobre a questão racial - termina nesta sexta-feira (19) em Genebra, na Suíça. O Brasil, país com a maior população negra fora do continente africano, marcou presença com uma comitiva liderada pela ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. Em paralelo, organizações de mulheres negras exigiram de Portugal medidas de reparação pela escravidão durante o período colonial no Brasil. 

Valéria Maniero, correspondente da RFI em Genebra (Suíça)

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Em um comunicado conjunto, seis entidades da sociedade civil, entre elas o Instituto Marielle Franco, manifestam repúdio "diante da ausência absoluta de posicionamento" de Lisboa sobre "medidas concretas de reparação à população negra brasileira pelos danos profundos causados pela escravização e o tráfico transatlântico, graves crimes contra a humanidade".

"A expansão portuguesa é indissociável da escravatura. É fundamental que Portugal - Estado que se beneficiou social, econômica, política e culturalmente de um sistema colonial de poder e da exploração negra - se responsabilize e ofereça respostas efetivas voltadas à memória, verdade, justiça, reparação e não-repetição", diz o texto, lembrando que durante o período escravocrata português, mais de 1 milhão de pessoas foram sequestradas de diferentes partes do continente africano e submetidas a diferentes formas de discriminação e violência.  

As organizações propõem algumas medidas, como criação de museus e centros de memórias que reconheçam os impactos da colonização sobre a população afro-brasileira, a inclusão no currículo escolar português da temática e acordos de colaboração com o Brasil e outros países colonizados por Portugal para promover a reparação com investimentos financeiros, da salvaguarda de memórias e de revisão dos pactos nacionalidade e trânsito entre os países. 

No Fórum de Afrodescendentes, autoridades e organizações civis do mundo todo se reúnem na ONU para discutir temas como discriminação, desigualdade racial, xenofobia, educação e justiça reparatória.

Pela terceira vez participando do evento - duas como integrante da sociedade civil e agora como integrante do governo brasileiro -, a ministra Anielle Franco celebrou o impulso de pautas relacionadas às populações negras nas instâncias internacionais. "Poder estar aqui conectando, ouvindo, apresentando nosso trabalho, entendendo o que tem sido feito também em outros países, em outros lugares, é extremamente importante", disse à RFI

"Eu acho que a gente sempre pode falar em avanço e conquista quando a gente tem um presidente que é eleito e que cria o Ministério da Igualdade Racial, que até então era uma secretaria; quando a gente tem a certeza de que a renovação da lei de cotas no ensino superior foi um outro grande marco", salientou. "Mas é óbvio que a gente tem que lutar sempre por mais. A gente ainda é um país que apresenta muitas desigualdades. Essa luta incansável do presidente de falar que tem que colocar o pobre no orçamento, de dar comida a quem tem fome é algo também que a gente está ali muito engajado, não só de pensar, mas de agir", frisou a ministra.

Reparação histórica e investimento

A deputada Daiana Santos, do PCdoB do Rio Grande do Sul, uma das parlamentares que integram a Bancada Negra da Câmara dos Deputados, ressalta que o fórum é um momento privilegiado de avaliação do caminho que ainda resta pela frente. "Podemos fazer uma conexão com as experiências que estão acontecendo em nível mundial e um comparativo dessas experiências, pensando, principalmente, na justiça social, mas também na reparação e investimento, afinal não existe política nenhuma que se execute sem investimento", salientou. 

"Essas articulações bilaterais foram importantes para o Brasil, pois nós pudemos nos conectar com uma série de outras entidades, organizações e parlamentares que fazem dos espaços onde atuam espaços de resistência, sempre pensando na emancipação e no investimento da população negra. Isso faz com que a gente retorne para o Brasil, além de estar motivado, ainda mais organizado, sistematizando essas ações para fazer esses movimentos acontecerem no território mais negro fora do continente africano", comentou a deputada. 

Renato Gomes, presidente do Instituto Luiz Gama, organização não-governamental que atua na defesa dos direitos humanos e em especial na luta contra o racismo, destacou a inclusão da arte no debate. Para ele, o evento está melhor a cada edição.

"A gente percebe isso com a presença da tradução em português neste terceiro fórum, coisa que não existiu nos dois fóruns anteriores. Foi uma reivindicação de toda a delegação brasileira, já que o Brasil é o país com a maior quantidade de negros fora da África e com a maior delegação nos fóruns", pontuou.

"Diversos assuntos haviam sido trazidos, a educação, o trabalho, a discriminação, a violência policial, mas a arte e a sua produção artística pelos afrodescendentes não havia ainda sido objeto de atenção por parte do fórum. E a gente trouxe essa discussão a partir da exposição 'Atlântico Vermelho'. Criamos essa cláusula para possibilitar inclusão desse tema tão importante na declaração final", disse.

No contexto da justiça reparatória, Gomes sublinha os debates sobre como serão criados os tribunais para julgar os crimes de racismo e discriminação racial, temas que ainda deverão ser aprofundados nas próximas edições do evento. 

 A Segunda Década dos Povos Afrodescendentes visará efetivar as garantias já conquistadas, como a inclusão dos afrodescendentes em uma educação antirracista, inclusiva e que permita a participação dessa população e a integração dela na sociedade "de uma maneira mais equilibrada" e com justiça social". 

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