Democratas, republicanos e magnatas de Wall Street
Hillary Clinton e Bernie Sanders tiveram uma discussão sobre a regulamentação financeira durante o debate de terça-feira (13), mas não foi sobre se deveriam reprimir os bancos. Não, foi sobre quem tinha o plano mais duro. O contraste com republicanos como Jeb Bush ou Marco Rubio, que prometeram reverter até as reformas financeiras moderadas instituídas em 2010, não poderia ser maior.
Pelo que se viu, Clinton tinha uma tese melhor. Sanders tem se concentrado em restaurar a regulamentação Glass-Steagall, que separava os bancos de depósitos dos que fazem negócios mais arriscados. E repelir o Glass-Steagall foi realmente um erro. Mas não foi o que causou a crise financeira, que surgiu, na verdade, dos "bancos-sombras" como o Lehman Brothers, que não aceitam depósitos, mas podem de todo modo gerar o caos quando quebram. Clinton expôs um plano para refrear os bancos-sombras; até agora Sanders não o fez.
Mas a promessa de Clinton de assumir uma linha dura para a indústria financeira é verossímil? Ou se ela chegar à Casa Branca retomará as políticas de desregulamentação amigas dos financistas dos anos 1990?
Bem, se a atitude de Wall Street e suas doações políticas servem de indício, os próprios financistas acreditam que qualquer democrata, incluindo, é claro, Clinton, falariam sério sobre policiar os excessos de sua indústria. E é por isso que eles estão fazendo o possível para eleger um republicano.
Para compreender a política da reforma e regulamentação financeira, temos de começar reconhecendo que houve um tempo em que Wall Street e os democratas se davam muito bem. Robert Rubin, do Goldman Sachs, tornou-se a autoridade econômica mais influente de Bill Clinton, os grandes bancos tinham muito acesso político e a indústria, de modo geral, conseguiu o que queria, incluindo repelir o regulamento Glass-Steagall.
Esse relacionamento íntimo se refletiu nas contribuições de campanha, com a indústria de valores distribuindo suas doações mais ou menos igualmente entre os partidos e os fundos de investimento, na verdade, inclinando-se para os democratas. Mas então veio a crise financeira de 2008 e tudo mudou.
Muitos liberais sentem que o governo Obama foi leniente demais com a indústria financeira depois da crise. Afinal, os bancos renegados puseram a economia de joelhos, fazendo milhões de pessoas perderem seus empregos, suas casas ou ambos. Além disso, os próprios bancos foram socorridos, potencialmente com grande custo para os contribuintes (embora, no final, a despesa não tenha sido muito grande). Mas ninguém foi preso, e os grandes bancos não ficaram quebrados.
Mas os financistas não se sentiram agradecidos por escapar tão tranquilamente. Pelo contrário, ficaram e continuam consumidos pela "raiva de Obama".
Em parte, isto reflete sentimentos de mágoa. Segundo qualquer padrão normal, o presidente Barack Obama foi notavelmente restrito em suas críticas a Wall Street. Mas com a grande riqueza vem a grande mesquinharia: esses homens estão acostumados a uma deferência obsequiosa e receberam até comentários brandos sobre o mau comportamento de alguns dos seus como um insulto imperdoável.
Além disso, enquanto a lei de regulamentação financeira Dodd-Frank, aprovada em 2010, era muito mais fraca do que muitos reformistas desejavam, ela não foi ineficaz. O Escritório de Proteção Financeira do Consumidor mostrou-se altamente eficiente, e os subsídios aos "grandes demais para falir", na maior parte, parecem ter desaparecido. Isto é, as grandes instituições financeiras que provavelmente seriam socorridas em uma futura crise não parecem mais capazes de levantar fundos mais baratos que os pequenos atores, talvez porque as instituições "de importância sistêmica" hoje estão submetidas a regulamentações extra, incluindo a exigência de que reservem mais capital.
Embora isso seja boa notícia para os contribuintes e a economia, os financistas se ressentem amargamente de qualquer restrição a sua capacidade de jogar com o dinheiro alheio, e eles estão votando com seus carnês de cheques. Os magnatas financeiros se destacam no pequeno grupo de famílias ricas que está dominando as finanças de campanha neste ciclo eleitoral, um grupo que apoia majoritariamente os republicanos. Os fundos de investimento costumavam dar a maior parte de suas contribuições aos democratas, mas desde 2010 eles mudaram quase totalmente para os republicanos.
Como eu disse, essa doação tendenciosa é um indício de que os 'insiders' de Wall Street levam a sério as promessas democratas de reprimir os excessos dos banqueiros. E também significa que um vitorioso democrata não deveria muito à indústria financeira.
Se um democrata vencer, importa muito quem seja? Provavelmente não. Qualquer democrata provavelmente manterá as reformas financeiras de 2010 e tentará endurecê-las onde possível. Mas novas grandes reformas serão bloqueadas até que e a menos que os democratas recuperem o controle das duas Câmaras do Congresso, o que provavelmente não acontecerá por muito tempo.
Em outras palavras, embora haja algumas diferenças de política financeira entre Clinton e Sanders, em termos práticos elas são triviais, comparadas com o enorme abismo que os separam dos republicanos.
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