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Agricultoras em MG querem trocar sol e enxada por carreira artística

Carlos Eduardo Cherem

Colaboração do UOL, em Belo Horizonte

09/10/2015 06h00

Um grupo de agricultoras de Noiva do Cordeiro, distrito do município de Belo Vale (MG), distante 110 km de Belo Horizonte, tenta consolidar uma carreira artística, enquanto mantém o trabalho na lavoura, de sol a sol.

No vilarejo célebre pela quantidade de mulheres --do cerca de 280 habitantes, aproximadamente 200 são mulheres, 50 são homens e 30 são crianças--, o grupo divide o seu tempo entre trabalhar na lavoura, diariamente, entre 5h30 e 17h, e ensaiar sua performance nos palcos durante uma hora, todas as noites.

Com a apresentação de um espetáculo de uma hora e dez minutos, dublando 11 músicas da cantora norte-americana Lady Gaga, o grupo comandado pela agricultora Keila Fernandes, 29, a Keila Gaga, cover da popstar, começou a reunir milhares de pessoas em municípios de Minas Gerais, sobretudo na região de Belo Vale.

O grupo fazia apresentações pequenas em municípios da região, que reúne algumas dezenas de pessoas, mas recentemente começou a participar de shows de outros artistas, que ampliaram a plateia e a visibilidade de Keila Gaga.

No início de setembro, o grupo abriu dois espetáculos do cantor sertanejo Eduardo Costa, em Bonfim (90 km de Belo Horizonte) e em Belo Vale.

Há três semanas, elas participaram da Virada Cultural de Belo Horizonte, apresentando um show para uma plateia estimada em 10 mil pessoas. “Na Virada foi o maior público que tivemos até agora. Isso nos animou muito. Foi um divisor de águas para o grupo”, diz Keila Gaga.

Tudo começou em 2011, com a internet

Em 2011, quando foi inaugurado o acesso à internet em Noiva do Cordeiro,  Keila, algumas tias, irmãs e primas vieram a conhecer Lady Gaga. “No meu caso, foi paixão à primeira vista”, diz Keila.

A agricultora começou a imitar a pop star e apresentar para os Fernandes -- 65 mulheres e 20 homens-- que moram no casarão da família

“Hoje, o grupo tem 13 mulheres e sete homens, mas todo dia entra mais uma. Até os meninos resolveram entrar e estão participando bastante”, diz a cover. As idades das garotas variam entre 18 anos e 31 anos.

“É o meu sonho. Poder sobreviver de música e dança. Mas, por enquanto, fica tudo [dinheiro] no caminho”, afirma Keila Gaga. “É muita gente, acaba ficando elas por elas nas apresentações”.

Noiva do Cordeiro, 35ºC

Diariamente, por volta de 5h30, Kombis pegam cerca de 80 agricultoras em Noiva do Cordeiro, a maioria com menos de 30 anos, para percorrerem algo entre três e cinco quilômetros até a lavoura.

Sem nuvens e com um sol abrasante, a média da temperatura na região nessa época do ano é de 35ºC. As agricultoras chegam a colher e embalar por dia cerca de 200 caixas, de aproximadamente 20 quilos, de pimentão, berinjela, vagem e abobrinha.

Por volta de 17h, as agricultoras voltam da roça. Em fila, tomam seus banhos e fazem a refeição coletiva no casarão dos Fernandes.

“Estou morta de cansaço. Queria largar a lavoura. Substituir pela carreira artística” afirmou Keila Gaga. “É claro que a lavoura tem seu lado bom. Eu gosto de trabalhar na terra, mas com esse sol é muito difícil. Hoje ficamos na colheita e o sol estava muito forte”.

Vânia Fernandes, 29, prima de Keila Gaga, foi uma das primeiras a se incorporar ao grupo, há quatro anos. “Nunca estudei, mas sempre gostei muito de dança e música. Acho que danço mais ou menos”, afirma a agricultora de Noiva do Cordeiro.

“Até que a agricultura não é muito pesada, a questão é o sol. O sol é muito”, diz Vânia.