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Queda nos preços do petróleo acentua crise da indústria

Especial para o UOL

21/12/2014 06h00

A decisão do último dia 27 de novembro da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) - de manter em 30 milhões de barris diários a quota de produção dos países membros - oficializou a mudança da estratégia de mercado da entidade. O cartel decidiu não reduzir a produção, o que deverá manter as cotações do produto em níveis mais baixos que o observado na maior parte do período desde 2011.

Essa estratégia visa minar investimentos na expansão da oferta em países não membros, onde a produção, em geral, é mais custosa e exige preços mais elevados para se viabilizar. Com essa tática, a Opep espera que o ritmo de expansão da produção dos demais diminua no longo prazo, dando lugar a um patamar de preços mais elevado. As consequências da decisão da Opep, entretanto, não se restringem ao mercado de petróleo e trarão repercussões para a economia como um todo.

Particularmente, para o Brasil, um aspecto positivo da queda dos preços do petróleo no curto prazo (2 ou 3 anos à frente) é a redução do deficit da balança comercial do setor, que contribuirá para reduzir a necessidade de financiamento externo do país num momento de piora da conjuntura internacional e da percepção do risco Brasil. Considerando uma média de US$ 70 por barril de petróleo em 2015, essa redução deverá ficar próxima de US$ 4,5 bilhões.

Alguns segmentos da indústria nacional deverão se beneficiar da queda dos preços do petróleo. O destaque cabe à indústria petroquímica, que no Brasil é dependente da nafta e, por isso, perdeu competitividade com o aumento dos preços do petróleo na última década.

Paradoxalmente, a indústria sucroalcooleira é outro setor que deverá se beneficiar da queda dos preços do petróleo no curto prazo. Isto porque é pouco provável que o governo federal, controlador da Petrobras, reduza os preços domésticos da gasolina.

Opinião - Tendências

  • O recuo das cotações do petróleo e a perspectiva de que os preços em refinaria permaneçam estáveis não devem reduzir as pressões inflacionárias

    Arthur Viaro e Walter de Vitto, analistas da Tendências Consultoria, sobre a possível volta da cobrança da Cide

Apesar de no último mês os preços cobrados pelas refinarias da empresa no mercado doméstico terem superado os preços internacionais de referência, o governo deverá compensar as perdas auferidas pela Petrobras entre janeiro de 2011 e outubro desse ano, quando os preços internos foram mantidos abaixo dos parâmetros externos.

O elevado grau de endividamento e a maior dificuldade na obtenção de financiamentos por conta das investigações de corrupção na empresa são fatores que reforçam a percepção de que os preços domésticos da gasolina em refinaria não deverão sofrer redução. Assim, se os produtores de etanol (produto substituto da gasolina veicular) foram prejudicados nos últimos anos pela política de preços da Petrobras, nos próximos anos esse quadro deverá se inverter.

Do ponto de vista do consumidor, entretanto, o recuo das cotações do petróleo e a perspectiva de que os preços dos combustíveis em refinaria permaneçam estáveis não devem constituir em um fator de redução das pressões inflacionárias nos próximos anos, haja vista a expectativa de que o governo federal volte a cobrar Cide sobre a gasolina e o diesel comercializados no país.

O recuo dos preços domésticos destes combustíveis só ocorrerá no longo prazo, caso as cotações internacionais do petróleo permaneçam reduzidas e o real não sofra desvalorização acentuada.

Efeitos negativos

As principais repercussões negativas da redução das cotações do petróleo sobre a economia brasileira envolvem a queda da arrecadação de royalties e participação especial incidente sobre as receitas da atividade petrolífera, e a redução da atratividade dos investimentos em exploração e produção (E&P) de hidrocarbonetos.

Com o barril cotado a US$ 70 e considerando o aumento previsto para a produção, a queda das participações do Estado na renda do petróleo poderá superar os R$ 3 bilhões em 2015, ampliando o esforço fiscal (corte de gastos e aumento de impostos) necessário para o controle das contas públicas no próximo ano.

Pelo lado dos investimentos, a atratividade dos projetos de E&P no país diminui drasticamente quando o preço do barril de petróleo se aproxima da faixa de US$ 50 a US$ 60, patamar mínimo requerido para viabilizar a maioria dos projetos em águas profundas e ultraprofundas (incluindo as reservas do pré-sal).

De qualquer forma, a redução da geração de caixa da Petrobras resultante da queda do petróleo reduzirá o ritmo de exploração das reservas petrolíferas no país, produzindo reflexos negativos para a indústria naval e de bens de capital em geral e acentuando a crise vivenciada pela indústria nacional. Interrupções da produção de petróleo no curto prazo, entretanto, só ocorreriam com preços inferiores a US$ 30 por barril, já que o custo de extração no país situa-se abaixo desse valor.

Para o horizonte de mais longo prazo a queda das cotações do petróleo impactará a produção, que deverá ser menor que o anteriormente esperado, refletindo a redução do ritmo dos investimentos em E&P nos próximos anos. Tal quadro aponta para perspectivas menos favoráveis no longo prazo para a arrecadação de impostos e (em contraste com o curto prazo) para a geração de divisas do país.

Como se vê, o recuo dos preços internacionais do petróleo não é uma boa notícia para o Brasil, que terá de reduzir as apostas no setor petrolífero como alavanca para o crescimento da atividade econômica nos próximos anos.

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