Obra de R$ 260 milhões para "maior aquário da América Latina" enfrenta resistência no Ceará
O Ceará quer ter o maior aquário da América Latina, mas, até a atração estar pronta para ser visitada, terá de superar obstáculos. O projeto "Acquário Ceará", que o governo do Estado quer ver funcionando em 2014 na praia de Iracema --antiga zona portuária e boêmia da capital cearense--, ao custo total de R$ 260 milhões, vem desde o início deste ano enfrentando resistência de um movimento chamado “Quem dera ser um peixe”, divulgado por redes sociais questionando a viabilidade e a regularidade do projeto.
Se concluído, o projeto Acquário Ceará terá 21,5 mil metros quadrados de área, 15 milhões de litros d’água em 38 tanques que exibirão 35 mil animais marinhos de espécies exóticas e nativas. Até pinguins deverão estar à vista do público, em ambiente climatizado, para protegê-los do calor. Ainda estão previstos no projeto quatro pavimentos de lazer, cinemas 4D e simuladores de submarino.
Os R$ 260 milhões estimados para a obra estão divididos em duas etapas. A primeira, referente à instalação do esqueleto de concreto, no valor de quase R$ 17 milhões, começou no último dia 7 de março. A segunda etapa deve começar ainda em 2012. Para esta , o governo do Ceará pediu dispensa de licitação e contratou a americana ICM Reynolds, que deverá receber dos cofres públicos os R$ 243 milhões restantes. Aí começaram os problemas.
Contra
A historiadora Andrea Saraiva, uma das representantes do movimento contra a instalação do Acquário Ceará, disse acreditar que é possível impedir a continuidade das obras. Segundo ela, a luta das cerca de 300 pessoas participantes do movimento é por transparência, controle social dos gastos públicos e prioridade das ações de governo.
No site do grupo, eles posicionam-se “contra a truculência dos grandes mercados do turismo e imobiliário em que poucos lucram e todos pagam a conta”. Acreditam ainda que o projeto não dialoga com o espaço urbano. Todos os sábados eles se reúnem no lugar onde será o Acquário para debater alternativas.
No último dia 29 de março, o governador Cid Gomes (PSB) saiu em defesa do projeto e explicou pela internet o objetivo do empreendimento para internautas. “Precisamos qualificar o turismo de passeio no Estado, e para isso é necessária a implantação de equipamentos. É nessa intenção que implantaremos o Acquário Ceará”, afirmou Gomes.
O secretário do Turismo do Ceará, Bismarck Maia, disse em nota que o projeto insere o Estado “no universo das grandes obras através de um equipamento específico, com características diferenciadas e difíceis de encontrar em outros lugares”. O governo assinou Termo de Cooperação Técnica com o Instituto de Ciências do Mar (Labomar), da Universidade Federal do Ceará (UFC), no último dia 22.
Licitação
O governo, que criou perfis em redes sociais --Facebook, Twitter e Formspring-- especialmente para divulgar dados do projeto, alega que a Reynolds teria “a capacidade superlativa de entregar, coordenadamente, todo o Acquário”. Segundo a Secretaria de Turismo do Estado, a empresa trabalhou em 215 dos 250 aquários do mundo. Esse fator daria credibilidade à obra.
Grande parte do investimento deve vir do Export-Import Bank, uma agência de crédito vinculada ao governo dos Estados Unidos. A previsão é de que o valor total do projeto seja pago em dez anos após o princípio das atividades. Para isso o governo diz esperar recepcionar 1,2 milhão de pessoas por ano.
O secretário de Turismo, Bismarck Maia, disse que o Acquário se pagaria socialmente, movimentando a economia local. A obra, entretanto, ainda não tem plano de negócios, considerado por especialistas como essencial.
Em denúncia protocolada junto a Ministério Público Estadual e Federal, além do Tribunal de Contas do Estado, o movimento “Quem dera ser um peixe” afirma acreditar que a falta de licitação é irregular neste caso.
Em e-mail enviado pelo grupo ao Export-Import Bank, eles explicam que “o contrato entre o governo e a ICM Reynolds não respeita a lei de compras públicas (lei 8.666) e está prejudicando a competição comercial”.
Além disso, reclamam que as exigências do banco – como o uso de 50% do dinheiro em produtos americanos – podem ter sido as responsáveis para o governo ter solicitado a extinção da licitação.
Vai ou não vai?
A construção, que deve ocupar o terreno onde anteriormente havia um prédio do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), recebeu da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace), no último dia 2 de março, a licitação de instalação, e as obras começaram.
Vinte dias depois, os trabalhos tiveram de ser suspensos, por recomendação do Ministério Público Federal (MPF). Integrantes do movimento antiaquário apontaram que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) fornecidos pelo governo e aprovados pela Semace não continham estudo arqueológico do solo, exigidos pela legislação ambiental.
Em reunião com a Semace, a superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Juçara Peixoto, afirmou que, mesmo diante de achados arqueológicos, a obra do Acquário não seria inviabilizada.
Antes de seguir para reuniões em Brasília, nesta semana, Juçara garantiu que o estudo poderia ser realizado concomitantemente aos outros trabalhos no local. Os operários retomaram as obras no último dia 14.
Contudo, o superintendente em exercício, Ramiro Teles, voltou atrás na decisão tomada por Juçara e disse que as obras deveriam continuar embargadas. O MPF recomendou, na manhã da última quinta-feira (19), assim como fez antes, que as obras fossem novamente suspensas.
O secretário de Turismo, em nota, determinou que a empresa responsável “abstenha-se de dar continuidade a qualquer atividade relacionada à execução do contrato”. Até o final de quinta-feira (19), quando a reportagem foi concluída, os trabalhos estavam suspensos.
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