Topo

"Amor à Vida" aborda barriga de aluguel, mas o que pode ou não no país?

Niko (Thiago Fragoso) e Eron (Marcello Antony) numa cena da novela conversando sobre ter filhos - Divulgação/TV Globo
Niko (Thiago Fragoso) e Eron (Marcello Antony) numa cena da novela conversando sobre ter filhos Imagem: Divulgação/TV Globo

Do UOL, em São Paulo

18/06/2013 07h00Atualizada em 18/06/2013 11h05

A novela das nove da Rede Globo, "Amor à Vida", está mostrando em seus primeiros capítulos o desejo e a dificuldade de um casal homoafetivo em ter filhos. O autor da trama, Walcyr Carrasco já adiantou que os personagens Niko (Thiago Fragoso) e Eron (Marcello Antony) irão utilizar o útero de uma amiga, Amarilys (Danielle Winits), para gerar o bebê após uma fertilização in vitro.

Na vida real, na ausência de leis sobre o tema no Brasil, a mais recente resolução, de maio deste ano, do CFM (Conselho Federal de Medicina), órgão que dita parâmetros éticos quanto aos procedimentos de reprodução assistida, ampliou as possibilidades de casais masculinos terem filhos. Mas, afinal, o que é permitido no país quando se fala em “barriga de aluguel”?

Anteriormente, era possível utilizar um útero de substituição, termo usado pelos médicos, somente de parentes de até segundo grau, ou seja, mães e irmãs. A nova resolução permite que parentes de até quarto grau, como tias, primas e sobrinhas gerem a criança. Mas e quando for uma amiga, como na trama?

“Essa possibilidade mostrada na novela até existe, mas é remota e difícil, tornando todo o procedimento muito complexo”, diz Paulo Gallo, especialista em reprodução assistida e diretor-médico do Vida – Centro de Fertilidade da Rede D’Or (RJ).

Ele lembra que, no caso de casais homossexuais masculinos, é necessário conseguir óvulos através de ovodoação anônima (de uma mulher que já esteja sendo submetida a um processo de reprodução assistida, uma vez que a doadora deve ter indicação de engravidar pela fertilização in vitro), utilizar o esperma de um dos parceiros, efetuar o procedimento de fertilização in vitro e transferir os embriões para o útero de substituição de um parente de um dos parceiros masculinos, de até quarto grau, como foi dito.

Walcyr Carrasco, por meio da assessoria de comunicação da TV Globo, afirmou que deixará claro que os atos da personagem Amarilys na trama, como usar seu óvulo ao invés de um doado, não condizem com as normas do país.

Sem lucros

A barriga de aluguel, por meio de transação financeira em troca da gestação, continua sendo proibida no Brasil. Por aqui, legalmente, não é possível obter lucros com aluguel de útero, nem doação de óvulos e sêmen, algo que ocorre em outros países. como os Estados Unidos.

“A amiga até poderá gerar a criança para o casal, mas para que isso seja feito de forma legal, será preciso uma autorização do CFM. Infelizmente, quando não se tem parentes tão próximos, como é o caso dos rapazes da novela, essa seria a solução. E a resposta dependeria do conselho. E, claro, tudo terá de ser feito de forma gratuita”, diz Arnaldo Schizzi Cambiaghi, especialista em reprodução humana e diretor do IPGO (Instituto Paulista de Ginecologia e Obstetrícia) de SP.

Quanto à doadora do óvulo, Cambiaghi reforça que todo o processo deve ser anônimo: “O correto é que a doadora e a receptora não tenham contato. A receptora, ou na novela, o casal, no entanto, terá acesso a informações como características físicas como cor da pele e cor da pele e grau de instrução, por exemplo”.

Paulo Serafini, médico especialista em reprodução assistida e diretor do Grupo Huntington, diz que a situação da novela não é comum, mas irá ficar: “Os casais homoafetivos masculinos irão optar cada vez mais pelos tratamentos. Como na trama, poderão justificar a opção pela amiga e recorrer ao CFM, que está mais ágil hoje em dia. O conselho pode negar o pedido, mas creio que isso só aconteceria só se encontrassem algo negativo sobre a moça ou sobre o casal”.

Sobre pagar pelo “útero”, Serafini acha que isso seria catastrófico como exemplo a ser seguido. Porém, lembra que isso é comum em outros países e que, futuramente, isso poderá ocorrer por aqui também. “Muitas coisas irão mudar”, admite.

Sêmen

Uma questão que levanta dúvidas é qual dos pais deve doar o sêmen. Esse ponto delicado deve ser decidido unicamente entre o casal, a não ser que um dos dois tenha problemas de infertilidade.

“O sêmen é colhido por masturbação, de preferência após um período de abstinência sexual de dois a cinco dias. E a coleta deverá ser feita em sala apropriada na clínica de fertilização in vitro.” complementa Maria Cecília Erthal, também diretora-médica da clínica Vida – Centro de Fertilidade da Rede D’Or.

Solteiras

"Embora a maior parte das mulheres que procura os tratamentos de infertilidade seja casada, nos últimos anos vem aumentando o número de mulheres solteiras que deseja ter filhos. Nestes casos, a única maneira de ficarem grávidas, será por meio do banco de esperma", conta Cambiaghi.

Como no caso dos óvulos, o sêmen é escolhido em um banco de doadores, anônimos, pois a identidade deles deve ser mantida em segredo, de acordo com as resoluções do CFM. Informações como origem étnica, cor da pele, cor dos olhos, cor e tipo de cabelos, peso, altura e compleição física, assim como a profissão e o nível de escolaridade, são disponibilizadas.

Entre mulheres

Nos casais formados por duas mulheres, uma delas poderá ter seu óvulo fecundado e ela mesma continuar a gravidez. Se preferir, o óvulo de uma delas pode ser introduzido no útero da parceira, para que as duas tenham participação no processo, de acordo com a nova resolução do CFM.

“Transferir o óvulo da parceira para que a gestação ocorra no útero da outra é uma decisão que cabe ao casal, não é necessário haver algum impedimento médico em uma das duas”, encerra Gallo.