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Herbicida usado nas culturas de soja e cana causa câncer em ratos

O diuron é um herbicida amplamente utilizado nas culturas de soja e cana-de-açúcar no Brasil - Eduardo Knapp/Folhapress
O diuron é um herbicida amplamente utilizado nas culturas de soja e cana-de-açúcar no Brasil Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress

Do UOL

Em São Paulo

22/04/2013 11h42

Uma pesquisa realizada na Universidade Estadual Paulista (Unesp) identificou o modo de ação do diuron, um herbicida amplamente utilizado nas culturas de soja e cana-de-açúcar, que provocou câncer na bexiga de ratos.

Segundo o médico João Lauro Viana de Camargo, professor de patologia da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e coordenador do estudo, o trabalho mostrou que o diuron provoca necrose no revestimento da bexiga quando eliminado pela urina. Como resposta, o organismo gera novas células para substituir as áreas lesadas e essa proliferação, se mantida por muito tempo, acaba levando a erros nas sucessivas cópias do DNA, alguns deles predispondo ao câncer.

O potencial cancerígeno desse herbicida para a espécie humana já havia sido alertado pela United States Environmental Protection Agency (EPA), a agência de proteção ambiental do governo dos Estados Unidos.

O estudo brasileiro – que contou com a participação de pesquisadores da EPA e da Universidade do Nebraska (EUA), em um total de 25 profissionais envolvidos – confirmou o potencial cancerígeno do diuron para os ratos e mostrou que tal condição pode ocorrer mesmo com doses cinco vezes menores do que aquelas antes consideradas nocivas. 

De acordo com o pesquisador, a toxicidade do produto manifesta-se bem cedo, já no primeiro dia de exposição a altas doses. Se a exposição é interrompida, a bexiga volta ao normal. O problema existirá se as doses forem altas e a exposição mantida por longo tempo.

Outra observação feita durante os sucessivos estudos foi que, quando fornecido em doses relativamente altas para ratos, o diuron provoca toxicidade sanguínea. Nesse caso, o alvo predominante é o baço, órgão relacionado à imunidade e ao suprimento sanguíneo.

Outros agrotóxicos

O estudo sobre o diuron fez parte de uma pesquisa mais abrangente – o Projeto Temático “Praguicidas agrícolas como fator de risco” –, realizada com apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) de 2007 a 2012.

Além do diuron, os pesquisadores investigaram também os efeitos, em ratos e camundongos, de cinco praguicidas cujos resíduos foram encontrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no tomate à disposição da população brasileira.

Ratos machos, alimentados durante oito semanas com ração contendo aquela mistura de praguicidas em doses relativamente baixas, apresentaram o sistema hepático mais ativo. Isso sugere que os organismos dos animais estariam fazendo um esforço extra para se livrar das substâncias estranhas a que estavam sendo expostos. Mas a mistura não promoveu o desenvolvimento de câncer hepático em ratos que haviam sido tornados artificialmente predispostos a este tipo de doença.

No entanto, outro efeito preocupante foi constatado. Os ratos machos alimentados com a ração contendo os praguicidas apresentaram redução na mobilidade dos espermatozoides. “Este achado pode indicar o comprometimento da fertilidade dos animais”, disse Camargo à Agência Fapesp.

Seu cuidado em dizer “pode indicar”, e não “indica”, se deve ao fato de não terem sido verificadas alterações em outros parâmetros relacionados ao sistema reprodutor masculino, como os níveis dos hormônios sexuais e a produção diária de espermatozoides.

Alerta para autoridades e consumidores

Baseado no mesmo critério de prudência, Camargo evita extrapolar para o homem as descobertas feitas em ratos. “Embora os estudos experimentais baseiem-se na premissa de que animais de laboratório respondem aos insultos químicos da mesma maneira que os humanos – caso contrário, não haveria razão para serem realizados esses estudos experimentais –, a extrapolação dos resultados deve ser feita de modo criterioso e a relevância dos resultados assumida com cautela”, disse.

O professor ponderou que é preciso comparar os processos metabólicos e biológicos pelos quais as substâncias estudadas passam e provocam em cada espécie.

De qualquer forma, as descobertas constituem um alerta importante para autoridades sanitárias. E também para os consumidores. Pois, embora de forma ainda incipiente, a preocupação em consumir alimentos livres de resíduos químicos vem aumentando no Brasil.

Segundo dados divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, o mercado de produtos orgânicos cresce de 15% a 20% ao ano no país, abastecido por cerca de 90 mil produtores, dos quais aproximadamente 85% são agricultores familiares.

(Com Agência Fapesp)