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Belo Monte persegue cronograma, apesar de greves, protestos, boicotes e guerra midiática

Rodrigo Bertolotto

Do UOL, em Altamira (PA)

28/05/2012 06h01

Vicioso ou virtuoso, é um círculo:  a hidrelétrica construída para garantir energia a grandes minas de alumínio na Amazônia deu recentemente aos índios da região, como contrapartida para tentar compensar o impacto ambiental e social da obra, uma série de lanchas de... alumínio

A usina de Belo Monte se tornou a ponta visível do modelo de crescimento brasileiro, baseado na exportação. Inclua aí a venda de minérios, tendo como destino principalmente a China. O país mira na região norte e seu rico subsolo um trampolim para manter o atual crescimento econômico.

UOL visita obras de Belo Monte e confere impacto social

Com as desapropriações e as obras em ritmo acelerado, os confrontos se expandiram. No começo, era o tradicional embate dos interesses locais com os nacionais, e a típica queda de braço entre ambientalistas e desenvolvimentistas.

Depois virou uma batalha de informação e contrainformação. Atores da TV Globo e estudantes da Unicamp fizeram guerra de vídeos na Internet. Documentaristas pró e contra também se digladiaram: por um lado, o diretor canadense James Cameron filmou lá os extras de “Avatar” para criticar o empreendimento. Já a produtora LC Barreto, a mesma que fez o filme "Lula, o Filho do Brasil”, fez vários filmes com visão positiva do empreendimento, encomendados pela Norte Energia.

Com ações na Justiça, invasões dos canteiros de obra e protestos nas grandes cidades, os ativistas tentam barrar o financiamento propagandeando a ideia de os clientes individuais boicotarem os bancos que ajudem a bancar a construção do complexo hidrelétrico, ao lado do banco estatal BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento).

A proposta é que as pessoas encerrem suas contas em instituições bancárias que emprestem dinheiro para o empreendimento. A campanha aponta Banco do Brasil, Bradesco, Itaú e Santander como bancos que podem participar do custeio da obras, mas as quatro empresas negaram oficialmente participar do financiamento do projeto.

De qualquer forma, a Norte Energia, empresa responsável por Belo Monte, anunciou que em junho definirá o financiamento de longo prazo e espera que bancos privados participem afinal, o estatal BNDES, pode entrar com até 80% dos itens financiáveis do empreendimento.

A iniciativa mais recente é realizar um ciclo de debates e protestos chamado de “Xingu+23”, a ser realizado paralelamente ao encontro promovido pela ONU “Rio+20”. O ato acontece na vila de Santo Antônio, que foi parcialmente desapropriada pelas obras.

A principal obra do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) não foi parada pelo abaixo-assinado promovido pelos artistas da TV Globo. O governo recebeu o documento com mais de um milhão de assinaturas e procedeu da mesma maneira que com toda a correspondência recebida com críticas à hidrelétrica paraense (o tema recordista entre as cartas recebidas pelo palácio do Planalto).

O abaixo-assinado foi lido por algum subalterno da presidente Dilma Rousseff e arquivado. O boicote bancário deve ter efeito semelhante.

A pressão pública serve, contudo, para frear um pouco o ímpeto federal de construir hidrelétricas na Amazônia. Após muita mobilização das forças locais --índios, ribeirinhos, agricultores e ONGs--, o governo voltou atrás na intenção de construir uma série de usinas no rio Xingu, se comprometendo a só erguer Belo Monte em seu leito.

Mas o foco federal se voltou para outro rio. O projeto chamado “Complexo Tapajós” pretende construir cinco hidrelétricas no leito do rio paraense.

Como essas usinas estariam encravadas em território indígena, o governo chegou a apresentar a ideia inédita de “hidrelétrica plataforma” ou “hidrelétrica do bem”, com os trabalhadores entrando e saindo de helicóptero de lá como fazem em plataformas petroleiras.

ONDE FICA

“Isso não existe. É uma invenção, como se a usina caísse do céu. A construção tem um tremendo impacto, e não existe hidrelétrica sem cidade do lado”, criticou o padre Edilberto Sena em entrevista ao UOL. “Temos que continuar criticando Belo Monte para mostrar que podemos impedir essas outras hidrelétricas”, completa o ativista ambientalista.

Não faltam obstáculos no caminho de Belo Monte, a terceira maior hidrelétrica do mundo, só atrás de Três Gargantas (China) e Itaipu (Brasil-Paraguai). E os empecilhos  vão mais além das chuvas torrenciais da Amazônia neste período. Manifestantes já invadiram os canteiros e até interromperam a rodovia Transamazônica. E duas greves de trabalhadores paralisaram a construção até agora, tendo como consequência a demissão em massa dos grevistas.

“A obra está avançada justamente para compensar algum contratempo que aparecer”, afirmou Luiz César Moreira, diretor de Projeto do Consórcio Construtor Belo Monte. Moreira dirigiu também as obras da hidrelétrica de Jirau (Rondônia), cuja estrutura do canteiro de obras foi destruída pelos próprios trabalhadores em março de 2011.

“A única coisa que eu sabia quando assumi esse projeto é que seria um grande desafio, não só técnico, mas dos fatores externos, do entorno”, disse o diretor, que afirma que o governo teria que garantir mais segurança para sua maior obra.

A previsão é que, em cinco anos, o Pará ultrapasse Minas Gerais como o Estado líder na mineração. Atualmente, Minas Gerais produz 40% dos minerais extraídos no país, e o Pará, 20%. Até lá, Belo Monte já teve estar em pleno funcionamento e, espera-se, só com os benefícios que o governo federal e a Norte Energia prometem, e sem os malefícios que os ambientalistas prognosticam.