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Romney aposta na amnésia dos norte-americanos para vencer Obama

O ex-governador de Massachusetts e pré-candidato republicano Mitt Romney discursa no Instituto Franklin em Filadélfia - Jae C. Hong/AP
O ex-governador de Massachusetts e pré-candidato republicano Mitt Romney discursa no Instituto Franklin em Filadélfia Imagem: Jae C. Hong/AP

Paul Krugman

24/04/2012 00h01

Até que ponto Mitt Romney acredita que nós somos estúpidos? Quem tem acompanhado a campanha dele desde o início provavelmente já formulou esta questão diversas vezes.

Mas a pergunta emergiu com uma intensidade especial na semana passada, quando Romney tentou transformar uma fábrica de paredes de gesso falida no Estado de Ohio em um símbolo de fracasso econômico do governo Obama. Sem dúvida a fábrica falida é um símbolo de fracasso, mas não da forma que ele deseja apresentá-la.

Primeiramente, vários repórteres observaram rapidamente um fato que Romney, por algum motivo, deixou de mencionar: o presidente dos Estados Unidos quando a fábrica foi fechada era George W. Bush, e não Barack Obama. Será que o comitê de campanha de Romney espera que os norte-americanos responsabilizem Obama pelos fracassos da política econômica do seu predecessor?

Sim, é isso o que o comitê de Romney espera. Romney fala constantemente sobre as perdas de empregos ocorridas durante o governo Obama. Mas toda a perda líquida de empregos ocorreu nos primeiros meses de 2009, antes que quaisquer políticas econômicas do novo governo tivessem tempo para surtir efeito. Portanto, o discurso de Ohio se constitui em um exemplo perfeito da maneira como a campanha eleitoral de Romney está apostando na amnésia, na esperança de que os eleitores não se recordem de que Obama herdou uma economia que já se encontrava em queda livre.

E como é que a campanha de Mitt Romney lida com aquelas pessoas que chamam atenção para a incômoda realidade de que toda a redução de emprego "provocada por Obama" ocorreu antes que as políticas deste tivessem surtido efeito? O argumento mais utilizado – que foi apresentado quando os jornalistas perguntaram a respeito do fechamento da fábrica – é que, ainda que Obama tenha herdado uma economia problemática, a esta altura ele já deveria ter resolvido esta situação. "A fábrica ainda está fechada devido ao fracasso das políticas de Obama em fazer com que a economia realmente voltasse a crescer", afirmou um assessor de Mitt Romney.

Na verdade, a fábrica provavelmente ainda estaria fechada mesmo se a economia estivesse apresentando um desempenho melhor. As paredes de gesso são utilizadas principalmente em novas residências, e embora a economia possa estar se recuperando, a bolha imobiliária da era Bush não está.

Mas esta escolha de mal gosto feita por Mitt Romney ao apresentar o exemplo da fábrica como propaganda junto à imprensa, ao acusar Obama de não estar fazendo o suficiente para promover a recuperação econômica, é um argumento melhor do que responsabilizá-lo pelos efeitos das políticas de Bush. No entanto, o argumento não é muito melhor, já que Romney está basicamente defendendo um retorno daquelas mesmas políticas implementadas por Bush. E ele está esperando que nós não nos recordemos do péssimo efeito daquelas politicas.

O fato é que a era Bush não apenas terminou em catástrofe; ela também começou mal. Sim, o histórico de governo de Obama no que se refere à geração de empregos tem sido desapontador – mas este histórico tem sido sem dúvida alguma melhor do que o de Bush em um período de governo comparável.

Isso é especialmente verdadeiro quando nos focamos nos empregos do setor privado. O índice de emprego médio durante o governo Obama tem se mantido baixo devido às demissões maciças de professores e de outros funcionários públicos dos governos estaduais e municipais. Mas o índice de emprego no setor privado recuperou quase todo o terreno perdido nos primeiros meses do atual governo. E isso é algo que pode ser comparado favoravelmente com a era Bush: em março de 2004, o número de empregos no setor privado ainda era 2,4 milhões menor do que o nível registrado quando Bush assumiu a presidência.

Mas onde é que todas essas demissões maciças de professores estão ocorrendo? Em grande parte em Estados controlados pelo Partido Republicano. Até 70% das perdas de empregos públicos têm ocorrido ou no Texas ou em Estados sob os quais os republicanos assumiram recentemente o controle.

E isso me faz lembrar de um outro aspecto da campanha da amnésia. Mitt Romney deseja que o eleitor atribua todos os problemas relativos à política econômica a partir de 2009 (e parte desses problemas ocorreram em 2008) ao homem que ocupa a Casa Branca, e que a população se esqueça do papel desempenhado pelos governos estaduais republicanos e do fato de Obama ter enfrentado uma política oposicionista de terra arrasada desde o seu primeiro dia na presidência. Basicamente, o Partido Republicano tem bloqueado todas as iniciativas do governo da forma mais intensa possível, e, a seguir, os republicanos se voltam para a população e responsabilizam o governo por não estar fazendo o suficiente para resolver os problemas.

Mas, então, estaria eu afirmando que Obama fez tudo o que podia, e que tudo estaria bem se ele não tivesse enfrentado essa oposição política? De forma alguma. Mesmo com todos os percalços políticos, o governo fez menos do que poderia e deveria ter feito em 2009, especialmente no que se refere ao setor imobiliário. Além do mais, Obama tem sido um participante ativo do deslocamento destrutivo das políticas de Washington que se distanciam da questão do desemprego para se concentrarem na redução do déficit.

E o governo tem sofrido continuamente de complacência – utilizando alguns meses de boas notícias como desculpa para cruzar os braços, vitorioso, em vez de enfatizar a necessidade de mais ação. Foi isso o que ele fez em 2010, em 2011 e, até certo ponto, é o que ele tem feito também neste ano. Portanto, esta é uma crítica válida que podemos fazer à forma como o governo está administrando a economia.

Mas não é essa a crítica que Mitt Romney está fazendo. Basicamente, ele está atacando Obama por não agir como se George W. Bush tivesse conquistado um terceiro mandato. Será que o povo norte-americano – e, talvez, principalmente a mídia – é tão esquecido assim para que esse ataque gere resultados? Eu creio que nós descobriremos em breve.