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Sem neve, Brasil usa ciência para crescer em esportes de inverno

Stefano Arnhold

Especial para o UOL

10/03/2014 06h00

São gigantes os desafios para o desenvolvimento de esportes de neve em um país tropical como o Brasil. Mas obstáculos servem a nenhum propósito, exceto serem superados. Esse é o trabalho a que se propõe a Confederação Brasileira de Desportos na Neve (CBDN), iniciado em 1966 por amantes do ski, liderados pelo Sr. Domingos Giobbi, um ícone no esporte brasileiro.

A cada quatro anos as modalidades de ski e snowboard voltam a ficar em evidência em nosso país pela ocasião dos Jogos Olímpicos de Inverno. Em 2014, a XXII edição dos Jogos, realizada em Sochi (Rússia) entre os dias 7 e 23 de fevereiro, contou com participação histórica da delegação brasileira.

Feitos históricos

Além de participações inéditas nas principais competições no mundo, o Brasil lidera oito rankings latino-americanos e teve a maior delegação entre países da América do Sul em Sochi.

Contabilizados os atletas do bobsled e da patinação artística (administrados pela CBDG), o número de 13 representantes na competição, em sete diferentes modalidades, incluindo as inéditas vagas da patinação, do biathlon e do ski freestyle, é um recorde.

Feitos impensáveis para a realidade geográfica brasileira: predominância de clima equatorial-tropical, relevo planáltico e altitudes raramente superiores a 800 metros, combinação perfeita para a raríssima – e mínima – quantidade de neve no Brasil. Ao mesmo tempo em que levam os brasileiros a treinar no exterior, esses fatores elevam os custos de desenvolvimento do atleta brasileiro de ski ou snowboard.

Então, como o Brasil pode evoluir nos esportes na neve?

A CBDN aposta em três grandes pilares para vencer esses desafios: estrutura de gestão profissionalizada, talento do atleta brasileiro, e ciência aplicada ao esporte, com objetivos de, em médio-longo prazo, estabelecer-se como exemplo de excelência em gestão e conquistar resultados expressivos no cenário internacional.

O primeiro tem dirigido os esforços da confederação às pessoas que ali trabalham, procurando selecionar e manter talentos em cada área da entidade, dando oportunidade de crescimento e grandes metas. O mesmo se aplica aos atletas.

A CBDN aposta na realização periódica de clínicas, seletivas e competições para identificação de potenciais, que recebem orientação e apoio para seu desenvolvimento como atletas de alto rendimento. Acreditamos que o perfil do jovem brasileiro adequa-se muito ao do esportista de neve.

O terceiro pilar é o que realiza a conexão entre a gestão profissional e o atleta, e orienta o crescimento esportivo da entidade. Sempre em busca do modelo mais eficiente - técnica e financeiramente - para o desenvolvimento de suas equipes e atletas, a CBDN realiza estudos científicos aprofundados em cada modalidade. Detalhadamente, todos os fatores fisiológicos, técnicos e físicos são avaliados para que seja feita a melhor tomada de decisão de investimento.

Treinamentos no país

Um dos fatores levados em consideração é a possibilidade de desenvolvimento de fases do treinamento em território brasileiro, o que tem forte influência nos custos. Nesse sentido, a entidade desenvolve centros de treinamento para o freestyle (modalidades de componente acrobático), em São Roque (SP), parceira com o Ski Mountain Park, e para o endurance (modalidades de resistência), em São Carlos (SP), parceria com o Grupo Damha.

Periodicamente, os esportistas brasileiros de neve também passam por avaliações físicas nos principais centros de estudos científicos do país, fornecendo dados relevantes para a análise geral e individual do departamento técnico da CBDN. O investimento na ciência aplicada ao esporte não só tem contribuído para a melhora na gestão da confederação, como também permitiu que a entidade se destacasse no país no terreno científico, com trabalhos publicados e reconhecidos internacionalmente.

Feitos históricos

O Brasil é elogiado pela capacidade de produzir competições de alto nível durante o inverno do hemisfério sul

 

A ciência aplicada ao esporte está presente também nas áreas administrativas da confederação, que cria soluções personalizadas para as necessidades da entidade, através dos estudos e pesquisas.

No âmbito esportivo, a temporada passada contou com 43 atletas nacionais, que largaram 344 vezes em provas oficiais e se fizeram representar em 21 países diferentes. Nessas competições, somaram 72 medalhas internacionais conquistadas, além de 11 recordes brasileiros quebrados. Na última década, os brasileiros largaram em mais de 2.250 provas em todo o mundo.

Os mais recentes anos têm mostrado o crescimento do desporto de neve do Brasil, que é destaque no cenário continental. Além de participações inéditas nas principais competições no mundo, o Brasil lidera oito rankings latino-americanos e teve a maior delegação entre países da América do Sul em Sochi. 2014 também será o ano da primeira participação brasileira em Jogos Paralímpicos de Inverno, com dois representantes, fruto do trabalho conjunto entre CBDN e Comitê Paralímpico Brasileiro.

O reflexo em território nacional também é evidente. A pesquisa Muito Além do Futebol – Estudo Sobre Esportes no Brasil, da consultoria Deloitte Touche Tohmatsu, apontou os esportes de inverno como grande foco de interesse do público: 45% dos entrevistados responderam que gostariam de conhecer ou praticar alguma das modalidades.

Ademais, os esportes de neve crescem continuamente em horas de televisão no Brasil. Com mais de 150 horas acumuladas e 55 eventos transmitidos em programação nacional durante a temporada passada, as modalidades colocam-se em posição de destaque e acumulam mais de 140 milhões de espectadores. Em 2014, essas cifras serão largamente superadas.

Reconhecimento internacional

Ao passo que os números crescem dentro de casa, o Brasil já recebe reconhecimento internacional, sendo a primeira nação sul-americana a organizar um evento de Copa do Mundo de ski freestyle. O país é muito elogiado pela capacidade de produzir competições de alto nível durante o inverno do hemisfério sul, incluindo Copas do Mundo de snowboard e masters de ski alpino, e os principais eventos continentais dessas modalidades.

Desde sua fundação, a CBDN também assumiu postura ativa e atuante junto à Federação Internacional de Ski e União Internacional de Biathlon, com participação nas áreas técnicas das entidades, além de assento no mais alto fórum de decisão do Snowboard.

Os esportes de inverno no Brasil são cada vez mais realidade. Ainda que o caminho a se percorrer seja longo, os primeiros obstáculos já ficaram para trás e à frente vislumbramos um futuro promissor.

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