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Governo propõe substituir lei de migração, aprovada na época da ditadura

Bruna Borges

Do UOL, em Brasília

29/08/2014 11h48Atualizada em 29/08/2014 12h29

O Ministério da Justiça apresentou nesta sexta-feira (29) um projeto de lei que revoga o Estatuto do Estrangeiro e propõe uma nova lei de migração no país. A proposta visa desburocratizar o processo de migração e considerar o tema uma questão de direitos humanos.

O estatuto, lei que está em vigor, foi aprovado durante a ditadura militar e é incompatível com a Constituição Federal e com tratados internacionais de direitos humanos.

“Nossa legislação é altamente atrasada em relação aos direitos do migrante. O Brasil precisa avançar nisso. Essa é a nova política do Estado brasileiro. Nosso objetivo é mandar o mais rápido possível essa proposta ao Congresso Nacional, será um marco normativo dos novos tempos do país”, disse o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça).

O novo texto foi elaborado por uma comissão com acadêmicos, membros do Ministério Público, juristas, cientistas políticos e especialistas em direitos humanos, direito internacional e direito constitucional.

A proposta de lei já foi submetida a críticas em duas audiências públicas e foi enviada à Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República e ao Ministério do Trabalho e Emprego e ao Itamaraty. O texto agora será analisado por um grupo de trabalho coordenado pela Secretaria Nacional da Justiça, vinculada ao Ministério da Justiça. O projeto definitivo após essa análise será encaminhada ao Congresso Nacional. A expectativa é que o processo de análise ocorra nos próximos seis meses para que o projeto já seja enviado para apreciação dos parlamentares no começo da próxima legislatura, segundo Paulo Abrão, secretário nacional de Justiça do MJ.

Para elaborar o projeto, a comissão ouviu, por cerca de um ano, migrantes e entidades que lidam com eles. Foi a primeira vez que eles foram consultados para a preparação de uma lei sobre o tema. Também foram ouvidos órgãos do governo, parlamentares, acadêmicos e entidades internacionais.

A boliviana Ruth Mendonza destacou a importância da aprovação do projeto. “Cheguei ao Brasil quando o boliviano só podia chegar aqui ou sendo médico ou sendo costureiro. Eu só poderia ser costureira, então voltei para Bolívia, depois voltei ao Brasil. Desde 2005, eu tentei fazer minha documentação e vi muita dificuldade. [Após] o acordo entre Brasil e Bolívia tanto no Ministério da Justiça quando a Polícia Federal a documentação tem sido agilizada. Eu acho que o Brasil é muito encantador, é muito acolhedor para o estrangeiro.”

Mudanças

Segundo o Ministério da Justiça, o texto encoraja a regularização migratória e torna o migrante menos vulnerável e com oportunidade de inclusão social. Também trata as pessoas que chegam ao país como migrantes e emigrantes, em substituição ao termo "estrangeiro".

O documento também propõe a criação de um órgão estatal centralizado para o atendimento aos migrantes, para entre outros serviços facilitar a regulamentação das pessoas. O país é um dos poucos do mundo que não possui um serviço especializado de migrações, de acordo com o Ministério da Justiça.

O novo texto prevê o direito à residência mediante o atendimento das condições da lei.

Outra modificação importante da proposta é a previsão da possibilidade de entrada no país para que o migrante procure emprego. Para buscar trabalho, o migrante precisa buscar o serviço consular de seu país e solicitar um visto dessa modalidade. Pela lei atual, sua entrada está obrigatoriamente vinculada à regularização migratória e ao emprego formal. Isso obriga o migrante a entrar a no país com visto de turismo, mas a mesma lei do estrangeiro veta a possibilidade de transformar este visto em visto de trabalho, obrigando a pessoa a deixar o Brasil e retornar para se regularizar.

Essa modificação tem impacto positivo na política de concessão de refúgio. Atualmente, muitos estrangeiros entram no país pedem refúgio, mesmo não tendo direito, apenas para permanecer no país em busca de trabalho. Esse é o caso dos haitianos que entraram em massa no Acre. Esse mecanismo atrasa o processo da concessão de refúgios a estrangeiros que realmente são perseguidos em seus países de origem e foram a obrigados a deixá-los. Com a nova lei, a tendência é que a fila de refúgio seja mais rápida, já que pessoas que chegam ao país em busca de emprego ganham um novo recurso.