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Hololens: por que a Microsoft não quer vender óculos inteligentes para você

Funcionária usa o Hololens 2 para receber instruções de conserto de um assistente remoto - Divulgação/Microsoft
Funcionária usa o Hololens 2 para receber instruções de conserto de um assistente remoto Imagem: Divulgação/Microsoft

Helton Simões Gomes*

Do UOL, em Barcelona (Espanha)

28/02/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Segunda versão do Hololens coloca hologramas na frente dos seus olhos
  • Pode revolucionar tarefas específicas, técnicas e demonstrativas
  • Mas a Microsoft diz que seus óculos inteligentes não são para o seu bico
  • Faltam 3 elementos: conforto, preço e aplicações legais para pessoas normais

A Microsoft lançou a segunda versão do Hololens, seus óculos de realidade mista que colocam hologramas na frente dos olhos das pessoas.

O gadget serve para que elas aprendam a consertar máquinas que sequer conhecem, realizem reuniões com pessoas a quilômetros de distância e até façam cirurgias complicadas. Parece incrível, tanto é que diversas empresas se interessaram. Mas, a não ser que você trabalhe em uma delas, dificilmente terá acesso a um.

Por quê? Esse é o segredo da Microsoft para não transformar seus óculos conectado no próximo Google Glass, o acessório do Google que foi tão festejado quanto criticado por ter colocado no rosto das pessoas um aparelho capaz de virar uma câmera de segurança e hoje passou de referência a apenas mais um.

O evento em que o Hololens 2 foi apresentado ao mundo na Mobile World Congress (MWC), em Barcelona, na Espanha, teve status de lançamento de smartphone top de linha. O novo aparelho é mais confortável de vestir, as telas presentes em suas lentes possuem um campo de visão maior e os hologramas exibidos nela são mais realistas. 

Além disso, ele passará a vir de fábrica com algumas aplicações prontinhas para usar --por exemplo: um guia holográfico com instruções em forma de holograma e um assistente remoto para que, em momentos de emergência, um especialista possa dar dicas exibidas na tela que ajudem a executar tarefas difíceis.

Jovens usam o Hololens 2 para estudar a estrutura de uma célula - Divulgação/Microsoft - Divulgação/Microsoft
Jovens usam o Hololens 2 para estudar a estrutura de uma célula
Imagem: Divulgação/Microsoft

Apesar da pompa do evento, que contou até com o CEO da companhia, Satya Nadella, tudo que a Microsoft não quer é que o Hololens se torne agora um produto voltado a consumidores --isso mesmo: você.

Nosso foco é 100% em empresas

Craig Cincotta, diretor de comunicação comercial da Microsoft

A Microsoft não acredita que seus óculos conectados possuam três elementos que possam levá-lo a virar um produto de massa: conforto suficiente, preço acessível e aplicações legais o suficiente que não só solucionem problemas mas que façam você voltar a usar o aparelho de forma casual.

Embora a versão inicial do aparelho custasse US$ 5.000, os US$ 3.500 cobrados nesse novo modelo não são nem de longe algo atrativo. Já as aplicações, como as descritas ali em cima, não são exatamente serviços que fariam você abandonar uma maratona no Netflix.

Além de ainda não possuir o que poderia cativar consumidores, o Hololens 2 é pensado para atender as demandas de empresas, diz Cincotta:

"Somos sortudos por ter uma grande base de clientes formada por empresas globais que estão dispostas a dizer: 'esse é o tipo de experiência que queremos implantar, estas são as tecnologias e inovações que estamos procurando'. Não tem essa de adivinhar. Não estamos tentando adivinhar o que elas querem."

Médicos usam o Hololens 2 para analisar como farão uma cirurgia - Divulgação/Microsoft - Divulgação/Microsoft
Médicos usam o Hololens 2 para analisar como farão uma cirurgia
Imagem: Divulgação/Microsoft

A Microsoft classifica essa proximidade de clientes corporativos como uma de suas vantagens competitivas sobre outros aparelhos. Inclusive sobre o Google Glass. Quando o Hololens surgiu, em 2015, os óculos inteligentes do Google já eram sensação e uma versão de testes era vendida aos clientes. 

Sucessivas reveses, como o incômodo de outras pessoas diante de alguém usando o aparelho, fizeram a empresa repensar se colocamos no rosto de consumidores era o plano ideal. Já a Microsoft decidiu, desde o princípio, que o Hololens iria passar longe deles.

"Nosso foco no lado comercial e nas empresas foi estratégico e uma importante decisão que tomamos."

Alex Kipman, o engenheiro brasileiro que lidera o projeto do Hololens - Divulgação/Microsoft - Divulgação/Microsoft
Alex Kipman, o engenheiro brasileiro que lidera o projeto do Hololens
Imagem: Divulgação/Microsoft

Enquanto outras companhias, como Facebook e Sony, ainda perseguem consumidores finais que topem usar seus óculos inteligentes, a Microsoft está satisfeita com a posição que o Hololens ocupa em seu portfólio.

"Do ponto de vista do consumo, temos grandes marcas como Xbox, Surface e LinkedIn", diz Cincotta. "Para a gente, não fazemos o produto para que ele seja necessariamente sexy. É como diz o Satya: 'nós não estamos aqui para ser legais e, sim, para fazer as outras pessoas a serem legais'."

Talvez por isso não haja o menor constrangimento em vender o Hololens para o Exército dos Estados Unidos que pretende usar os óculos conectados para que seus soldados tomem decisões mais rápidas no campo de batalha.

A Microsoft fechou a venda de 100 mil Hololens ao Pentágono em um contrato de US$ 479 milhões. O Exército norte-americano buscava aparelhos que "aumentassem a letalidade, mobilidade e a consciência da situação" de seus soldados. Como os dispositivos serão usados para turbinar o poder de combate das Forças Armadas dos EUA, o negócio foi criticado por funcionários da empresa.

O acordo foi defendido pelo próprio Satya Nadella em entrevista à CNN:

Nós fizemos uma decisão baseada em princípios de que nós não iríamos deixar de fornecer tecnologia a instituições que nós elegemos em democracias para proteger as liberdades que gozamos

Cincotta ecoa as palavras do chefe e diz que não há desconforto em fornecer tecnologia para militares, já que o Hololens é usado por diversos setores do serviço público norte-americano.

Um exemplo é uma região de New Jersey, que equipe trabalhadores responsáveis pela manutenção urbana com Hololens para que possam consertar tubulações com maior precisão.