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Lava Jato usa delação da JBS em recurso por condenação da mulher de Cunha

Pedro Ladeira/Folhapress
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Fausto Macedo e Julia Affonso

São Paulo

26/07/2017 18h45Atualizada em 26/07/2017 19h50

Usando como argumento a delação de executivos da JBS, a força-tarefa da Operação Lava Jato no Ministério Público Federal requereu a condenação da jornalista Cláudia Cruz, mulher do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB/RJ) - preso desde outubro de 2016 e condenado a 15 anos e quatro meses por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Em recurso de apelação ao juiz Sérgio Moro, que absolveu Cláudia em processo por lavagem de dinheiro e evasão fraudulenta de divisas, treze procuradores da República sustentam que ela recebeu parte de propinas que executivos do grupo afirmam ter pago ao ex-deputado.

A delação da JBS mergulhou o governo Michel Temer em sua mais grave crise política. O presidente foi denunciado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por corrupção passiva. A denúncia está sob o crivo da Câmara.

Nos detalhes da delação da JBS, a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, base da grande investigação, encontrou argumentos para recorrer a Moro e insistir na condenação de Cláudia por manter conta secreta na Suíça com saldo superior a US$ 1 milhão, valor supostamente oriundo de propinas recebidas pelo marido.

"De acordo com esses executivos, que firmaram acordo de colaboração premiada com a Procuradoria-Geral da República, tais propinas continuaram a ser pagas para compra do silêncio de Eduardo Cunha e manutenção da subsistência de sua família, inclusive, por óbvio, de sua esposa, a apelada Cláudia Cruz", afirmam os procuradores.

No documento de 58 páginas, os procuradores destacam que após autorização de Joesley Batista, acionista principal da JBS, o ex-conselheiro fiscal do grupo Florisvaldo Caetano "promoveu entregas de vantagens indevidas" para Altair Alves Pinto, apontado como o "faz tudo" de Eduardo Cunha.

Segundo Joesley, esses valores serviam para "manter a família" e "comprar o silêncio" do ex-presidente da Câmara, "mesmo após sua prisão preventiva, o que indica que a apelada Cláudia Cruz também se beneficiou destes valores, conforme, aliás, ocorria antes".

A Procuradoria destaca que o vínculo entre Altair e Cláudia "é evidenciado" na quebra de sigilo telemático da mulher de Eduardo Cunha.

"Dentre os documentos obtidos, foram evidenciados vários e-mails trocados por Cláudia Cruz que mencionam Altair Alves PInto. A título de exemplo, menciona-se o e-mail encaminhado pela apelada Cláudia a Leila Almeida, funcionária de Eduardo Cunha, com o título 'Depósitos'. Na ocasião, Cláudia pergunta: 'Leila, foram todos feitos?' Ao final, ressalta: 'Assim q eles forem feitos tenho um na minha conta ok?', o que é respondido por Leila: 'Oi Claudia, ainda não foram feitos. Aviso depois pra você!'. Cláudia então responde: 'Vc sabe qdo serão? To preocupada c isso', o que é respondido por Leila: 'Não sabemos, talvez a tarde'. Então, Cláudia reitera: 'Prioriza o machado... Ele já emendou outro trab la em casa. Vc fala c altair?'."

"Como visto, todos estes e-mails tratam de entregas/depósitos de dinheiro em espécie pelo delatado Altair Alves Pinto em favor de Eduardo Cunha e da apelada Cláudia Cruz, o que corrobora documentalmente o teor dos depoimentos de Joesley Batista e Florisvaldo Caetano e indica o dolo da apelada (Cláudia) em ter contas pessoais custeadas criminosamente por terceiros, com dinheiro proveniente de infrações penais praticadas por seu marido", assinala a Procuradoria no recurso de apelação a Moro.

"Ressalte-se que, não obstante tais e-mails já serem de conhecimento do Ministério Público Federal, o nexo causal entre estes documentos e os crimes apurados só foi evidenciado após a colaboração premiada dos executivos da JBS, que revelou a rotina de pagamentos espúrios operacionalizados por Altair Alves Pinto em favor da família de Eduardo Cunha, incluindo a apelada (Cláudia), como visto."

A forma de comunicação, em códigos, também é reveladora do dolo de Cláudia, afirma a Procuradoria.

"Pelos elementos de prova produzidos na instrução, aliados às provas supervenientes reveladas pela colaboração premiada dos executivos do GRUPO J&F, as quais tiveram a existência revelada somente recentemente, em 18 de maio de 2017, após, portanto, à apresentação dos memoriais de alegações finais pelo Ministério Público Federal e cerca de apenas uma semana antes da sentença (25 de maio de 2017), conclui-se de modo seguro que, mesmo após a prisão de Eduardo Cunha, ocorrida em outubro de 2016, executivos do Grupo J&F pagaram propinas acertadas previamente com o ex-deputado federal", argumenta a Procuradoria.

Ainda segundo a força-tarefa da Lava Jato, "mesmo após busca e apreensões, prisão de seu marido, ação penal e diversos inquéritos, Cláudia Cruz continuou a receber e gastar de modo ilegal dinheiro proveniente de propina".