Um ano após a morte do jovem Nahel por um policial na França, sentimento de revolta permanece nos subúrbios

Esta quinta-feira (27) marca um ano da morte em circunstâncias controversas de Nahel Merzouk, de 17 anos, após uma perseguição policial em Nanterre, região metropolitana de Paris. O jovem foi morto a tiros após uma blitz de trânsito no dia 27 de junho de 2023, em um caso que se tornou, para muitos, um símbolo da violência policial, desencadeando oito dias de tumultos em toda a França. 

Naquela manhã, a polícia perseguiu um veículo Mercedes com comportamento atípico. O carro era dirigido por Nahel, que não tinha carteira de motorista. Ele acabou ficando preso no trânsito.

Um vídeo filmado por uma testemunha mostra dois policiais na lateral do veículo, com armas apontadas para o motorista, e um deles atira enquanto o carro avança. Nahel é morto com uma bala no peito. Este vídeo contradiz a primeira versão policial, segundo a qual os agentes estavam posicionados em frente ao veículo. 

O autor dos disparos foi indiciado por homicídio doloso no dia 29 de junho e colocado em prisão preventiva por cinco meses, uma situação rara para um policial. Foram solicitadas diversas perícias no local. Uma análise de áudio a partir do vídeo também foi realizada com o objetivo de esclarecer o que os policiais gritaram ao adolescente. Porém, os exames não teriam produzido resultados conclusivos. 

Em maio passado foi organizada uma reconstituição do crime. Um dos objetivos era determinar se os agentes da polícia corriam perigo no momento do tiroteio.  

Na noite da tragédia, incidentes eclodiram em Nanterre, onde Nahel morava, e se espalharam para outras cidades dos subúrbios de Paris. Tiros de morteiros e confrontos foram registrados. Na manhã do dia 28 de junho, 40 veículos haviam sido queimados e cerca de trinta pessoas foram presas. 

Onda de violência

A acusação do agente policial por homicídio doloso e a sua prisão preventiva não restabeleceram a tranquilidade na região. Nos dias que se seguiram à morte de Nahel, Câmaras municipais foram queimadas, políticos foram alvo de ataques, lojas foram saqueadas. Ao todo, 45 mil agentes da polícia foram mobilizados para conter a onda de violência, que se espalhou para outras regiões da França e até para o exterior, com incidentes registrados na Suíça e na Bélgica. 

Em 3 de julho de 2023, ao final de oito dias de violência, o saldo era de duas mortes e mais de mil feridos, 2.500 prédios danificados e 672 comunidades afetadas, o dobro do que durante os motins de 2005 (que aconteceram após a morte de dois jovens que tentavam escapar de uma batida policial), segundo uma investigação parlamentar.  

Continua após a publicidade

O perfil dos participantes era muito jovem, 60% deles réus primários, sendo um terço menores de idade e com múltiplas motivações. Menos de 10% dos detidos justificaram a sua participação pela morte de Nahel ou pelo desejo de contestar a ação da polícia.

No total, cerca de quarenta investigações foram confiadas à Inspeção-Geral da Polícia Nacional, a IGPN, por violência policial durante os motins. Entretanto, "as investigações avançam muito lentamente", explica o advogado Arié Alimi, que defende várias vítimas. 

A revolta ainda é grande 

Na cidade de Asnières-sur-Seine, alguns quilômetros ao norte de Nanterre, a raiva latente explodiu na ocasião da morte de Nahel. Muitos jovens quiseram expressar o seu forte sentimento de abandono.  

Um ano depois, esta raiva nos bairros do norte da capital francesa ainda existe. O bairro Mourinoux ainda guarda vestígios dos protestos violentos. O tribunal administrativo foi incendiado em 29 de junho de 2023. "Ainda temos ruas queimadas, os Correios não foram reabilitados com porta corta-fogo", lamenta Zouhair Ech Chetouani, morador de Asnières.  

Para ele, a morte de Nahel foi a gota d'água que fez transbordar a raiva suburbana. "Quando falamos com os jovens, quando lhes perguntamos de onde vem esse sentimento, eles nem falam do Nahel, mas principalmente da falta de estrutura nos bairros, da falta de atividades", diz ele. "A única resposta que foi dada pela Câmara Municipal foi uma resposta policial", acrescenta.  

Continua após a publicidade

Para Zouhair Ech Chetouani, desde junho de 2023, nada mudou em Asnières. Ele então teme que as próximas revoltas sejam ainda mais violentas. 

Deixe seu comentário

Só para assinantes