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Consumo de gordura deve ser controlado, mas nunca abolido

Marina Kuzuyabu

Do UOL, em São Paulo

04/11/2013 07h00

Embora as gorduras tenham potencial para provocar doenças do coração, acidentes vasculares cerebrais (AVC), obesidade, hipertensão e uma série de outras complicações no organismo, elas não devem ser excluídas da dieta, mesmo por quem está de regime e precisa controlar o colesterol. Longe disso, elas devem ser consumidas diariamente. 

Gordura saturada não é tão vilã quanto se pensava

Getty Images
Muita gente abre mão da manteiga, da carne vermelha e dos queijos amarelos, e mesmo assim não fica imune às doenças cardiovasculares. A resposta para isso é que a indústria substitui as gorduras eliminadas dos alimentos por açúcares, para não prejudicar o sabor. É o que alerta Aseem Malhotra, um dos cardiologistas mais prestigiados do Reino Unido, em um artigo publicado no fim de agosto na revista médica "British Medical Journal".

Elas são fonte de energia para o corpo e fundamentais para a absorção de vitaminas e proteínas e também para a síntese de determinados hormônios sexuais, explica a nutricionista Lidiane Catalani Casanova, da Divisão de Nutrição e Dietética do Instituto Central (IC) do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

“Irregularidades menstruais e diminuição da libido são algumas das consequências negativas que a ausência dessas substâncias provocam no organismo”, acrescenta Lidiane Indiane, endocrinologista da Associação Diabetes Brasil (ADJ) e do Centro de Pesquisas Clínicas (Cpclin), ambos na capital paulista.

Isso não significa, porém, que a ingestão de gorduras está liberada. É preciso respeitar o limite recomendado. Em uma dieta de 2.000 kcal por dia, recomendada para um adulto saudável, entre 400 e 700 kcal (de 20% a 35% do total) devem vir das gorduras. Em termos mais práticos, isso se traduz em 44,5 g a 78 g, explicam a endocrinologista Claudia Chang, doutoranda em Endocrinologia e Metabologia pela Universidade de São Paulo (USP), e a nutricionista Fernanda Nicolau, pós-graduada em Nutrição Clínica pela Universidade Estadual Paulista (Unesp).

Desse total, 10% no máximo (menos que 22 g) devem ser provenientes das gorduras saturadas, destaca Casanova. Já as pessoas que têm colesterol alto, esse valor cai para 7%, de acordo com a 4ª Diretriz Brasileira Sobre Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia.

Saturadas x insaturadas

Portanto, para fazer boas escolhas é preciso diferenciar as gorduras saturadas das insaturadas. As vilãs são as primeiras. Elas são encontradas em alimentos de origem animal, principalmente em carnes vermelhas, pele de aves, creme de leite, manteiga e bacon. O azeite de dendê, muito usado na culinária baiana no preparo de acarajés, moquecas e outros pratos, o óleo de palma, presente em vários alimentos industrializados, como o chocolate e a margarina, o iogurte integral e o coco são outros que integram a lista. 

O consumo de queijos amarelos, gema de ovo e as frituras também devem ser feitos com atenção, pois esses itens também possuem gorduras saturadas, alerta Indiane. “Alimentos fritos ingeridos fora de casa podem ser ainda piores, pois frequentemente o óleo é reaproveitado pelos estabelecimentos”, diz a médica.

A lista é longa e formada ainda por alimentos aparentemente inofensivos.  “É o caso dos alimentos diet, que são livres de açúcar, mas muitas vezes ricos em gordura, que é empregada para melhorar a consistência do alimento”, informa a endocrinologista da ADJ. Os macarrões instantâneos, como o Miojo, se enquadram na mesma categoria. “Tem gente que não percebe, mas trata-se de uma massa frita”, acrescenta.

Por isso, a médica recomenda analisar atentivamente os rótulos nas embalagens para verificar quais ingredientes foram utilizados na elaboração do produto. 

Do ‘bem’

A gordura insaturada, por sua vez, é benéfica para o organismo, pois eleva o nível de lipoproteína de alta densidade no sangue (o HDL ou colesterol ‘bom’) e reduz o nível de lipoproteína de baixa densidade (o LDL ou colesterol ‘ruim’), explica a nutricionista do HC. Há duas subdivisões nesse grupo. A diferença está na estrutura química de cada uma: 

Monoinsaturadas: encontradas em produtos como azeite de oliva, óleo de canola, abacate, nozes, amêndoas, castanhas, entre outros alimentos.

Poli-insaturadas: presente nos óleos vegetais, como os de girassol, milho e soja, nos peixes gordurosos, a exemplo do salmão, atum, arenque e sardinha, nas sementes de abóbora e de linhaça, entre outros itens.

Quanto aos azeites e óleos listados acima, Indiane chama a atenção para o preparo. Eles não podem ser aquecidos a altas temperaturas, pois se tornam saturados. Por isso, se o produto for utilizado na cozinha, para refogar verduras ou qualquer outro alimento, por exemplo, tanto faz usar azeite ou óleo de soja, informa a médica. A sugestão então é reduzir a quantidade utilizada.

Embora tanto a gordura insaturada como a saturada desempenhem funções importantes no organismo, as primeiras devem ser privilegiadas à mesa. Além disso, Chang e Nicolau lembram que boa parte da gordura que ingerimos é feita de forma involuntária. Elas estão presentes em diversos alimentos, o que dispensa seu consumo isolado. 

A lista abaixo, elaborada pela dupla, mostra a quantidade de ácidos graxos insaturados que encontramos em algumas carnes, frutas, sementes e outros produtos:

Gorduras trans

Existe ainda a gordura trans, produzida industrialmente a partir de um processo químico chamado hidrogenação, esclarece Chang e Nicolau. É considerada prejudicial ao organismo por diminuir o colesterol ‘bom’ e aumentar o ‘ruim’. Alimentos industrializados, como biscoitos recheados, tortas, cremes, sorvetes, carnes processadas (hambúrgueres, nuggets e salsichas, por exemplo) e pipoca de micro-ondas são algumas de suas fontes.

Casanova lembra que essa gordura era consumida livremente até a década de 80, época em que estudos científicos revelaram seus malefícios. A ideia de que poderia se tratar um produto saudável, pelo fato de ter origem vegetal, foi encerrada ali. Segundo a especialista, o ideal é que seu consumo não exceda 1% das calorias totais na dieta de um adulto, embora a comunidade médica ainda não tenha chegado a um consenso sobre os limites de sua ingestão.