Pressão de Blinken no Oriente Médio pode favorecer cessar-fogo em Gaza, em semana decisiva de negociações
Esta é uma semana decisiva para o conflito na Faixa de Gaza e talvez o único ponto sobre o qual todos os personagens políticos, países, grupos militares e radicais parecem concordar no Oriente Médio. A visita do secretário de Estado americano, Antony Blinken, à região é o símbolo da pressão dos Estados Unidos em busca de um acordo. O governo do presidente Joe Biden ainda acredita ser possível chegar a algum entendimento entre Israel e o grupo Hamas.
Henry Galsky, correspondente da RFI em Israel
Blinken chegou nesta terça-feira (20) ao Egito, onde participou de alguns encontros antes de viajar para o Catar, na batalha para a assinatura de um acordo de cessar-fogo na Faixa de Gaza. Na segunda-feira (19), o secretário de Estado americano se reuniu com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, durante três horas na tentativa de flexibilizar os posicionamentos do líder conservador. Segundo Blinken, o premiê concordou com o que foi apresentado e disse que não fará novas exigências. Em entrevista coletiva, o representante dos Estados Unidos disse que agora cabe ao Hamas aceitar a proposta.
A mensagem deixada pelo secretário americano foi direta: esta pode ser a última oportunidade de concluir um compromisso capaz interromper a guerra e libertar os reféns israelenses. Blinken uma vez mais se encontrou com os familiares das pessoas sequestradas pelo Hamas, entre os quais alguns que também têm cidadania americana, e disse a eles que é "possível chegar a um acordo em questão de dias" e que o "Catar está fazendo grande pressão sobre o Hamas e Yahiya Sinwar", o líder do grupo.
Do lado israelense, o impasse se concentra em questões que ainda precisam ser resolvidas de forma a chegar a posições que possam ser aceitas pelo Hamas: as exigências de Netanyahu sobre a presença de forças do país no Corredor Filadélfia e no Corredor Netzarim.
O Corredor Netzarim é uma estrada de terra construída por Israel durante a campanha militar atual com oito quilômetros de extensão e que divide a Faixa de Gaza entre norte e sul. O premiê israelense quer implementar um processo de verificação para impedir que homens armados se misturem à população civil quando houver a autorização de retorno dos palestinos deslocados ao sul para a região norte do enclave.
O Corredor Filadélfia tem cerca de 14 quilômetros de extensão e divide Gaza e Egito. Netanyahu quer manter a presença de tropas israelenses no local de forma a impedir a atividade no sistema de túneis. Segundo Israel, por meio desses caminhos subterrâneos o Hamas recebe armamentos contrabandeados do lado egípcio da fronteira. Tanto o Hamas como o Egito se opõem à presença israelense no local.
Sequência do processo de negociação
As negociações têm sequência no Egito. Na segunda-feira, uma delegação técnica de Israel esteve no Cairo, mas, segundo o canal catariano Al-Arabi, não houve progressos nas conversas. O Hamas rejeitou a oferta apresentada pelos mediadores sob o argumento de que "Netanyahu busca colocar novas condições e exigências de forma a prolongar a guerra".
A responsabilidade de Netanyahu sobre o fracasso das negociações neste momento não é uma acusação exclusiva do Hamas. Mesmo em Israel, uma nova pesquisa do Canal 12 mostra que 56% dos israelenses avaliam que o primeiro-ministro toma decisões sobre um acordo levando em consideração apenas seus interesses políticos.
"Quando o secretário de Estado americano disse que talvez esta seja a última oportunidade para um acordo, isso é um apelo a Netanyahu: não perca esta oportunidade, você os abandonou, é seu dever trazê-los de volta", escreveu em sua conta no X (ex-Twitter) o líder da oposição israelense, Yair Lapid.
Além disso, as próprias autoridades de segurança do país já haviam divulgado seu parecer técnico sobre o Corredor Filadélfia: a retirada dos soldados por seis semanas - período de duração planejado para a primeira fase do acordo - não seria um problema grave. Ou seja, o Hamas não teria capacidade de reestruturação militar significativa.
Segundo informações obtidas pela RFI, pela primeira vez há flexibilidade israelense em relação à presença de tropas do país no Corredor Filadélfia, inclusive a partir da implementação de alternativas tecnológicas. As negociações devem prosseguir no Cairo ao longo desta semana com as presenças de David Barnea, chefe do Mossad, o serviço secreto de Israel, e Ronen Bar, do Shin Bet, o serviço de segurança interno.
Neste momento, a dúvida diz respeito ao poder de convencimento dos mediadores sobre os dois atores principais: Israel e Hamas.
Netanyahu tem apoio interno para fechar acordo
Segundo apuração da RFI, ao contrário do que se imagina, hoje há maioria interna no governo israelense favorável a um acordo, a mesma situação é verificada no Gabinete de Segurança. Há duas personalidades, no entanto, que se opõem e que deixarão o governo no caso de qualquer acordo de cessar-fogo: o ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben Gvir, e o ministro das Finanças, Bezalel Smotrich. Se ambos deixarem o governo, a coalizão será desmantelada, resultando em novas eleições.
Uma das fontes disse à RFI que "Netanyahu não necessariamente é contrário a um acordo, mas quer um modelo em que seja possível manter a sua coalizão de pé", algo muito difícil de acontecer.
Além do governo, a sociedade apoia plenamente um cessar-fogo: segundo pesquisa do portal N12, 63% dos israelenses são favoráveis a um compromisso de paz. Entre aqueles que votam em partidos da oposição, são 85%. Mesmo entre os eleitores de Netanyahu, 44% apoiam a iniciativa.
O temor neste momento é que se o impasse prosseguir será difícil evitar uma escalada regional. O Irã e o grupo Hezbollah até ainda não atacaram Israel como resposta às ações israelenses a partir de grandes esforços diplomáticos e da presença militar dos Estados Unidos no Oriente Médio como poder de dissuasão. Não se sabe qual será o comportamento de ambos em caso de fracasso do processo de busca por um acordo.
Uma das avaliações obtidas pela RFI é que Israel acredita que o Hezbollah poderia estar à espera do revés nas negociações para executar um ataque em larga escala contra o território israelense. Esta ação poderia incluir o assassinato de figuras importantes do país, como militares de alta patente, ministros e membros do Knesset, o parlamento israelense.
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