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Saber ou não? Teste genético que mostra se você terá Alzheimer cria dilema

Marty (à esq.) e Matthew Reiswig têm histórico familiar de mal de Alzheimer - Nick Cote/The New York Times
Marty (à esq.) e Matthew Reiswig têm histórico familiar de mal de Alzheimer Imagem: Nick Cote/The New York Times

Gina Kolata

Do New York Times

12/03/2016 06h00

Marty e Matt Reiswig, dois irmãos de Denver, Estados Unidos, sabiam que o mal de Alzheimer atacava sua família, mas nenhum deles entendia o porquê. Então um primo, Gary Reiswig, que mal conheciam, escreveu um livro sobre sua família, "The Thousand Mile Stare".

Quando os irmãos o leram, compreenderam o que os esperava. Na família Reiswig, o mal de Alzheimer não é uma ocorrência aleatória. É resultado de um gene que sofreu mutação e é passado de pai para filho.

Se você herdar o gene modificado, o Alzheimer surgirá por volta dos 50 anos - com absoluta certeza. Seu filho tem 50% de chance de ter o mesmo destino.

A revelação foi chocante, bem como a próxima notícia: os irmãos descobriram que existe um exame de sangue que pode revelar se um deles carrega o gene que sofreu mutação. Eles podiam decidir saber se o tinham ou não.

É um dilema que muitas pessoas estão encarando à medida que os cientistas descobrem mais mutações genéticas ligadas a enfermidades. Geralmente, o gene recém-descoberto aumenta o risco, mas não é uma garantia da doença.

Saber ou não saber

Às vezes, saber pode ser útil: se você tiver uma mutação genética que torna o câncer de cólon mais provável, por exemplo, então colonoscopias frequentes podem ajudar os médicos a protelar o problema.

Contudo, existem genes que transformam em certeza uma doença pavorosa: não existe jeito de preveni-la, nem como tratá-la.

Marty Reiswig, 37 anos, viu o pai, agora nos estágio finais do mal de Alzheimer, perdendo lentamente a capacidade de pensar, recordar, cuidar de si mesmo e até mesmo reconhecer a esposa e os filhos.

Marty sabe que se ele tiver o gene, talvez tenha um pouco mais de uma década antes do surgimento dos primeiros sintomas. Se ele tiver, os filhos também podem ter.

Ele ainda não sabe se fará o teste.

Às vezes eu penso: 'É uma tempestade horrível no horizonte que poderia nos devastar completamente, e eu quero saber se é real ou não.' Outras vezes é: 'Nossa, se eu souber que é real e que vou morrer desse jeito, provavelmente sabendo com que idade - é uma informação praticamente insuportável sobre o meu futuro'.

"As pessoas dizem que a gente poderia saltar de paraquedas ou montar em touro bravo, mas só dá para fazer essas coisas se você tiver tempo e renda. Ainda é preciso levantar pela manhã, trabalhar e pagar as contas."

Ele participou de um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade Washington, em St. Louis, no qual pesquisadores acompanham membros de famílias com os genes para o estabelecimento precoce do mal de Alzheimer. Em uma reunião recente, ele se viu em uma sala cheia de gente na mesma situação: todos tinham um dos pais com o gene da doença.

Todos corriam o risco de ter o gene modificado. Marty perguntou ao grupo quantos haviam feito o teste. Metade das pessoas levantou as mãos.

"Dos que fizeram o teste, quantos se arrependem?"

A resposta foi um silêncio sinistro. Então, um homem falou. Ele contou ter feito o exame e descoberto que tem o gene.

Quanto a se arrepender, "depende do dia", contou o sujeito. "Tenho enfrentado questões de peso e de suicídio, e tenho tido problemas com meu casamento desde que descobri. Tem dias que me arrependo muito. É um fardo enorme. Outros dias fico feliz em saber."

Vale o investimento?

Marty também pensou a respeito, e decidiu não fazer o exame.

"Para mim, o lucro não vale o investimento."

O irmão de 41 anos Matt, que mora na vizinhança com a esposa e cinco filhos, foi tomado pelo medo de possuir o gene modificado. Toda vez que perde a chave ou esquece um nome, pensa em Alzheimer.

"Eu já vivia aquilo todo santo dia, a cada momento achando que eu tinha. Eu não queria descobrir que tinha. Queria descobrir que não tinha." Ele decidiu fazer o exame.

"Para mim, é muito óbvio. Preocupar-se com a verdade é muito mais danoso e não muda as conclusões."

Além disso, saber a verdade "o livra de assumir hipóteses erradas".

Matt teve sorte: não possui o gene. Ele chorou quando recebeu a notícia, pensando em todo o tempo e a energia que passou achando que tinha, e em toda a dor de cabeça emocional. O primo Brian Whitney, 43 anos, não teve tanta sorte.

É possível se preparar para o Alzheimer?

Seu pai tem o gene e sofre de Alzheimer. Quando tinha 40 anos, Whitney, que mora em Manson, Washington, decidiu fazer o exame, partindo do princípio de que precisava saber pelo bem da família, principalmente da filha de dois anos.

Ela teria de vê-lo começar a perder a memória quando tivesse apenas dez anos? Ela teria de vê-lo morrer? Será que ele passou o gene para ela?

Se possuísse o gene, ele se ofereceria como voluntário para pesquisa; faria qualquer coisa que pudesse para ajudar os cientistas a compreender a doença e a tratá-la, se não por ele, pelo bem da filha.

O exame de Whitney deu positivo. Ele tem o gene. O homem achou que estaria preparado, mas nada realmente deixa uma pessoa preparada para ouvir essa notícia.

Nos bons dias, ele quase consegue esquecer o que está por vir; nos dias ruins, só pensa nisso. Ele participou de um estudo clínico. Uma enfermeira vai à sua casa todo mês para injetar nele uma droga experimental, numa espécie de lembrete mensal do futuro.

Amigos disseram que não conseguem compreender por que ele se sujeitou à tortura de saber, sem falar em tomar um remédio que pode piorar ainda mais as coisas, pelo que se sabe.

"Eu discordo e afirmo que eles não sabem do que estão falando. Meu único controle é estar envolvido na pesquisa. Viva a minha vida e tenha minha história familiar antes de me julgar."